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quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A Insuportável Competência dum Escritor


A primeira vez que ouvi falar sobre "A Insustentável Leveza do Ser" foi da boca de minha mãe, que havia ido ao cinema e voltou dizendo:

- Nossa, que filme chato!

E esta foi a impressão que ficou gravada em minha mente por anos, até que, por acaso, li a tradução do primeiro capítulo do romance "A Insustentável Leveza do Ser" na internet. Neste capítulo, o narrador analisa o conceito de eterno retorno proposta por Nietzsche, e o relaciona à vida humana. Para o narrador, este retorno é um ideal irrealizável, pois nossa vida é em linha reta, não há retornos, não há como voltar atrás e testar diferentes possibilidades: toda escolha que fazemos é única; para a vida, não há ensaios, é sempre realização.

É disto que se trata o livro de Milan Kundera, da vida de cinco personagens - Tomas, Tereza, Sabine, Franz e do cachorro Karenin - e das escolhas feitas por eles.
A estrutrura do romance lembra a dos romances polifônicos de Dostoiesvsky; somos conduzidos, através dos capítulos, pelas óticas de cada um deles, tentando compreender suas decisões e seus arrependimentos.
O contexto histórico principal é a invasão russa na Tchecoslováquia, em 1968, época de perseguição política, repressão e vários intelectuais tendo de se exilarem.
Tomas é um mulherengo incorrigível e que, mesmo após se apaixonar por Tereza, não consegue abandonar suas aventuras sexuais; Tereza, por outro lado, compreende que, para continuar ao lado do homem que ama, terá de aceitar o comportamento dele, mas sem desistir de torná-lo totalmente seu.
"Insustentável Leveza do Ser" é uma obra permeada de reflexões filosóficas, de conjeturas políticas com fortes críticas ao comunismo, e até de meditações sobre o ofício da escrita.

Milan Kundera possui uma escrita limpa, competente e direta, que por vezes assemelha-se ao domínio literário de Kafka, seu compatriota. Várias das hipóteses levantadas pelo narrador são dum brilhantismo surpreendente, apresentando suas conclusões sem dogmatismo nem sectarismo.
É o tipo de obra que espanta, a ponto de se tornar insuportável por tamanha perfeição.

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