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sábado, 24 de janeiro de 2009

Primeira vez

(Maristela S. Deves)

Você me fez ser mulher
Me fez sentir diferente
Ficaram meus lábios doloridos
E no corpo, um prazer dormente.

Foi somente aquela noite
Agora nos vemos, é um ´oi´
E confesso que fico enciumada
Vendo outra de ti acompanhada
Mas eu não sinto rancor.

Pois não te amo, é verdade
Embora ficarás sempre em mim na saudade
Daquela primeira vez...





sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Dona Sonia e o ponto G- Giselle Sato


Finalmente descobri o mundo da internet. Depois de ter presenteado todos os netos, comprei um laptop bem bonitinho e cheio de recursos. Li por acaso os casos quentes que acontecem on-line e queria experimentar. Apesar de não ser uma mocinha, sou bem fogosa. Desde que o falecido partiu desta para melhor, ou pior, amargo uma sede de quase dez anos. Fogo eu sempre tive, mas a família decidiu que estou idosa e não posso mais ter desejo. Minha vida agora são filhos, netos e toda a chatice que abomino. Não suporto novelas e não sei tricotar.

Em um site bobo de encontros, vi a chance de sair da rotina e satisfazer a curiosidade. Meu interesse foi crescendo, conforme as conversas aconteciam. Muitos eram inteligentes, educados e interessantes. Mas sempre puxavam papo sobre sexo e a conversa terminava quente. Assim que me identifiquei com alguns, selecionei e comecei a me soltar. Juro que era apenas uma brincadeira sem maiores pretensões. Mas não posso negar que se transformou em um vício.

Cheguei correndo das compras e fui ver quem estava on-line. Não estava muito cheio, normalmente as coisas acontecem de madrugada. Em compensação, mal entrei começaram a chamadas... Depois do perfil que criei, era só sentar e ficar esperando os peixes comerem a isca. Primeiro, roubei as fotos da minha filha mais nova usando um biquíni mínimo. Coisa antiga de dez anos atrás e dei uns retoques. Em seguida, menti a idade descaradamente, dos maus vividos cinqüenta e oito anos, descontei vinte e fiquei no lucro. Aceitei muitos novos amigos e a coisa ficou tão boa que teve até uma mulher interessada. Não descartei qualquer hipótese. Sou muito curiosa.
O garoto de 25 anos com cara de bebê entrou na tela. Papo bobo, perguntas sem graça e fui obrigada a ajudar. Onze e meia, sábado o que ele queria com uma senhora? Falar sobre o tempo.... O menino era muito tímido, em meia hora estava pelado diante da câmera, falando as maiores barbaridades. Assisti tudo até a última gotinha. Logo em seguida, o show terminou sem nem boa noite. Excluí o mal educado. O segundo amiguinho da noite era o solitário carente aproveitando o sono da esposa. Também queria exibir os dotes. O recurso de câmera ficou claro no meu apelido: Soninha webcam. Mais explícito impossível.

O mal casado tinha problemas visíveis de dimensões mínimas. Pediu que eu ligasse minha câmera e mostrasse os seios. Claro que não podia fazer isto e ele desistiu. A esta altura, eu já estava teclando com meu paquera virtual, falando obscenidades e me masturbando loucamente:

- Se estivesse aí, te fazia gozar na minha boca. - Ele ficava repetindo mil vezes as mesmas coisas e comecei a fantasiar...

Se ele estivesse naquele instante comigo, deitados no tapete macio, meia luz e o ar impregnado de tesão. O que eu não faria com aquele homem! Viajei na voz macia e podia sentir o gosto daquela pele suada. O cheiro dele eu sabia, acabei comprando o perfume que ele garantiu usar. Meu peito quase explodia em uma dor urgente. Olhos grudados na tela do PC, estremeci de prazer e gozamos juntos. Ele saiu imediatamente e eu fiquei ''off ''alguns segundos. Este era especial, quase diário, sentia como se fosse um compromisso. Sempre esperava por ele e quando não aparecia ficava um pouco triste. Nunca vou ver pessoalmente qualquer um deles e não me incomodo nem um pouco. Nos meus sonhos, eles criam vida e são amantes perfeitos.

Uma e meia da manhã recebi um e-mail delicioso de um coleguinha, várias fotos dele, nu, em poses variadas. Engraçado como as pessoas são loucas enviando fotografias e falando toda a vida. Logo em seguida, comecei a conversar com um homem com o apelido de Carinhoso e Sedutor. Ele tinha um papo envolvente, conversamos um pouco sem falar sobre sexo. Ele queria que eu participasse, disse que a câmera estava quebrada e ele insistiu:

- Se não quiser mostrar o rosto, fique à vontade. Mas é bem melhor a dois, minha linda.

- Eu gosto de olhar, é uma opção pessoal não me exibir.

- Se você se satisfaz desta forma, não está mais aqui quem falou. Ok? Eu apenas sugeri, mas a decisão é sua, meu amor.

Não sei o que deu na minha cabeça, diminuí as luzes e direcionei o foco para a parte inferior do corpo. Era minha primeira vez e estava excitadíssima. Agradeci o hábito da depilação mensal. Ele elogiou e pediu que eu focalizasse bem cada detalhe. Não sei o que ele conseguia enxergar com a luz tão baixa, mas ele estava animado. Os dedos deslizaram para o meio das pernas e deixei que ele ditasse as regras:
- Quero que toque de leve, só por cima... Assim, sem pressa, agora vai usar só um dedinho e roçar o grelinho. Aumenta a luz um pouquinho, meu amor?

Pronto, aquele homem lindo me chamando de “meu amor”, desmontou a resistência. Joguei a luz quase em iluminação ginecológica e esperei. Já sentia a umidade natural aumentar só pensando no que viria:

- Linda, minha flor branquinha e delicada. Quase sem pelos e do jeito que eu gosto. Agora vamos brincar um pouquinho. Vou pedir e você acompanha, pode ser?

Ele ia mandando e eu obedecia sem o menor pudor. O anonimato garantia a coragem de me expor e partilhar com o desconhecido meus desejos. Os dedos entravam e saíam, apertavam e buscavam pontos que ele dizia conhecer bem. Foi quando toquei pela primeira vez o pedacinho de carne, logo na entrada da vagina, tateando senti a pele mais áspera que o normal. Ali friccionei e senti um prazer agudo e doloroso. As solas dos pés queimavam e a sensação forte subia pelas pernas. Senti que era uma agonia sem fim aquele toque. Foi tão súbito e intenso que me desmanchei em gemidos altos. Já nem olhava a tela e pouco me importava o que ele fazia. Precisa gozar ou morreria. O orgasmo mais incrível chegou sofrido e pouco a pouco, cresceu e me engoliu. Perdi o fôlego completamente entregue...

Totalmente mole e satisfeita, vi que meu parceiro também estava se recompondo. Fiquei imaginando porque um homem tão bonito usava a internet:

- Oi, meu lindo, não consegui te dar muita atenção.

- Que isso? Soninha, você foi maravilhosa, fiquei excitado só te ouvindo gozar.
- Posso te fazer uma pergunta? Acho que não devo ser a primeira, mas...

- Olha, querida, você está curiosa sobre a minha aparência e vou ser bem direto. Sou acompanhante e não gosto de ser chamado de garoto de programa. Minhas clientes são bem selecionadas e a coisa acontece de outra maneira. Tenho nível superior, fiquei desempregado e descobri que posso ganhar bem mais desta forma.

- Nossa! Tudo assim de supetão me pegou desprevenida. Você parece um homem interessante. Infelizmente, continuo não entendo as razões do que aconteceu agora.

- Normalmente a grande maioria que gosta deste recurso são pessoas solitárias. É minha propaganda bem direta e sem disfarces. Divulgo meus dotes no amor. Mostro meu jeito e acho que dá certo.

- Muito esperto o mocinho. Até me interessei, mas não sou exatamente...

- Já imaginava, Soninha, e não tem a menor importância. Vou mandar meus contatos. Não deixe de ligar. Beijos, querida, preciso dormir e você também. Boa noite, linda!

Fiquei um bom tempo olhando os números na tela. Lentamente peguei a agenda e anotei. Definitivamente, era um caso a se pensar com carinho. Sair do virtual e cair na real parecia uma proposta irresistível. Além do mais, ele era um profissional e eu já tinha experimentado a amostra grátis. Suspirei profundamente e pensei em lingeries e quartos de motel. Nem sabia mais como era isso... Bendita internet!




Foto- Ricardo Pozzo





quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Entrevista: Maria Isabel Moura

Está no ar a entrevista com a escritora portuguesa Maria Isabel Moura, autora do romance erótico "Todo começo é involuntário". Leia aqui a entrevista.





quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Ecdise

Marcia Szajnbok
Abriu os olhos e iniciou a contagem regressiva: 30, 29, 28... Quando pensou – “zero!” – o despertador tocou. Sorriu, orgulhoso da própria precisão. Tomou a agenda, já aberta na data correta sobre o criado-mudo, marcou a lápis um pontinho e, no canto da página, contabilizou 1567: um mil e quinhentos e sessenta e sete dias - há quase cinco anos, seu relógio biológico mantinha-se absolutamente exato!
Sem acender as luzes, pegou roupas limpas. A monotonia dispensava iluminação: todas as camisas eram brancas, todas as cuecas cor da pele, as calças e as meias eram pretas, sem detalhes. O café da manhã tampouco comportava surpresas. A mesa já ficava sempre pronta na noite anterior, a torradeira a postos, café-com-leite, pão e manteiga.
O percurso de casa ao trabalho era sempre feito a pé. Da porta do apartamento ao elevador do prédio de escritórios, 648 passos. Divertia-se em fechar os olhos em alguns trechos do caminho e, apenas pelo controle numérico, adivinhar onde estava. “Bingo!”, festejava consigo mesmo sempre que acertava. E acertava sempre. Por isso, aquela manhã de quarta-feira foi um verdadeiro divisor de águas em sua vida matematicamente controlada.
Após atravessar a avenida, deveria seguir 44 passos e então virar à direita. Decidiu fazer ali a brincadeira dos olhos fechados. Foi seguindo, firme e convicto, 43, 44... e bateu de cara num obstáculo! Demorou alguns segundos para compreender que aquilo era um tapume. Surgido da noite para o dia, fechava o acesso à rua onde trabalhava. Destacado do fundo roxo e preto, o aviso amarelo ordenava “Desvio”, a seta autoritária apontando para a esquerda.
Atônito, não se movia. Estava ali, mergulhado no próprio desamparo, quando ouviu a risada. Bem a seu lado estava a moça, rindo. Como jamais falava com estranhos, apenas dirigiu a ela um olhar interrogador: está rindo do quê? E ela, que falava muito, e sempre, até mesmo quando não tinha interlocutor, foi respondendo à questão não proferida:
- Machucou? A gente tem que tomar cuidado. Nesta cidade todo dia aparece um buraco novo, ou um poste, ou um muro. Outro dia, eu estava indo para casa e...
Sem conseguir prestar atenção a tudo o que ela dizia, foi se deixando levar apenas pelo tom de sua voz melodiosa e alegre. Era uma moça bonita, morena, esguia, os olhos transbordavam expressão.
- Você vai ficar aí parado? Vem, vamos tomar um café.
E ele foi. Sem contar os passos, sem saber exatamente para onde, deixou-se ir com ela. As palavras lhe escapavam. O que o mantinha como que hipnotizado eram os movimentos. Ela andava gingando o quadril, movia as mãos enfatizando as frases, arregalava os olhos, jogava o cabelo para trás com um movimento serpenteante do pescoço. Estava impressionado com aquele corpo – tudo nele comunicava.
No balcão da padaria, ela pediu: dois cafés. Puros? Sim, puros. E ele apenas assistiu à cena, esquecido por um momento de que, até então, sempre pedia um pingado. Saboreou o amargo da bebida quente, e o cheiro que subia da xícara misturou-se ao perfume da moça e ao aroma de pão recém assado.
Talvez tenha sido o excesso de cafeína e de olfato, talvez o exagero de expressividade que emanava daquela moça, ou o burburinho emocional que o invadia naquela manhã atípica. O mal-estar surgiu de repente. Começou a suar frio, esfregava as mãos procurando a porta com o olhar. Tinha ímpetos de sair correndo, mas achava que, se levantasse, iria desmaiar. Uma espécie de formigamento percorria-lhe todo o corpo. Tentava se concentrar: não perca o controle, não perca o controle... O estômago se contorcia, o mundo todo girava. Não conseguiu evitar. O vômito veio num jato. Sujou os próprios sapatos, o balcão da padaria, os pés da moça. Todos os olhares, enojados, reprovavam-lhe severamente aquele ato. Tinha ganas de gritar, de justificar, de explicar que não fizera aquilo de propósito, que sentia muito, que nunca passara por uma situação como aquela...
Nunca passara por uma situação como aquela. Esse pensamento reverberava Via-se menino comportado, adolescente contido, adulto regrado. Sempre tivera o esmero de manter tudo em ordem, a casa, o armário, os estudos, a vida. E agora, isto! De que adiantara tanto esforço? Para que servira ter aberto mão de tanta coisa? Dietas balanceadas mesmo diante do sorvete mais apetitoso, a recusa automática a todos os desafios que lhe haviam proposto, a pontualidade levada germanicamente a sério. Nenhum amigo íntimo demais, não se pode confiar muito nas pessoas. Nenhum enamoramento, a paixão nos desvia do bom equilíbrio. Nenhuma explosão de ira, a violência nos aproxima dos seres irracionais. Nunca passara por uma situação como aquela. De fato, nunca passara por situação nenhuma. E agora, toda a assepsia da vida parecia ter ido por água abaixo, mergulhada no mais prosaico dos produtos que um corpo humano pode produzir.
Foi, novamente, o riso da moça que o acudiu.
- Ressaca em plena quarta-feira? Mal, hein?!
Conduzido por ela, entrou no cubículo escuro e malcheiroso que era o banheiro da padaria. Havia apenas o vaso sanitário e uma pia minúscula, sem sabonete, papel higiênico ou toalhas. Abriu ao máximo a torneira, esperando um jato de onde só saía um filete de água. Precisava apenas lavar a boca, mas tinha necessidade de limpar-se por inteiro. Começou pelo rosto e cabelo. Depois, tirou a camisa e jogou água fria no peito. Mecanicamente, foi se despindo por completo, molhando todo o corpo. Comprazia-se da sensação provocada pela água escorrendo sobre a pele. Aquela limpeza sem sabão lembrava mais um batismo que um banho. Tremia, um pouco de frio, um pouco não sabia do quê.
Do lado de fora, a moça se impacientava. Bateu e, sem esperar resposta, entreabriu a porta. Quando deu com o homem nu, arregalou um pouco os olhos, sorriu maliciosamente e entrou. Antes que ele tivesse tempo de dizer ou fazer qualquer coisa, a moça já havia levantado a saia, tirado as roupas de baixo, e se pendurado em seu pescoço, enlaçando-o com as pernas pelo quadril. A cena insólita era bonita: um casal jovem, amando-se assim, de improviso, em pé, como bichos. Pareciam se conhecer de longa data, tanto que os gestos se entendiam. Não havia lugar para palavras. Apenas movimentos, toques, sensações. Ao final, ainda ficaram ali abraçados, conectados um ao outro, em silêncio, tentando, cada um, reter no próprio corpo a memória do gozo do outro.
Foi ela, novamente, que pôs a vida em marcha.
- Melhor você se recompor. Quase num movimento único, vestiu-se, beijou-lhe de leve o rosto, e saiu.
Menos de cinco minutos depois, também ele retornava ao mundo real. Não deu muita importância aos risinhos de canto e aos olhares divertidos que trocavam os funcionários da padaria. Procurou-a junto ao balcão, na calçada, do outro lado da rua. Nada. Desaparecera no meio da correnteza humana que se deslocava pela avenida no meio da manhã. Pensou que estava bem atrasado para o trabalho, e que nunca antes havia faltado a nenhum compromisso profissional. No céu azul, nenhuma nuvem. Deixou-se ir, anônimo no meio da turba, sem saber exatamente para onde os passos o levariam. Viu-se refletido na vitrine de uma loja. Diante da estranha sensação de reconhecimento e perplexidade, sentiu vontade de rir. De início, até procurou conter-se, mas depois deixou o riso vir. Veio tímido, depois foi crescendo, explodiu numa crise de gargalhadas, daquelas que fazem os olhos se encherem de lágrimas. Os passantes olhavam, curiosos, e quanto mais se via observado, mais gargalhava. O dia estava lindo. Queria caminhar. Estava livre, e naquele instante lhe bastava isso: caminhar e sentir o calor do sol.





segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Marcinha se revolta

“Ele vai ver, aquele viado” -, pensa Marcinha, enquanto sai do quarto de hóspedes da casa do namorado, à meia noite. Ela tinha tido todo o trabalho de treinar maneiras de fazer strip-tease, e o babaca do Lúcio lhe chamara de puta quando ela lhe mostrara! Mas agora ela, que tinha passado esse fim de semana na casa do namorado dormindo no quarto dos hóspedes e se enfiando na cama de Lúcio para trepadas noturnas, sabia como se vingar.
Caminhou silenciosamente pelo corredor do segundo andar, onde ficava seu quarto, e chegou até o quarto de Lúcio. Olhou muito bem para a porta, proferiu alguns insultos, e avançou para a porta seguinte. Para o quarto de César, irmão caçula de Lúcio, que tinha 18 anos, dois a menos do que ela e três a menos do que seu namorado.
Ela abre a porta, e para sua surpresa, César estava acordado, se masturbando vendo vídeos de sacanagem na internet.
Ao ver Marcinha parada na porta, César quase arranca o próprio pau do corpo.
- Márcia, o que, eu, espera... – Ele balbuciava coisas sem sentido, obviamente assustado e constrangido.
Por sua vez, Marcinha sorri, ao ver que não teria metade do trabalho que pensava que teria.
- Shhhh, calma – diz ela, sussurrando com uma voz sensual. – Deixa eu te ajudar.
César, sem saber o que fazer, não diz nada enquanto Marcinha se aproxima.
Ela se ajoelha diante dele, olha para a tela do computador. No vídeo, uma morena sensual pagava um boquete a um jovem, que aparentava ter a idade dele.
- Gosta disso?
Ele assente, ainda calado.
Ela agarra o pau dele, que mesmo com a situação se mantinha duro, e começa a massageá-lo.
- Humm, que pau grosso! Deve ter um gosto ótimo.
Ela passa a língua, da base até a cabeça. César treme de prazer.
- Sim, ele realmente é muito bom!
Ela faz então um boquete sensacional, se esforçando como nunca tinha se esforçado. Ela lambe a cabeça, faz sucção, lambe o saco enquanto masturba o pau. Num certo momento ela tira a camisa e esfrega os seios no pau dele, abaixando sua cabeça e lambendo a dele. Chupava como se aquele fosse o último caralho do mundo, e ela estivesse o homenageando. César nesse ponto já agarrava a cabeça dele, forçando-a contra si, fazendo seu pau alcançar a garganta. Marcinha aceitava, e gemia a cada movimento de sua língua experiente. Ao primeiro sinal de que César gozaria, ela enfia o cacete dele bem fundo, recebendo em sua boca toda a porra do irmãozinho de seu namorado.
Exausto e satisfeito, César se solta em sua cadeira. Marcinha olha para cima, bem nos olhos dele, sorri um perfeito sorriso de puta, dá um beijinho e uma lambida na cabeça do caralho dele, se levanta e sai, fechando a porta atrás de si.
Ela vai até a cozinha se preparar para a segunda parte de seu plano.
Saindo da cozinha ela vai até o quarto dos pais de Lúcio. Ela sabia que seu José e dona Sônia estavam tendo problemas, e dormiam em camas separadas. Ela vagarosamente abre a porta do quarto deles.
Lá dentro, seu José dormia na cama mais próxima da porta. Marcinha nota que ele dormia apenas de cueca. Ela se aproxima dele, olha para a outra cama para garantir que dona Sônia ainda dormia. Então, ela se deita ao lado de José, beijando seu pescoço e acariciando seu pau por cima da cueca. Ele acorda assustado, mas Marcinha olha em seus olhos e lhe faz um sinal para ficar calado. Ele assente.
Ela então tira sua calcinha e fica por cima dele. Ela se agacha, tira o pau dele de dentro da cueca e começa a masturbá-lo. Quando ele fica duro, ela o passa na entrada de sua boceta molhadinha, e fica o esfregando contra seu clitóris. José ensaia um gemido, mas ela diz a ele para não gemer, porque senão sua esposa acordaria. Ele concorda, e aproveita silenciosamente. Quase não consegue manter seu silêncio quando Marcinha senta completamente sobre ele, fazendo seu caralho ir bem fundo naqueva rachinha apertada dela. Ela sobe e desce lentamente, lambendo e mordendo seus lábios. Ela pega as mãos dele e as coloca em seus seios, já fora da camisa. Acelerando o ritmo, ela acha que não vai conseguir não gemer, mas se segura. Depois de alguns minutos de cavalgada, ela se levanta e abocanha o pau dele, sentindo o gosto de sua boceta, chupando com voracidade, até ele rapidamente gozar em sua boca. Como fizera com seu filho mais novo, ela sorri para José, e dá um beijinho na cabeça de seu pau, antes de se levantar e sair.
De novo ela vai até a cozinha para se recompor.
Voltando para o quarto de Lúcio com um objeto na mão, ela passa por uma porta aberta. Olhando em seu interior, ela vê Bernardo, o pai de dona Sônia, um senhor de 65 anos, dormindo de barriga para cima. Ela se impressiona com o volume em sua cueca: Era maior do que o de Lúcio, César e seu José. Notando que tinha mais uma chance de vingança, ela põe o objeto no chão e entra no quarto.
Hipnotizada pelo tamanho do caralho do velho, ela tira sua cueca e começa a chupá-lo, não acreditando como uma pica podia ter aquele tamanho. Ela tenta enfiar o cacete o máximo possível dentro de sua boca, mas só consegue até um pouco mais da metade. O velho acorda, e vê a moça lhe chupando.
- Eu sabia que você era uma putinha. Pode chupar, lambe essa pica, sua piranha.
Excitada pelas palavras de Bernardo, ela chupa com mais força e mais vontade. Passados alguns minutos, ele a pega, a vira de costas, arranca sua calcinha e enfia de uma vez só seu pau na bucetinha dela. Ela solta um gemido um pouco mais alto, mas não se importava. Estava bom demais. O velho enfiava sem dó, ela achava que seria rasgada ao meio. E enquanto o fazia, a xingava de piranha, de puta, de vadia, de boqueteira. E tudo isso apenas a excitava mais.
Vendo que iria gozar, Bernardo a tira daquela posição e lhe dá seu pau para ela chupar.
- Chupa! Eu quero gozar na sua boca agora.
Ela aceita, depois de ter gozado três vezes com aquela pica dentro dela.
Ela chupa, e ele goza rapidamente em sua boca, um volume enorme de porra. Ela olha para ele satisfeita, lhe dá a já tradicional lambidinha na cabeça do caralho, e sai. Bernardo volta rapidamente a dormir.
No corredor, ela pega o objeto que carregava, um copo, e vai até o quarto de Lúcio.
Entrando, ela acende a luz. Ele acorda assustado, e vê Marcinha na porta, segurando um copo cheio até a metade de um líquido branco.
- Vê isso, seu viado? –, diz ela, tentando manter a voz baixa para não acordar a casa toda. – Eu dei pro seu irmão, pro seu pai e pro seu avô. Só queria te dizer isso antes de ir embora, seu corno moralista!
Ela então bebe o copo cheio com a porra de três gerações, bate a porta, e vai embora, enquanto Lúcio, mais dormindo do que acordado, murmura insultos antes do sono lhe arrebatar novamente e lhe dar mais algumas horas de paz, até acordar e perceber que aquilo não tinha sido um pesadelo.
Não tinha como ser.
O copo sujo de gozo ficara sobre sua escrivaninha.
Rio de Janeiro
Janeiro de 2008





domingo, 18 de janeiro de 2009

Auto-ajuda

Joaquim Bispo




Sabemos, caro leitor, como você gostaria de estar sempre sempre in, infelizmente, as limitações humanas obrigam-no a estar out, a maior parte do tempo. Para essas longas horas, que nunca mais acabam, para esses dias que se transformam em semanas, este consultório sensual dá-lhe algumas dicas para não morrer de inanição sensorial.


1. Se você é dos que gosta de um beijo bem chupado e repenicado, experimente o beijo do cano do aspirador. É inesquecível. Mas não exagere, que a sua mulher pode desconfiar de tanta vontade de aspirar a casa.


2. Se você faz longas viagens, nem sempre em companhia galante, não se acabrunhe. Meta a mão fora da janela, em concha, virada para a frente, aumente a velocidade para 120 e desfrute de longos minutos da consistência de um seio na sua mão. Pode apertar, que a ilusão é convincente. Se o tempo estiver quente, tanto melhor. Não há conversa chata dos acompanhantes que o impeça de fruir o seu gesto inocente.


3. Se a sua mulher vai fazer pastéis de massa tenra, filhós ou outra receita que obrigue a amassar farinha, ofereça-se para amassar. A lisura e a consistência da massa transmitem ao seu tacto a ilusão de carnes tenras de uma mulher, só que, com massa, você pode dar livre curso às mãos sem medo de magoar. Desfrute, mas não dê a entender que gosta mais de amassar que de comer.


4. Se é obrigado a fazer longos passeios a pé, compre um cacho de uvas e consuma-o bago a bago. Enquanto acaricia um entre os dedos, faça rebolar outro nos lábios antes de a língua brincar com ele, como faz com os mamilos da sua mulher. Distrai e faz bem à saúde.


5. Se é época de diospiros (ou caquis), use e abuse. Compre daqueles bem maduros, muito moles. Retire-se para a privacidade que o acto pede, mergulhe de boca aberta na sua polpa deliquescente, e sorva conjuntamente as estruturas gomosas que lhe conferem uma ilusão vulvar. A sofreguidão desse cunnilingus desvairado vai deixar-lhe o rosto lambuzado, mas há certas coisas que não são adequadas para comer à colher.


Nunca deixe, caro leitor, de estar atento ao que o rodeia: uma protuberância numa árvore, um tufo vegetal numa praia, o perfil de uma paisagem. O mundo está cheio de oportunidades para você estar sempre on.





As mulheres na literatura erótica- Giselle Sato





Houve um tempo em que escrever textos mais picantes eram feitos quase heróicos. Escritoras ousadas simpatizantes do gênero, arriscavam em doses homeopáticas burlar os costumes da época. Podemos citar várias e nem todas foram editadas em vida. Não vou martelar na tecla enfadonha deste período da história. Prefiro falar em como a falta de liberdade influenciou o trabalho destas mulheres. Ocultas por conta do preconceito elas se entregaram à intensidade. Foi um período extremamente frustrante, mas a sensação do proibido agiu como estímulo para que a voz reprimida criasse vida no papel. E foram versos, romances e pensamentos genuínos, gritos sufocados e canalizados na literatura.

A visão feminina prima pelo conjunto prazer e sentimento. Não que seja um privilégio, gosto de pensar que seguimos a emoção sem reservas e temos a sutileza como aliada. Quando a idéia vai tomando forma, personagens e tramas parecem exigir vida própria. Um texto erótico tem toda a cadência e flui em busca da resposta do leitor. Existe um cuidado em descrever formando um conjunto completo. Em cada ângulo um pouco do partilhar e acolher. A essência feminina é naturalmente doadora. Recebe, abastece, guarda e nutre. Em comum todas estas escritoras não tiveram medo de partilhar a percepção do sexo. Sem pudor descreveram sensações até então sugeridas e algumas nem imaginadas.

O orgasmo feminino não era assunto que se discutisse. Imagino que as mulheres tinham acesso aos livros e liam as escondidas, suspirando em cada verso e imaginando pra si o prazer sugerido. O importante é que a voz não estava calada, ainda que apenas sussurrasse delícias, apregoava a liberdade da satisfação. Estas escritoras pioneiras são referência para a nova geração de autoras do gênero erótico. Ainda existe o tabu sobre as minúcias e o cuidado para não cair na pornografia grosseira. Mas a grande maioria não está preocupada em mascarar o texto. É um caminho novo que está abrindo com algum receio. Mas o mercado é curioso e imprevisível. A libido foi despertada e já não precisamos esconder as preferências. De qualquer maneira foi uma longa estrada e hoje finalmente as portas estão abertas.



Foto: Ricardo Pozzo





A doçura desta dor

Joaquim Bispo

Este conjunto escultórico é obra do magistral Bernini e encontra-se numa pequena igreja de Roma. Chama-se O êxtase de Sta. Teresa (1647-1652) e representa o episódio de amor místico experimentado por Santa Teresa de Ávila (1515-1582), também conhecido por «Transverberação de Sta. Teresa». Foi a própria que relatou o seguinte:



Ao meu lado esquerdo apareceu um anjo em forma corporal. Não era alto mas baixo e muito belo. E a sua face estava tão afogueada (…). Vi na sua mão um longo dardo de ouro, na ponta do qual julguei ver uma pequena chama. Pareceu-me que o fazia entrar de momento a momento no meu coração e que ele me perfurava até ao fundo das entranhas; quando o retirava, parecia-me que as arrancava também e me deixava toda abrasada com um grande amor de Deus. A dor era tão grande que me fazia gemer e, no entanto, a doçura desta dor excessiva era tal, que era impossível querer vê-la terminada, e a alma já não se contentava senão com Deus. A dor não era física, mas espiritual, se bem que o corpo aí tivesse a sua parte. Era uma tão doce carícia de amor entre a alma e Deus (…).

Como a muitos analistas contemporâneos, não escapou a Bernini a vertente do amor sensual aliado ao amor místico, no relato de Sta. Teresa. É bem evidente o abandono físico da freira perante o anjo, como o abandono da mulher aluada perante o homem desejado. O rosto do anjo reflecte aquele doce júbilo que qualquer homem sente no momento anterior à posse da mulher rendida. O dardo não pode ser mais simbólico, na sua rigidez fálica e na sua ponta penetrante. O gesto delicado da mão esquerda do anjo a levantar o hábito descomposto da freira, como quem afasta uma última peça de roupa íntima, eleva a sensualidade do conjunto a um nível nunca esperado num altar.
E, no entanto, que melhor ícone para venerar que as doces penas do tesão ou a experiência transcendente e sublime de um orgasmo?!





sábado, 17 de janeiro de 2009

Deitar com Ela


Texto: Paul Éluard
Tradução: Marcia Szajnbok



Deitar com ela
Para o sono lado a lado
Para os sonhos paralelos

Deitar com ela
Para o amor absoluto
Para o vício depravado
Para trepar de todo jeito

Deitar com ela
Para um naufrágio inefável
Para se prostituir mutuamente
Para se confundir

Deitar com ela
Para se provar verdadeiramente
Que jamais pesou
Quer na alma, quer no corpo dos amantes
A mentira de um pecado original

Paul Éluard (1895-1952) ganhou notoriedade como «O Poeta da Liberdade », por referência a sua atividade política junto ao Partido Comunista na França dos anos 30, e pela força com que seus poemas anti-nazistas circularam clandestinamente durante a Segunda Guerra, encorajando em muitos momentos as ações da resistência francesa. Há, entretanto, uma outra vertente de sua obra, igualmente importante, constituída pelos poemas de amor e erotismo. Sua primeira mulher, Gala, tornou-se a musa inspiradora de Salvador Dali. A segunda, Nusch, encarnou a companheira perfeita, nos anos que são os mais felizes de sua vida. Seus poemas eróticos representam mais um aspecto do caráter libertário de sua obra, sempre concebida como veículo de conscientização política para seus leitores.

Texto Original: Coucher avec Elle

Coucher avec elle/Pour le sommeil côte à côte/Pour les rêves parallèles/Coucher avec elle/Pour l’amour absolu/Pour le vice pour le vice/Pour les baisers de toute espèce/Coucher avec elle/Pour un naufrage ineffable/Pour se prostituer l’un à l’autre/Pour se confondre/Coucher avec elle/Pour se prouver et prouver vraiment/Que jamais n’a pesé sur l’âme/Et le corps des amants/Le mensonge d’une tache originelle





A Mulher de Véu

Anaïs Nin
Tradução: Henry Alfred Bugalho

Certa vez, George foi a um bar sueco que gostava e se sentou a uma mesa para desfrutar duma noite ociosa. Na mesa ao lado, ele notou um belo e elegante casal, o homem educado e bem vestido, a mulher toda de preto, com um véu sobre a face resplandecente e brilhantes jóias coloridas. Ambos sorriram para ele. Eles não diziam nada um ao outro, como se fossem velhos conhecidos e não precisassem conversar.
Todos os três observavam a atividade do bar — casais bebendo juntos, uma mulher bebendo sozinha, um homem a procura de aventuras — e todos eles pareciam estar pensando as mesmas coisas.
Enfim, o homem bem vestido iniciou um diálogo com George, que agora teve a oportunidade para observar melhor a mulher e a achou ainda mais bela. Mas justamente quando ele esperava que ela participasse da conversa, ela disse algumas poucas palavras a seu companheiro que George não pode captar, sorriu e se foi. George quedou-se desanimado. Seu prazer naquela noite havia partido. Além disto, ele tinha apenas alguns poucos dólares para gastar e não podia convidar o homem para beber consigo e talvez descobrir um pouco mais sobre a mulher. Para sua surpresa, foi o homem quem se virou para ele e disse:
— Se importaria em tomar um drinque comigo?
George aceitou. A conversa seguiu de experiências com hotéis no sul da França para a confissão de George de que ele estava curto de grana. A resposta do homem sugeriu que era extremamente fácil de se conseguir dinheiro. Ele não prosseguiu em dizer como. Forçou George a confessar um pouco mais.
George tinha uma fraqueza comum a muitos homens; quando estava com humor expansivo, adorava contar seus feitos. Ele o fez numa linguagem envolvente. Insinuou que assim que punha o pé na rua, alguma aventura se lhe apresentava, que nunca lhe faltava uma noite interessante, ou uma mulher interessante.
Seu companheiro sorria e ouvia.
Quando George terminou de falar, o homem disse:
— Era isto que eu imaginava, no momento em que o vi. Você é o sujeito a quem procuro. Estou diante dum problema imensamente delicado. Algo absolutamente único. Não sei se você já teve muitas relações com mulheres difíceis, neuróticas — Não? Percebo-o por suas histórias. Bem, eu tenho. Talvez eu as atraia. Neste momento, estou na mais intricada das situações. Mal sei como sair dela. Preciso de sua ajuda. Você diz precisar de dinheiro. Bem, eu posso sugerir uma maneira razoavelmente agradável para consegui-lo. Ouça com atenção. Há uma mulher que é rica e absolutamente linda — na verdade, irretocável. Ela poderia ser amada com devoção por qualquer um que ela quisesse, poderia se casar com qualquer que quisesse. Mas por algum perverso acidente de sua natureza — ela gosta apenas do desconhecido.
— Mas todo mundo gosta do desconhecido — George disse, imediatamente pensando em viagens, encontros inesperados, novas situações.
— Não, não do jeito dela. Ela se interessa apenas por um homem que ela nunca tenha visto antes e que nunca verá novamente. E, por este homem, ela fará qualquer coisa.
George consumia-se para perguntar se a mulher era aquela que estava sentada à mesa com eles, mas não ousou. O homem parecia estar um tanto infeliz, e ainda assim impelido a contar esta história. Ele prosseguiu:
— Eu tenho de cuidar da felicidade desta mulher. Eu faria qualquer coisa por ela. Devotei minha vida a satisfazer-lhe os caprichos.
— Compreendo — George disse — eu me sentiria do mesmo modo em relação a ela.
— Agora, — disse o elegante desconhecido — se você quiser vir comigo, poderá talvez resolver suas dificuldades financeiras por uma semana e, incidentalmente, seu desejo por aventura.
George corou de prazer. Deixaram o bar juntos. O homem chamou um táxi. No táxi, deu a George cinquenta dólares. Então disse que seria obrigado a vendá-lo, porque George não deveria ver a casa para onde iria, nem a rua, pois nunca repetiria esta experiência.
George estava num turbilhão de curiosidade agora, com visões da mulher que vira no bar assombrando-o, vendo a cada momento a boca reluzente e os olhos flamejantes dela por detrás do véu. O que ele havia gostado, particularmente, era o cabelo dela. Gostou de cabelo espesso a cair-lhe pelo rosto, um fardo gracioso, cheiroso e rico. Era uma de suas paixões.
A corrida não foi muito longa. Ele se submeteu amistosamente a todo o mistério. A venda foi retirada de seus olhos antes de ele deixar o táxi, para que não atraísse atenção do taxista ou do porteiro, mas o desconhecido contava, sabiamente, que o brilho das luzes da entrada cegariam George completamente. Ele não conseguia enxergar nada a não ser luzes brilhantes e espelhos.
Foi conduzido a um dos interiores mais suntuosos que jamais vira — todo branco e espelhado, com plantas exóticas, mobília extravagante coberta em damasco e um tapete tão fofo que seus passos não podiam ser ouvidos. Ele foi dirigido por uma sala atrás da outra, cada uma em diferentes nuances, todas espelhadas, que perdeu toda a noção de perspectiva. Por fim, chegaram à última. Ele se engasgou de leve.
Estava num quarto com uma cama canopeada posta sobre um tablado. Havia peles no chão e brancas cortinas vaporosas nas janelas, e espelhos, mais espelhos. Ele estava contente por poder suportar estas repetições de si, reproduções infinitas dum belo homem, para quem o mistério da situação havia dado um brilho de expectativa e prontidão que ele nunca conhecera. O que isto poderia significar? Não tinha tempo para se indagar.
A mulher com que ele havia estado no bar adentrou o quarto, e assim que ela entrou, o homem que o trouxera desapareceu.
Ela havia trocado de vestido. Vestia um estonteante vestido de cetim que deixava seus ombros desnudos e que era suspenso por uma alça. George teve a impressão de que o vestido cairia com um único gesto, descobrindo-a como uma cintilante bainha, e que por debaixo apareceria sua pele reluzente, que brilharia como cetim e que seria igualmente suave para os dedos.
Ele havia dito para si em silêncio. Ainda não conseguia acreditar que esta linda mulher se oferecia para ele, um total desconhecido.
Envergonhou-se também. O que ela esperava dele? Qual era sua busca? Tinha ela algum desejo irrealizado?
Ele tinha apenas uma única noite para dar todos seus dons de amante. Nunca mais a veria novamente. Poderia ser ele aquele a descobrir o segredo da natureza dela e possuí-la mais de uma vez? Ele imaginava quantos outros homens haviam vindo a este quarto.
Ela era extraordinariamente amável, com um toque de cetim e veludo. Seus olhos era negros e úmidos, sua boca fulgurava, sua pele refletia a luz. Seu corpo era perfeitamente harmonioso. Ela tinha as linhas incisivas duma mulher singela unidas a uma provocativa maturidade.
Sua cintura era delgada, que proporciona a seus seios uma proeminência ainda maior. Suas costas eram como de uma dançarina, e cada contorno intensificava a riqueza de seus quadris. Ela sorriu para ele. Sua boca era macia, carnuda e estava entreaberta. George se aproximou e pousou a boca nos ombros nus dela. Nada poderia ser mais macio que sua pele. Que tentação a de puxar o frágil vestido de seus ombros e expor os seios que distendiam o cetim. Que tentação despi-la imediatamente.
Mas George sentia que esta mulher não poderia ser tratada tão sumariamente, que ela requeria sutileza e engenho. Nunca ele havia dado a cada um de seus gestos tanta consideração e arte. Parecia determinado a empreender um longo cerco, e como ela não havia dado sinal de pressa, ele se demorou sobre os ombros nus, inalando a tênue e maravilhoso olor que vinha do corpo dela.
Poderia tê-la tomado ali mesmo, de tão potente que era o encantamento que ela lançava, mas antes ele queria que ela fizesse um sinal, queria que ela estivesse excitada, e não tenra e maleável como cera em seus dedos.
Ela aparentava uma incrível frieza, obediente, mas sem sentimento. Nenhum arrepio em sua pele, e apesar de sua boca estar entreaberta para beijar, ela não correspondia.
Permaneceram lá, perto da cama, sem falar. Ele deslizou suas mãos por sobre as curvas acetinadas do corpo dela, como se para se familiarizar com elas. Ela permanecia imóvel. Ele lentamente se pôs de joelhos, enquanto beijava e acariciava o corpo dela. Seus dedos sentiram que, sob o vestido, ela estava nua. Ele a conduziu até a beirada da cama e ela se sentou. Ele retirou os chinelos dela. Susteve os pés dela em suas mãos.
Ela sorriu para ele, gentil e convidativamente. Ele beijou-lhe os pés, e suas mãos correram por sob as dobras do vestido longo, sentindo as pernas suaves até as coxas.
Ela abandonou os pés às mãos dele, mantendo-os pressionados contra seu peito, enquanto as mãos dele corriam para cima e para baixo por debaixo do vestido. Se a pele dela era tão macia na extensão das pernas, como seria então perto de seu sexo, ali onde é sempre a mais macia? As coxas dela se uniram, pressionadas, de modo que ele não pudesse continuar a exploração. Ele se levantou e debruçou-se sobre ela para beijá-la numa posição reclinada. Enquanto ela se deitava, as pernas se abriram ligeiramente.
Ele movimentou as mãos por todo o corpo dela, como se para excitar cada parte dela com seu toque, acariciando-a novamente dos ombros aos pés, antes de tentar deslizar sua mão entre as pernas, mais abertas agora, de modo que ele quase pode alcançar o sexo dela.
Com seus beijos, os cabelos dela se tornaram revoltos e o vestido caiu de seus ombros e descobriram parcialmente seus seios. Ele retirou todo o vestido com a boca, revelando os seios aos quais ele ansiava, tentadores, intumescidos e da mais delicada pele, com os mamilos rosados tais quais duma jovem.
A submissão dela quase o fez querer machucá-la, para estimulá-la de algum jeito. As carícias o estimulavam, mas não a ela. O sexo dela era cálido e macio para seu dedo, obediente, mas sem vibrações.
George começou a pensar que o mistério da mulher jazia em ela não ser capaz de se excitar. Mas isto não era possível. Seu corpo prometia tanta sensualidade. A pele era tão sensível, a boca tão carnuda. Era impossível que ela não sentisse. Agora ele a acariciava continuamente, oniricamente, como se não tivesse pressa, aguardando que a chama a incendiasse.
Havia espelhos todo ao redor deles, repetindo a imagem da mulher deitada ali, os seios para fora do vestido, seus belos pés nus pendendo para fora da cama, as pernas ligeiramente apartadas sob o vestido.
Ele precisava rasgar o vestido completamente, deitar-se na cama com ela, sentindo todo o corpo dela contra o seu. Começou a puxar o vestido para baixo e ela o ajudou. Seu corpo emergiu como o de Vênus surgindo do mar. Ele a ergueu, para que ela se deitasse totalmente na cama, e sua boca nunca cessava de beijar cada parte do corpo dela.
Então, algo estranho aconteceu. Quando ele se inclinou para deliciar seus olhos com a beleza do sexo dela, roseado, ela teve um calafrio, e George quase gritou de alegria.
Ela murmurou:
— Tire suas roupas.
Ele se despiu. Nu, ele conhecia seu poder. Ele ficava mais à vontade nu do que vestido, porque ele havia sido um atleta, um nadador, um andarilho, um escalador de montanhas. E ele sabia então que isto poderia agradá-la.
Ela olhou para ele.
Estaria ela satisfeita? Quando ele se inclinou sobre ela, estava ela mais receptiva? Ele não conseguia determinar. A estas horas, ele a desejava tanto que não conseguia esperar para tocá-la com a ponta de seu sexo, mas ela o impediu. Ela queria beijar e manusear o sexo dele. Ela se lançou sobre ele com tamanha avidez que George se viu com as nádegas dela perto de seu rosto e podia beijá-la e acariciá-la à vontade.
Neste momento, ele estava tomado pelo desejo de explorar e tocar cada recôndito do corpo dela. Ele apartou a abertura do sexo dela com seus dois dedos, e deleitou seus olhos com a pele brilhante, com o delicado mel a fluir, com os pelos se encrespando ao redor de seus dedos. Sua boca se tornou mais e mais ávida, como se houvesse se tornado um órgão sexual, capaz de satisfazê-la tanto que, se continuasse a acariciar a carne dela com sua língua, ele alcançaria um prazer totalmente desconhecido. Enquanto ele mordiscava sua carne com tal sensação deliciosa, sentiu novamente que ela tinha calafrios de prazer. Ele a afastou de seu sexo, temendo que ela pudesse vir a experimentar todo seu prazer meramente ao beijá-lo e que ele fosse impedido de se sentir dentro dela. Era como se eles dois houvessem se tornado vorazmente famintos pelo gosto da carne. E suas duas bocas se fundiam uma na outra, buscando as línguas inquietas.
O sangue dela agora fervia. A vagarosidade dele parecia ter causado isto, enfim. Os olhos dela brilhavam, sua boca não conseguia largar o corpo dele. Então ele finalmente a tomou, enquanto ela se oferecia, abrindo sua vulva com os adoráveis dedos, como se não aguentasse mais esperar. Mesmo então eles suspenderam o prazer deles, e ela o sentiu em silêncio, encerrando-o.
Então ela apontou para o espelho e disse, rindo:
— Olhe, parece até que nós não fazemos amor, mas sim que você apenas está sentado sobre seus joelhos, e você, safadinho, você esta com ele dentro de mim todo o tempo, e até tem calafrios. Ah, não posso mais suportar isto, fingir que não há nada dentro de mim. Está me consumindo. Mete agora, mete!
Então ela se jogou sobre ele para que ela pudesse rebolar sobre seu pênis ereto, obtendo desta dança erótica um prazer que a fazia gritar. E, ao mesmo tempo, um relâmpago de êxtase rompeu através do corpo de George.
Apesar da intensidade do sexo, quando ele partiu, ela não perguntou seu nome, não pediu que ele voltasse. Ela lhe deu um leve beijo nos lábios quase doloridos e o mandou embora. Por meses, a memória desta noite o assombrou e ele não conseguia repetir a experiência com nenhuma outra mulher.
Um dia, ele encontrou um amigo que havia acabado de ter recebido prodigamente por alguns artigos e que o convidou para um drinque. Ele contou a George a espetacular história duma cena que testemunhara. Ele estava gastando dinheiro abundantemente num bar quando um distinto homem se aproximou dele e sugeriu um agradável passatempo, observar uma magnífica cena amorosa, e como o amigo de George era um voyeur declarado, a sugestão foi recebida com imediata aceitação. Ele foi levado a uma casa misteriosa, para um apartamento suntuoso e, foi escondido numa sala escura, de onde ele pode ver uma ninfomaníaca fazer amor com um homem potente e particularmente bem dotado.
O coração de George parou.
— Descreva-a — ele disse.
O amigo descreveu a mulher com a qual George havia feito amor, até mesmo o vestido de cetim. Ele também descreveu a cama canopeada, os espelhos, tudo. O amigo de George havia pagado cem dólares pelo espetáculo, mas havia valido a pena e durou por horas.
Pobre George. Por meses, ele teve precauções com mulheres. Ele não conseguia acreditar em tal perfídia, em tal encenação. Ele se tornou obcecado com a ideia de que todas as mulheres que o convidavam para seus apartamentos escondiam algum espectador detrás duma cortina.

Conto extraído da obra "Delta de Vênus".

Biografia

Anaïs Nin nasceu na França. Seu pai foi o compositor Joaquin Nin, que cresceu na Espanha, mas que havia nascido em Cuba, e para onde retornou. Sua mãe, Rosa Culmell y Vigaraud, era de ascendência cubana, francesa e dinamarquesa. Anaïs Nin se mudou para os Estados Unidos em 1914, depois de seu pai ter abandonado a família. Nos EUA, ela frequentou escolas católicas, abandonou os estudos, trabalhou como modelo e dançarina e retornou à Europa em 1923.

Anaïs Nin estudou psicanálise com Otto Rank e clinicou por um tempo como analista leiga em Nova York. Ela foi paciente de Carl Jung por um período também.

Ao encontrar dificuldades para conseguir publicar seus contos eróticos, Anaïs Nin ajudou a fundar a Siana Editions na Franca, em 1935. Em 1939 e com a deflagração da Segunda Guerra Mundial, ela retornou a Nova York, onde ela se tornou uma celebridade entre a comunidade do Greenwich Village.

Uma figura literária obscura por quase toda sua vida, quando os diários dela - mantidos desde 1931 - começaram a ser publicados em 1966, Anaïs Nin surgiu diante do olhar público. Os dez volumes de "O Diário de Anaïs Nin" ainda são bastante populares. Eles são mais do que simples diários; cada volume possui um tema e foram escritos provavelmente com a intenção de serem publicados. Cartas que ela trocou com amigos íntimos, Henry Miller entre eles, também foram publicadas. A popularidade dos diários trouxe interesse para os romances publicados anteriomente. "Delta de Vênus" e "Pequenos Pássaros", originalmente escritos em 1940, foram publicados após sua morte (1977, 1979).

Anaïs Nin é conhecida também por seus amantes, que incluem Henry Miller, Edmund Wilson, Gore Vidal e Otto Rank. Ela foi casada com Hugh Guiler, de Nova York, que aceitava seus casos. Ela também teve um segundo casamento, bígamo, com Rupert Pole na Califórnia. Ela anulou o casamento por volta da época em que ela estava conquistando fama mundial. Ela estava morando com Pole, quando de sua morte, e ele viu a publicação da nova edição dos diários delas, sem cortes.

As ideias de Anaïs Nin sobre as naturezas "masculina" e "feminina" influenciaram a área do feminismo conhecida como "feminismo da diferença". No fim da vida, ela se disassociou das formas mais políticas do feminismo, acreditando que o auto-conhecimento através da redação de diários era fonte de liberação pessoal.

Fonte: http://womenshistory.about.com/od/anaisnin/a/anais_nin.htm





sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

A Sinfonia

Deixou a água do chuveiro percorrer todo o seu corpo, massageando a pele bronzeada. Em seguida, munida de um sabonete barato, lavou-se com esmero, dando atenção à vulva intumescida que em minutos seria ocupada por aquilo que seu amado desejava. Sorriu marotamente, brincado com os pentelhos duros, espessos, que ele a proibira de depilar. “Se um dia você aparecer aqui com esta buceta raspada, tu morre”, ameaçou-a inúmeras vezes. Ela até pensou em fazer uma depilação artística para agradá-lo, esculpindo na penugem negra um coraçãozinho ou mesmo uma fruta que seu amado apreciasse, mas, ordens eram ordens e não convinha a ela discutir.
Saiu do banho e dirigiu-se para o quarto se enxugando. Mirou-se no espelho, contemplando aquilo que a natureza fora com ela generosa. Coxas roliças, barriguinha sarada em horas de malhação, peitinhos durinhos, apessegados, e a bunda incomensurável, de primeira grandeza, bunda brasileira, redonda, rotunda, cuja liliputiana marca do biquíni desenhava uma seta invadindo o rego, como que sinalizando o ânus que seu macho tanto apreciava.
Atirou-se na cama, nua, o corpo úmido marcando os lençóis, desenhando em sua superfície um bem pouco santo sudário. Na cabeceira, um tubo do seu lubrificante predileto. Deitada de costas, pernas abertas, besuntou a cona enquanto pensava se deveria dar prosseguimento ao que seu homem tanto queria. Amava-o sem sombra de dúvidas, contudo, aquilo lhe parecia uma insanidade. Mas era o desejo dele e ela, escrava da paixão, não tinha o direito de lhe negar.
Um misto de excitação e receio invadiu seu espírito enquanto ela introduzia, centímetro, por centímetro, o celular encomendado pelo seu homem dentro da vagina, protegido por um preservativo. Marcelo Escorpião, traficante mais perigoso da cidade, 400 anos de cana, teria o que tanto ansiava naquela visita íntima semanal. Quando o celular sumiu por inteiro dentro do seu esconderijo, ela suspirou aliviada e foi se vestir.
Só não contava em se tornar notícia em todos os meios de comunicação do país. Até no estrangeiro ouvi-se falar dela, pois se esquecera de desligar o aparelho. Os guardas do presídio, atônitos, deram voz de prisão àquela mulher vestida como se estivesse indo ao um templo evangélico quando, durante a revista, ouviram sua vulva tocar a nona sinfonia de Beethoven.





quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Entrevista: Maria Isabel Moura



Maria Isabel Moura nasceu na Covilhã, em 1955. Nas suas palavras, cresceu e aprendeu a magia da leitura na aldeia dos Trinta, em plena Serra da Estrela; o resto dos estudos, correndo a geografia portuguesa: em Sintra, com a sua serra e neblinas, num palácio onde reis e rainhas arrastaram saias, paixões, sofrimentos, loucuras e exílios; em Espinho, com o mar feito fúria, comendo ruas e casas e deixando maresias e poemas no ar; em Lisboa, onde se deixou perder, encantada, pelas calçadas de uma cidade vestida de rosa. Reside actualmente em Guimarães, cidade em que as pedras ainda têm a medida dos sonhos...

É colaboradora do Jornal do Fundão.
Trabalha em parceria com Matos Costa, seu ilustrador constante e companheiro de vida...

Obra publicada:
Vinte maneiras diferentes de contar a mesma história – Prémio Nacional de Conto Manuel da Fonseca 1998;
Todo o começo é involuntário, com prefácio de Urbano Tavares Rodrigues, Editorial Teorema, 2001;
Vou dar pontapés na Lua, contos infantis, Edições Afrontamento, 2004.


Devido ao tema a que este número da revista é dedicado, a entrevista de Maria Isabel Moura gira à volta do livro Todo o começo é involuntário, descrito como um romance erótico que foge ao tom comum na literatura portuguesa.

Samizdat: Porque escreveu este livro?

Maria Isabel Moura: Pelo prazer da escrita, como se escrevem todos os textos…, e porque, pessoalmente, considero a literatura erótica, a infantil e a policial as mais difíceis e queria saber até que ponto eu as conseguia dominar.

Sabemos que o considera “apenas” erótico. Não acha que a crueza carnal de alguns trechos (http://www.geocities.com/arsenio_grilo/moura.html), aconselharia a admiti-lo como pornográfico?
Estes anos depois, como acha que foi qualificado pelos leitores?


E como falar da vida sem crueza carnal? Como descrever uma guerra, uma fome, sem ser cruento?
E depois destes anos todos, estranhamente, não tenho ecos nenhuns dos leitores...

Importa-se com a distinção entre erotismo e pornografia? Como definiria cada um destes géneros?
A diferença está no “que” se diz ou no “como” se diz?


Importo e muito!!
É como a diferença entre brejeirice e ordinarice. A segunda ofende os ouvidos e o intelecto; a primeira é divertida, convoca o riso e a alegria. O erotismo é aliciante, criativo, leva o leitor a recriar o que lê. A pornografia é facial, sem margens imaginativas e as personagens movimentam-se sem depois nem antes.

Qual é a função da literatura erótica, na sua opinião?

A mesma função de toda a literatura: abrir a alma, abrir as comportas do sonho, da vida, do mundo, do estarmos aqui, agora e vivos! Que honra, esta de estarmos vivos.

Na sua percepção, o que diferencia a literatura erótica escrita por um homem daquela escrita por uma mulher?

Creio, e aqui entro no campo das incertezas, que a escrita masculina preocupa-se menos com os porquês. Que na literatura erótica feminina é muito importante saber o que motiva as personagens.

Li numa entrevista (http://www.arlindo-correia.com/061102.html), que preferiu abordar as fantasias masculinas às femininas. Não sendo homem, recorreu a que fontes para saber dessas fantasias? Que há de diferente entre “fantasias femininas” e “fantasias masculinas”?

Onde fui buscar as fantasias masculinas? Pois, vampirizando todas as confidências, todas as conversas, todas as vidas que por mim passaram. E não é essa a vocação do escritor, a de vampirizar as vidas alheias?

O filósofo Georges Bataille traça uma relação entre sexo, violência e morte – todas são instâncias de transgressão da normatividade, de liberação da nossa animalidade.
Identifica estes elementos na sua escrita?


Neste livro, é através de toda a violência e sexo, que se matam os fantasmas de toda uma vida e se renasce. De modo que sim, estão lá todos esses elementos...

Na descrição da obra pela editora, é mencionado que a sua escrita se aproxima da “de Sade, de Henry Miller, de Anais Nin”. Concorda com isso?

Como poderia não estar? São três ícones da literatura erótica e era exactamente o que eu estava a tentar escrever.

Na já citada entrevista, encontrei este trecho:

MTH – Sente-se mais perto, literariamente, do Henry Miller ou da Anais Nin?
MIM – A Anais Nin é mais poética e eu espero ter posto neste livro alguma poesia, portanto sinto-me mais perto da Anais Nin.


Não apenas no seu livro, mas também na prosa de ficção de outros autores que já tenha lido, quando acontece a aproximação entre prosa e poesia?


As palavras são uma coisa muito engraçada, têm textura, cor, sabor... e quando um texto em prosa consegue que a paisagem para lá da janela seja a de dentro dos nossos olhos, entrámos na poesia.

Falando da sua obra: como se processa a poesia na sua prosa? Está no todo da obra (o que qualifica todo o romance como uma grande metáfora) ou está em alguns pontos em que a narrativa se dilui em expressão poética?

Neste livro, a escrita processa-se em ondas, depois de um trecho o mais cruento possível, segue-se a acalmia poética. Foi um processo voluntário.
Ao contrário, na literatura infantil, tento que todo o texto seja poético.

Numa época dominada por imagens, pelo cinema, pelos vídeos no YouTube, existe espaço para o erotismo em palavras? Ou, melhor dizendo, para quem escreve?

Para começar, para mim mesma.
E, espero, desejo, anseio, que o espaço da literatura continue a existir. A palavra escrita deixa todo o espaço aberto para o sonho, para o raciocínio, para a recriação. No fundo, para uma liberdade que os audiovisuais não dão.

Como é a recepção das suas obras entre os leitores e a crítica portuguesa? A forte herança católica de Portugal é um obstáculo a ser superado pelos autores de literatura erótica?
E de leitores e críticos brasileiros – ou, ao menos, não-portugueses – já recebeu algum comentário? Sabe como foi a receptividade deste seu romance fora de Portugal?


O estranho deste livro é a discrição com que tem caminhado. Não tenho praticamente ecos nenhuns, o que me tem espantado francamente. Na altura do lançamento, e exactamente por causa da herança católica, esperava algum escândalo, mas fez-se um enorme silêncio. Talvez este silêncio seja bem mais significativo do que todas as polémicas.

A publicação dum livro deste cariz criou obstáculos às suas posteriores publicações? E à sua vida pessoal?

Precisamente devido ao enorme silêncio que se fez à volta deste livro, não senti problemas de espécie alguma. Creio que o facto de ser prefaciado por Urbano Tavares Rodrigues tenha influência.

Tenciona escrever mais livros na linha deste? Existe mercado para o erótico?

Existirá sempre um mercado para o erótico, já que sexo é vida e queremos estar vivos.
Quanto a eu escrever outros livros eróticos, não sei... para já brinco com micro-relatos, e vasculho a minha infância naquilo que chamo o Alfabeto das Saudades...

Qual foi o maior obstáculo que teve de superar para consolidar a sua carreira literária? Quais são os grandes desafios para um escritor, actualmente?

Os desafios são os mesmos de sempre: ter leitores. E nem sequer quero entrar na polémica de editor, distribuidor, escritor... Isso dá de imediato o cansaço de todas as respostas, de todos os debates...


Coordenador da entrevista:
Joaquim Bispo

Perguntas feitas por:
Henry Alfred Bugalho
Joaquim Bispo
Maria de Fátima Santos
Volmar Camargo Junior





quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Transæ

Caio Rudá de Oliveira

Passada uma década, ela lá, sentada com o namorado. Seu corpo havia ganhado mais curvas e mais volume; meus olhos, mais volúpia. Seios cabíveis em minhas mãos despudoradas, fina cintura e pernas longas e ousadas vestidas num short de palmo e meio, convite ao sétimo pecado capital.

O namorado, um sujeito não muito bonito. No máximo um peitoral estufando uma ridícula camiseta rosa. Sua vantagem deveria ser o sexo: ou bem dotado ou bom deitado. E eu, com tais dádivas agraciado. Tê-la, apenas uma questão de oportunidade.

Esperei até que ela fosse ao banheiro, unissex como se previamente definido por Asmodeus. Copo no balcão, em delírios lascivos a segui.

Dentro da cabine, sua vasta pélvis encaixada em mim, de surpresa. Sem reação. Gostou. Minhas mãos nas coxas largas. Virou-se e arriscou apalpar-me. Descoberto o volume. Esboços de gozo no sorriso. Calças abaixo, pênis para cima. Mais que macias, mãos mágicas, fazendo crescer, inchar, enrijecer.

Não fosse o som da descarga ao lado, ela não teria sido espantada. Da minha mente.





Contos precoces

Caio Rudá de Oliveira

Sonho erótico
Acordou melado.


Necrofilia
O corpo jazia. Os libidinosos saprófagos comiam-no despudoradamente.





Ejaculação Precoce

- Adorei o jantar hoje... gostaria de subir pro meu apê?
- Ahhhhhhhhhhhhhhh...





Prova Final - Miniconto - Giselle Sato

Era exibida, obscena e descarada. Puxou o tecido, roçando de leve a pele nua. Insinuou a mão sentindo a umidade.
Separou as pernas, deslizou o corpo na cadeira até a beirada. Com a ponta do sapato, dava impulso, balançando as coxas e quadril. Totalmente exposta, primeira fileira, sala lotada e prova final.
O professor deixou a turma sozinha e saiu às pressas. Calmamente, ela tirou o papelzinho com a cola e copiou as respostas.





A filha da carola e seus pecados- Giselle Sato

A filha da carola e seus pecados

Após a morte da mãe, vivia assombrada pelo medo. Temia o fardo dos pecados que carregava. E as pragas da defunta carola. Na missa de sétimo dia, reuniu forças e foi ao confessionário. Tremia, o lenço na testa enxugando o suor contínuo. Desistiu. Naquela noite, o puteiro festejou o retorno de ‘’Maria Boqueteira’’.





Acto falhado

Joaquim Bispo

Antes de se deitar, Fábio resolveu dar-se o mimo de uma pequena ceia. Pôs a mesa com todos os requintes, sem esquecer o guardanapo. Pegou no atiçador e começou a espevitar o tição da lareira, enquanto pensava em Susana.
Com o corpo dela no pensamento, fechou os olhos e esqueceu-se que continuava a atiçar o fogo. Um momento foi quanto bastou. De súbito, percebeu que o leite ia levantar fervura, mas só quando foi por fora tomou consciência que Susana não estava lá para o conter.
Derramou-se todo.
Acabrunhado, foi-se deitar ainda com fome.





O segredo

Joaquim Bispo

Catarina não se calava, enquanto não matasse a curiosidade:
– Só te perguntei se tinhas alguma cunha, porque é sabido que o Vasconcelos apenas admite louras altas para a secção dele. Ora tu, morena e redondinha, como é que conseguiste entrar? Tu não me leves a mal. É que parece que havia louras a concorrer …
Marília, já cansada de dar respostas evasivas à amiga, decidiu que era hora de lhe revelar o segredo. Abriu a malinha de mão e mostrou o conteúdo, onde sobressaía um objecto ovóide cor-de-rosa de cinco por três centímetros.
– Este ovinho é a resposta – concluiu, com um sorriso seguro.
– Não compreendo. Um ovo de plástico? O que é que isso tem que ver?
– Este ovinho é um vibrador de uso interno, sem fios. É comandado por este controlo remoto de sete velocidades. Uso-o para as faltas do Pedro, e também por desfastio no emprego. Devias comprar um. É silencioso, não se dá por ele, mas mexe-se dentro de nós, vibrando ou pulsando, conforme a velocidade. Quando vou a uma entrevista com um homem, ponho-o dentro de mim, como um tampão, e, na altura, ligo-o na velocidade dois. Há muito tempo que descobri que os homens não lhe resistem. Um humedecer de lábios, um mexer no cabelo, podem ser interpretados como manobras de manipulação, por um homem experiente; a excitação branda que este ovinho provoca no meu corpo não tem defesa. Por detrás do brilho genuíno no meu olhar, o homem, de alguma maneira, capta a onda de prazer sensual que o meu cérebro activado emite. É fatal.





Microcontos

A Visita

- Deixa eu abrir tua blusa.
- ...
- Que peitinhos bonitinhos.
- ...
- Que pele macia.
- Tio, a mãe 'tá vindo!
Eles se aprumam.
- E aí, o que vocês estão conversando?
- A Lili estava me contando sobre a escola. Pelo que posso ver, essa minha sobrinha é ótima... aluna.

***

Espiando

Era um voyeur.
Brincava sozinho, vendo a vizinha trocar de roupa.
Numa noite, ela abriu toda a cortina, acenou para ele e se despiu.

Brochou.

***

A passageira alegre

Tinha orgasmo duas vezes ao dia. Tremelique do ônibus indo e voltando do trabalho.





terça-feira, 13 de janeiro de 2009

oI


Vem

Vamos meter teu ó que espera húmido, molhado e quente, fremente
em meu I extenso que já está pronto, com ponto e em ponto
e vamos colar, fazer bem bom sem palavra nem razão

Sempre diferente sempre, talvez por trás, talvez de frente,
sempre distinto único alto abaixo, Bach fuga, contraponto,
um oI pleno, gostoso e intenso, cheio de tesão





Teu corpo

És morena beleza, natureza tesa que tenta
Fogo intenso aceso sem qualquer fio e pavio
Forte corrente e nós teu sinuoso leito de rio
 
És chama que inflama na cama e me chama
Calor forte que logo me aquece e enlouquece
Rumo perdido por teu corpo percorrer sem GPS

Quando subimos e descemos juntos o desejo
No prazeroso completar de "puzzle" encontrado
Nesse meu no teu a meio de percurso encaixado

Quando devagarinho, devagar, depressa
Colamos e percorremos juntos o caminho
Depressa, depressa, devagar, devagarinho...





segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Uma Noite

Guilherme Augusto Rodrigues

Era uma noite fresca e estrelada. A lua cheia clareava parte do quarto escarlate. O vento suave esvoaçava as cortinas grenás. De robe de cetim e sentada na poltrona, pensando na vida e fumando um cigarro. Quando, de repente, sente um calafrio. Algo diz:
– Boa noite, querida.
– Quem está aqui? Qual é seu nome? – perguntou assustada.
– Que importa meu nome e quem sou se temos uma noite linda somente para nós?
Com medo e frio, ficou calada. Não havia respostas.
Sentiu uma mão morna e leve esfregar-se em uma de suas pernas, mas não era uma mão, não era nada, apenas sentia. Não via nada. Sentia sua presença.
Era bom e gostava. Deliciava-se. Nunca tinha sentido nada igual. Deixou-o prosseguir.
Por toda a noite ficou se contorcendo e gemendo. Arranhava, apertava os lençóis com as mãos e mordia os lábios.
O que era? Não era, não era. Continuou dominada por este ser sem ser. Não importava, queria mais, muito mais.
Uma grande explosão no céu desfez tudo num instante.
– Vou embora.
– Não, não vá. Fique comigo.
– É hora de ir. Preciso.
– Não o verei mais? Não voltará?
Foi-se da mesma forma que chegou.
A mulher, vertiginosa, chorou...
Desde então a noite passou para um tom melancólico e romântico.





domingo, 11 de janeiro de 2009

10 indrisos eróticos

ISIDRO ITURAT

EL CIMBREO


El movimiento parte en espiral

de la concavidad entre omoplatos

cuando camina la hembra hipersensual.


Baja a la nalga y danza la cadera

como danza en Brasil o en Senegal,

y el macho, loco, mira y se exaspera.


Ya en el Edén un árbol movió así


su fruto, y Eva dijo a Adán: “Es pera...”.

***

Mis ojos ven el norte a través de tu nuca,

los tuyos otean sures, a través de la mía;

mi espalda son dos senos que incipientes despuntan;


cuatro pulmones se superponen, y ausculta

dos corazones que bombean en la misma

tórax y cuatro sierpes que en el vientre se acunan.


Llega mi sexo al norte, al sur el tuyo excita;


y el desplazarse es danza del aquí, y todo, y ultra.

***

LEDA EN EL ESTANQUE

¡Ah, qué hermoso cisne!

¡Qué plumaje tiene!

¡Mira, viene, viene!...


¡Qué dócil, qué cálido,

qué suave, qué afable!

(y qué acariciable...).


¿Qué hace entre mis piernas?


¿Qué hace?... ¡qué!... ¡ah!...

***

CÓPULA POR UNA MANADA DE TOROS

Ella, decúbito supino, será penetrada

por el primero por detrás. El segundo instala

en el febril yoni la linga, que, erguida, demanda


dar placer. Boca en la tercera verga, y no separa

la lengua el tacto con el glande. Luego, ella ama

con ambas manos a otros dos sus dos cerbatanas...


La que conozca el arte oculto hallará el nirvana


(esta destreza se consigue sólo con la práctica).

***

Vestida eres la mujer decente,

ser de costumbres que cuida el hogar,

como era en el siglo precedente.


Desnuda eres bestia sorprendente,

de caderamen-río-serpear

por fuera, avis rara iridiscente,


y adentro ardor que hasta ahora no se vio.


Sin decir nada me miras, y yo...

***

MENAGE A T...

Justine se come la verga de Paul.

Morena, lleva la marca del sol

en los pezones, y en el caracol.


Justine recibe la verga de Etienne

en...”¡animal!” y “¡cabrón!” y... “¡qué bien!...”.

La cama es mar de saliva y semén.


Justine, la diva lasciva de Paul.


Justine, la perra sumisa de Etienne.

***

SUEÑO DE LA FLOR DE LOTO

Soñé: una mujer de color de azafrán.

Soñé a la mujer de las joyas de jade,

del loto danzante en el pubis de pan.


Me dijo: “El rocío que posa en mi flor

el sol lo calienta y se endulza de amor,

repite quien prueba de este licor”.


De pétalos rosas quedé embriagado...


aguardo sin sueño ya el nuevo sopor.

***

CICCIOLINA Y EL BOA CONSTRICTOR

Hoy el perro no, el burro tampoco,

¡hoy el boa, el boa, el boa constrictor!

(tiene fría la sangre, pero da calor).


¡Psss! ¡psss! ¡psss! ¡boa! ¡boa!... tu cola me gusta

pues conforme entra... aumenta el grosor

(tienes fría la sangre, pero das calor).


Y si me hipnotizas, y tu lengua bífida


me lame... ¡ay, boa! ¡me darás calor!

***

BALADA DE LAS DOS HERMANAS

La hermana mayor besa con su boca

a Juan, el pastor.

Un caballo en la cuadra se desboca.


La hermana menor ha oído el temblor

y no tiene poca

gana de ser yegua ni de ser mayor.


La hermana mayor sabe ya de amor.


La hermana menor relincha y se toca.

***

RETRATO DE INTERIOR EN VERSO:

MUJER DESNUDA APOYADA EN LA VENTANA

Puesto que no sabrían mis manos retratarte

con los pinceles húmedos y su policromía

habré de usar palabras para inmortalizarte:


el sol posee tus senos, tus nalgas la penumbra,

eres la media luna que en la mitad del día

de fuera a adentro tienta, de dentro a afuera alumbra.


Así de hermosa eres la invocación del arte:


cuerpo, amor, aire, ensueño... la obra se vislumbra.

***

Isidro Iturat nasceu em Vilanova i la Geltrú, Espanha, em 1973. Escritor e professor de língua e literatura espanholas. Reside em São Paulo desde 2005. Expressa-se poeticamente através do indriso, a forma criada e "batizada" por ele mesmo, que já ganhou muitos adeptos, alguns aqui na SAMIZDAT.





O jardim dos amantes, por Leo Borges

Leo Borges

Eu lembro de meus oito anos, quando vi pela primeira vez Samira, a vizinha de frente. Ela tinha o triplo da minha idade, era casada, feições árabes; não era só linda, era encantadora. De noite eu ficava admirando pela janela aquela magnífica mulher, buscando ângulos para melhor admirá-la. Pra mim ela era a fada das histórias infantis que tomou vida, uma entidade que abençoava a todos com seu charme, beleza, carisma. Quando voltava da escola eu passava no jardim próximo à sua casa, arrancava uma flor e parava à porta da minha rainha para oferecer-lhe, como uma inocente oferenda de um guri apaixonado. Muitas vezes o marido atendia e achava graça naquilo. Chamava Samira e mostrava a cena. Eu ficava vermelho, mas não perdia a oportunidade de receber um beijinho na testa da minha dançarina. Sim, dançarina. Por vezes a via dançando um ritmo que, muito depois fui saber, se chamava 'dança do ventre' para seu marido. Muitos poderiam achar que ele era sortudo por ter aquela dádiva em casa, mas eu, mais que qualquer outro, tinha a certeza de que ela dançava para mim. Do cárcere do meu quarto, via seu corpo ondulando, ornado com adereços nos braços, um véu no rosto. Seus trajes reluziam quase tanto quanto sua pele, mas muito menos que seus olhos. Nessas horas eu fazia o jogo das pétalas com alguns crisântemos vagabundos que eu pegara no jardim. O bem-me-quer vencia sempre, mostrando o presságio tão natural quanto a vivacidade daquela dança.

Minha mãe era mulher religiosa, mas não se importava com meu ingênuo "namoro" com Samira. Até que certo dia ouvi uma conversa dela com uma outra vizinha em que ela falava da minha Sam. O som daquele nome despertou minha atenção e parei escondido para tentar entender melhor. Minha mãe falou que Samira tinha um amante. Eu ri baixinho e achei engraçado, porque na verdade ela não tinha 'um' amante. Ela tinha 'vários'. Pelo menos na minha lógica de menino eu pensei assim, achando ingenuamente que a palavra amante tinha a ver com a palavra amor, ou seja, coisa boa. Ora, como Samira era uma pessoa querida por todos ali, todos eram, conseqüentemente, seus amantes! Saí alegre acreditando firmemente que eu também era amante de Samira. Nesse dia eu fiquei feliz, mais feliz que em todos os outros. Então, numa certa tarde em que ela estava conversando com minha mãe, paradas perto do jardim onde colhia as flores, eu corri para perto e disse, todo animado: "Samira, eu também sou seu amante!".

- Que amante o que, moleque! – gritou ferozmente minha mãe. Não sei como o safanão que ela me deu não desgrudou minha cabeça do meu pescoço. Rodopiei zonzo. Ao recobrar o equilíbrio, chorando, vi Samira me defendendo, brigando com minha própria mãe, dizendo que ela nunca poderia ter me batido daquele jeito. Corri pra casa, pro quarto, pra debaixo da cama, perdido em meu mundo que, definitivamente, não tinha nada a ver com o mundo adulto. Mas o fato de Samira ter me defendido de uma possível injustiça fez minha admiração por ela crescer e a dor serenar. A partir daquele momento eu tive certeza de que ela era, de verdade, minha amante.

Dez anos se passaram. Durante esse tempo, minha mãe deixou de falar com Samira, de convidá-la para meus aniversários. Ela não fez mal nenhum para Samira, mas fez mal para mim. Não pude mais entregar minhas flores para ela e nem enamorá-la pela janela. Que mundo estranho o dos adultos! Tempo de incongruências onde "amante" significa "ódio" e "amor" um sentimento proibido, rechaçado com violência, aos cascudos e pontapés.

Com dezesseis comecei a namorar uma menina da minha idade. Aqueles namoros de mãos dadas, igreja aos domingos, cinema às vezes. Famílias conservadoras, devotas. Aos dezoito, ficamos noivos. Não era o que eu queria, mas era muito mais conveniente para todos. Eu não gostava de Suellen, a minha noiva. Eu saía com ela, mas não a conhecia, não tinha intimidade sequer para ofertar-lhe uma margarida vadia. Seria até traição, pegar uma flor do meu santuário e dar para alguém que não fosse a minha Sam. Samira continuava nossa vizinha e, ainda que eu não levasse mais flores para ela, era essa, sim, a minha verdadeira mulher, não só dos meus desejos, mas da minha vida. Foi então, numa tarde muito chuvosa em que eu estava voltando do trabalho na papelaria, que um carro parou ao meu lado. Eu estava com a mochila sobre a cabeça tentando me proteger inutilmente da água que caía abundantemente do céu, quando vi o vidro do carona descendo. Era Samira.

- Entra! – ela disse.

Meu coração bateu forte ao vê-la. Ela estava linda como sempre num vestido branco que realçava sua pele morena. Perguntou algumas coisas e fui respondendo, alegre por estar perto dela. Indagou se minha mãe estava mais calma. Perguntou por minha noiva, o que me deixou ansioso.

- Nunca mais recebi flores suas – brincou, descontraindo.

Fiquei sabendo que o trajeto que ela fazia para voltar do trabalho passava pelo meu. Então, as caronas começaram a se tornar freqüentes. Ela me deixava dois quarteirões antes de nossas casas para minha mãe não ficar sabendo. Minha mãe não mais me batia, mas qualquer aproximação com Samira era visto como uma tentação diabólica. Tão ingênua a minha mãe! Era Samira, na verdade, meu anjo da guarda e era impressionante como ela me passava vibrações boas, fluídos que traziam calma e ao mesmo tempo amor. Eu gostava de estar perto dela, de conversar com ela, de saber sobre sua vida. Numa das vezes em que apareceu para me buscar um vendedor ambulante de flores que passava por perto percebeu e mandou: "não vai levar flores pra sua amada?". Eu ri da situação e comprei dele aquilo que sempre havia dado pra ela. Quando entrei no carro ela levou um susto, mas vi que adorara a surpresa. O relógio marcava pouco mais de seis da tarde.

- Vamos por um outro caminho hoje. O trânsito por aqui está muito ruim – disse.

Eu não sabia que existia outro caminho. O atalho pareceu longo demais, até que percebi que na verdade ele não existia. Fiquei perplexo quando ela parou o carro na entrada de um motel. Eu não imaginava que aquilo fosse verdade. Talvez fosse mais um outro sonho dos tantos que eu já tivera com ela. Mas se fosse realidade era uma realidade esquisita, porque, para minha eterna angústia, ela era casada.

- Avisei a ele que vou chegar mais tarde. Depois você liga pra sua mãe e pra sua noiva e dá uma desculpa. Você vai aprender que em sua vida íntima ninguém deve se meter, nem sua noiva, nem sua mãe, nem sua futura esposa. Isso se chama liberdade.
Minha cabeça ficou dando voltas. Eu tinha vontade de ter aquela mulher desde meus sete, oito anos de idade, desejos impossíveis de um garoto que finalmente se realizava. Coisa de difícil compreensão. Tentações, flores, traições, pecados. Liberdade. Suellen não entenderia bem isso. "Bem vindo ao mundo adulto", pensei, nervoso enquanto seguia cadenciado os passos de Samira até o quarto do motel.
Meu coração batia forte, numa mistura de medo e ansiedade, vontade e repressão. Nunca tinha estado em um quarto daqueles e achei interessante toda aquela sofisticação, a piscina com uma pequena cascata, o teto com iluminação escondida em penumbra. Mas o melhor foi o jogo sensual que Samira fez ao se despir. Parecia dançar para mim a tal dança do ventre que antes eu era obrigado a compartilhar com seu esposo. Seus 34 anos se revelaram juvenis, talvez mantidos pela seiva das flores que eu lhe dava quase diariamente.

- Sou virgem – declarei.

- Eu imaginava – disse ela sorrindo com olhos. Como vizinha de frente ela conhecia minha vida de garoto regrado pela mãe conservadora.

Ela disse para que eu não me assustasse, porque tudo o que iria acontecer era para o nosso prazer. Ela tomou a iniciativa de me abraçar. Pude sentir aquela cintura que por dez anos viviam desfilando em minha frente, separada de mim por uma rua e um jardim. Logo senti finalmente o sabor gostoso de sua boca enquanto suas mãos varriam minhas costas. Aquilo era uma loucura, sem dúvida! Mas uma loucura que eu não abriria mão, não naquele instante. Sentei na cama, orientado por ela. O nervosismo atrapalhava minha concentração e, por isso, meu pau não estava totalmente duro. Sam, vestida apenas com uma fina calcinha azul turquesa, era a representação máxima de meu desejo. Senti um arrepio que percorreu todo o meu corpo quando ela tocou minha glande com seus lábios. Não tardou para que meu pau crescesse tudo o que podia dentro de sua boca. Como era gostoso aquilo! O máximo que Suellen fizera comigo foi uma punheta batida rápida e sem direito a gozo na sala de casa. E agora aquela boquinha mágica brincava comigo, tão dançarina quanto sua dona. A língua ficava girando, massageando a glande com uma suavidade mística. Não conseguia contemplar bem a face de Samira porque seu cabelo impedia uma visão apurada, mas isso não importava, pois sua chupada já dizia tudo, mostrava o que eu não podia enxergar. Durante alguns minutos ela mamou devagar, sem pressa. Eu estava quase gozando quando ela, experiente, parou, pressentindo isso. Fomos para o centro da cama e ela tirou sua última peça de roupa. Ficamos vestidos apenas com nossas alianças, a dela na mão esquerda, e a minha na direita.

De forma instintiva, comecei a mamar seus peitos, que eram fartos, do tamanho ideal para meu deleite. Ouvi seus primeiros gemidos quando passei minha mão por sua buceta já bastante molhada, enquanto minha boca descia por seu corpo, sem descolar, visitando o umbigo delicado. Mesmo nunca tendo tido um contato com uma mulher daquela maneira, parecia que éramos amantes há muito tempo. Tudo acontecia sem mancada, sem erro, sem interrupção. Os atos eram leves, encaixados, simples, necessários. Não demorou e eu estava passeando com minha língua nas adjacências de sua virilha, maravilhado. Mesmo de olhos fechados encontrei sua bucetinha pulsando interessada. O aroma lembrava o das flores do jardim de nossa rua, de nossas vidas. Lambia aquela carne quente ouvindo os gemidos de Samira, que soavam como canções, ruídos sem nexo que eram mais honestos que um "eu te amo". Coloquei a língua para dentro, tirando rápido. Não sei se fazia certo, mas o certo nessas horas é um acordo mudo entre os envolvidos. E nesse nosso acordo não havia engano, só certezas.

- Vem que você vai virar homem comigo agora – disse.

Uma revolução que não daria para descrever aconteceu dentro de mim quando senti meu pau tocando sua buceta totalmente receptiva, tão úmida quanto feliz. Samira me abraçava com força ao tempo em que jogava suas pernas por sobre minhas costas. Aquilo fazia com que eu entrasse nela com mais vontade, sem receios nem hesitações. Minha mãe tinha razão! Samira não era minha amante, era muito mais que isso. Seus gemidos se transformaram em gritos ratificando seus sentimentos. Ela não mais mexia, dançava sob mim, rebolando, instigando, querendo tudo, como uma puta totalmente fora de si. Sua verve árabe era traduzida no gingado de seu quadril, executando uma dança do véu ou algo parecido. O pau entrava e saía já com ardor, impregnando o quarto com cheiro de sexo, de carne, de alma entregue. Como era gostoso comer aquela mulher, torná-la minha amante. Um sonho infantil que agora se realizava.

- Mete que você é meu, mete que você é meu – gritava ela e eu acreditava mais do que nunca naquilo, pois sentia que ela era minha também, e que sempre havia sido.

Meu primeiro gozo dentro de uma mulher foi tão contagiante que acabei perdendo a noção da situação e pedindo ela infantilmente em casamento. Por sorte ela demorou para se recompor, para voltar ao normal e nem entendeu o que eu disse. Ali nós éramos mais que amantes, mais que cônjuges ou mais que namorados. Desisti do noivado com Suellen, arranjei um trabalho que me desse maior suporte financeiro, de maneira que eu não dependesse tanto da minha mãe. Mantenho o caso com Sam até hoje. A diferença de idade em nada atrapalha e, sempre que possível, nos vemos, apesar de ela continuar casada. Por vezes pergunto a ela se vamos continuar eternamente juntos nessa vida nem tão secreta, mas certamente incrível, no que ela sempre responde:

- A eternidade sempre acaba, mas a liberdade não. Essa só acaba quando não houver mais flores no jardim.





No elevador, de Mariana Valle

Mariana Valle

Era um belo dia de verão. Daqueles que só a cidade maravilhosa sabe produzir. Com o corpo fervendo sob o comportado tailleur de marca, ardia no peito de Daniela uma vontade irresistível de andar nua. Mas, embora sonhasse com uma praia, ela estava indo para o trabalho. E pra variar, atrasada. Por isso, ao entrar no elevador, mirou-se no espelho a fim de dar os últimos retoques na aparência. Como acontece com todas as mulheres quando se olham no tal vidrinho refletor, Daniela esqueceu do mundo à sua volta. Aliás, esqueceu até do motivo que a tinha levado ao elevador: ir para a garagem para pegar o carro. Por isso, Dani não apertou sequer um botão, mas mesmo assim, o elevador pôs-se a descer. E parou no quarto andar.

Gabriel, o vizinho boa vida que insiste em mostrar os músculos peitorais e abdominais muito bem esculpidos no seu traje informal, short e chinelo, entrou e deu um sorriso acompanhado de um “bom-dia”. Ela, com tal visão do paraíso, lembrou-se do inferno de dia que a esperava: muito trabalho, broncas do chefe, aquela reunião maçante com o cliente mala... Melhor nem lembrar! Daniela então esticou o braço para apertar o 3G, mas levou um baita susto ao ser interrompida por aqueles músculos morenos. Gabriel apertava o botão de emergência, aquele botão que a gente sempre sonhou apertar um dia para ver como é.

Esta era a sua oportunidade. Daniela sempre suspirou ao ver aquele vizinho e sempre teve curiosidade em saber como seria transar no elevador. Ela só não podia imaginar que iria unir dois desejos num só: traçar o vizinho e ainda por cima no elevador!

Fingindo inocência, afinal de contas um fingimento de vez em quando não faz mal a ninguém, ela lançou um "O que houve?". O vizinho respondeu com um beijo tão ardente que Daniela tinha a impressão de estar queimando nos caldeirões do inferno, não fosse aquele beijo o ato mais divino que experimentara.

A essa altura, já não era mais possível fingir surpresa ou consternação e ela deslizou as mãos por aquela barriga de tanquinho e parou com os dedos na borda superior do short. Foi beijando centímetro por centímetro daquela pele, desde o pescoço até o short, que rapidamente foi tirado com as afoitas mãos de Daniela. O membro de Gabriel estava totalmente ereto e ela não via a hora de senti-lo dentro de si. O vizinho, por sua vez, resolveu despi-la com a pressa de um faminto que come um banquete após dias de jejum.

Os dois corpos escorregaram para o chão, ele por baixo, ela por cima, e assim, encaixados, dançaram num ritmo que começou como o balanço de um barco flutuando por ondas calmas. Pouco a pouco, a maré foi se tornando violenta e, num instante, já lembrava um mar revolto pela tempestade. As ondas iam e vinham de tal maneira intensas que Daniela estava prestes a explodir de prazer num grito.

- AAAAAHHHHHHH!
- Calma - responde o vizinho - apertei sem querer o botão de emergência, mas consegui matar a barata. Viu? Estamos são e salvos, e assim você não vai se atrasar para o trabalho. Tenha um bom dia!

Daniela demorou alguns segundos para se recompor e, quando conseguiu encarar a barata morta no chão, uma lágrima escorreu lentamente pelo seu rosto. Ela não chorava a morte do bicho e sim porque ali morria talvez a única oportunidade de realizar seu desejo.

***

Mariana Valle
Escrevendo desde os 12 anos, essa carioca frequentou oficina literária e traduziu sua adolescência em poesia, mas, ao entrar no mercado de trabalho, abandonou a escrita. Foi apenas em 2007, aos 33 anos, quando largou o emprego como jornalista da TV Globo, que Mariana se reencontrou com a literatura e lançou o blog www.marianavalle.com, com seus poemas, contos, artigos e crônicas, como a irônica série "Sorria, você está na Barra", que dá nome a seu primeiro livro, lançado em 2008.