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segunda-feira, 3 de março de 2014

SOBRE A PALAVRA
(fragmentos)

[...]

2

A palavra
          é água,
que escorre,
          indômita,
nos rios da fala,
por entre as gretas
          do silêncio.

[...]

4

A palavra
feriu o sábado,
como um navio
recortasse o mar

(um cais
de abandono).

Um blues
      em mim
dividiu-me
em ondas de
a/mar-
         guras.
  
5

A palavra espera,
feito cão dormente.
Ao menor descuido,
lhe encrava os dentes.
  
6

Se a palavra fere
(seta sem retorno),
no vão do remorso
nasce mais um morto.

7

E não há mistério
na palavra dita.
Ela se abstrata
tão só quando fica.

8

Se a palavra fica
retrátil ao encontro,
perde o objeto:
gera-se um monstro,

que corrói, aos poucos
sua sanidade,
criando um lodo
sobre o que se sabe.
  
9

Mas o que se sabe
é ilusão, arroubo,
de sentir-se sábio
à custa do outro.

E se há silêncio
na sabedoria,
a palavra rompe
o véu da hipocrisia.

[...]

11

O sal das palavras
não sai pelos olhos.
Elas se destilam
por todos os poros.
  
[...]

13

O surdo-mudo
é quem melhor
trata as palavras.

A relação é
       interna
            visceral
               profunda.

(É assim que a palavra brilha.)

[...]

15

A palavra
       é parede
na qual
       eu quebro
             a cara.

[...]




Edelson Nagues

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Edelson Nagues
(nome literário de EDELSON RODRIGUES NASCIMENTO) é natural de Rondonópolis/MT e radicado em Brasília/DF. Estudou Direito e Filosofia, com pós-graduação em Língua Portuguesa. É poeta, escritor, revisor de textos e servidor público. Na década de 1980 e início da década seguinte, em seu estado de origem, atuou na área musical, como vocalista e principal letrista do Grupo Reciclagem, tendo participado de vários festivais universitários e de festivais regionais e nacionais da Caixa Econômica Federal, obtendo diversas premiações, inclusive como intérprete e letrista. Na época, funcionário da CEF, atuava como representante do então recém-criado Conjunto Cultural (hoje denominado Caixa Cultural) em Mato Grosso. Premiado e/ou selecionado para coletâneas em vários concursos literários, entre os quais se destacam: Concurso Nacional de Poesia “Adilson Reis dos Santos” (2012, Ponta Grossa/PR), XXXIII Concurso “Fellipe d’Oliveira” (2011, Santa Maria/RS), Prêmio Prefeitura de Niterói (2011), XXI Concurso Nacional de Contos “José Cândido de Carvalho” e XII FestiCampos de Poesia Falada (ambos em 2011, Campos dos Goytacazes/RJ), Concurso Novo Milênio de Literatura (Vila Velha/ES, 2010), IV Concurso Nacional de Contos do SESC-Amazonas (2010, Manaus/AM), VI Desafio dos Escritores (Brasília/DF, 2010), XL Concurso Literário “Escriba” (Piracicaba/SP, 2009). É autor dos livros Humanos (coletânea de contos premiados) e Águas de Clausura (de poesia, vencedor do X Prêmio Livraria Asabeça), ambos publicados pela Scortecci Editora. É membro correspondente da Academia Cachoeirense de Letras (de Cachoeiro de Itapemirim/ES) e mantém (ou tenta manter) o blog pessoal www.senaoescrevodoi.blogspot.com.
todo dia 03


4 comentários:

Então, vem filho novo por aí, hein? Que maravilha! Tudo me toca, tudo é profundeza onde a ( sua) palavra prolifera. Beleza em fragmentos. Levo este: "Se a palavra fere
(seta sem retorno),
no vão do remorso
nasce mais um morto.

Obrigado por sempre prestigiar este escriba, Cinthia. Tais palavras vindas de vc me envaidecem mto. Ah, o novo livro ainda está em gestação... Grande abraço.

Edelson, por que você é tão bom assim?! Que show está esse seu poema! Parabéns, Poeta, pra mim, o melhor da atualidade.

Mto obrigado, Cecilia. Quisera eu fosse pelo menos metade do que vc acredita que eu seja... Grande abraço, amiga.

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