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segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

REDOMA


Em meio ao caos, a redoma.
No meio da redoma, um ser.
Pária, tratado com desprezo, isolado do convívio social.
Jogado de um lado para o outro, ao sabor do momento – do mando e desmando.
Desespera-se.
Confronta.
Resigna-se.
Perde-se.
Regido por convenções que lhe são ignoradas à princípio, obriga-se sobreviver, adaptando-se paulatinamente, usando a observação; com o tempo, não há novidade – tudo se torna variação de uma conduta estabelecida.
Fortalece-se, criando distanciamento; os estímulos naturais ao sistema arrefecem o efeito.
Sem perder o controle, o sistema, ciente da mudança de comportamento, contra-ataca: agrega novos seres à redoma, tão díspares quanto excluídos.
Logo um novo microcosmo social se forma, ao espelho do lado de fora.
Para seus integrantes, o sistema passa a ser segundo plano – a disputa pelo poder é o centro.
Estranham-se.
Apartam.
Confrontam-se.
Ao mais forte, a liderança; aos fracos, a subserviência.
Organizam-se da forma que lhes é possível, tendo como objetivo a quebra do sistema que lhes rodeia; este, por seu turno, apesar de padecer da arrogância do poder e parecer disperso, já identificou a nova ordem – espera a doença para surgir com o remédio.
Os seres da redoma, indiferentes ao fatídico papel que desempenham, seguem a estratégia esperada:
Agrupam-se.
Organizam-se.
Rebelam-se.
Ao caos instalado no ambiente fechado, o caos externo se mobiliza: identifica a fragilidade do sistema, e por isso lhe atribui a pecha do esgotamento; ao mesmo tempo, defende medidas extremas pelo restabelecimento da ordem.
Esmagados, um a um, pela sanha punitiva do caos, os seres desaparecem de vista, por ação do sistema – à doença, o remédio.
Em volta da redoma, o caos.
Mantendo o caos, o sistema.


Foto: Redoma, de Pedro Galdino

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