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quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Ventanas (I)


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O Vento


Fiz uma Ventania tão forte, mas tão forte, que deslocou a linha do Equador; e nos varais, que outrora invejavam a condição e relevância daquela privilegiada linha, dançavam as roupas uma lambada fervorosa, destas que levantam saias e lençóis; e nos tecidos, linhas pilotavam agulhas num bordar frenético até que lhes findou o impulso: chegaram os ventos ao seu destino, e estacionaram.

(Meus caprichos são sempre assim: sem gravidade).

Tento fazer graça nessas coincidências (eu tenho das minhas ironias): estavam renovando as tintas do mundo, inclusive da linha equatorial, justamente quando do referido acontecimento. Foi um capricho meu, sobre o qual não deixei pistas, que se escrevesse jazeria na estante de ficção (também os homens têm das suas ironias).

Neste tempo, o vento corria tanto que não podíamos ver seus pés e, atrás dele, fazendo festa (como as latas que cismam em acompanhar aos tropeços os carros de recém-casados), a poeira levantava e brincava de ser névoa, névoa vermelha, que depois cai feito neve para povoar a terra e voa, esvoaça, como um grande vestido que se dissolve em panos, em linhas, em pontos... em letras.

As tintas equatoriais bailaram, colorindo o ar, até que a música cessasse: pairaram, então, sonolentas, onde lhes aprouve, como se, depois do canto da Ventania, decantassem: e dormiram como dormem as linhas imaginárias. Então o mundo se desordenou: povoou-se de pontos de vista perdidos de linhas de pensamento, de pontos sem nós; minha pena, talvez por isso, escreveu uma história em linhas tortas, começando em fim:

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