Às mães que são mães,
não meras estatísticas.
Vitória tinha os seios fartos, mas depois dos dezesseis os escondia em
camisetas sem decote devido às estrias.
Ela gostava de se olhar no espelho, aproveitar as peças novas que comprava
nas lojas populares.
Mas Vitória não gostava de seu corpo. Suas coxas eram desproporcionais,
dizia ela – bunda demais.
Nada nela era equilibrado. Harmonioso. Isso resultou, talvez, em seu
temperamento.
Quando explodia, ficava sozinha na sala de tevê.
Seus lábios eram grossos, mas não fazia uso deles, pois se considerava
estragada. Estava velha, era pobre e não tinha uma pinta sobre os lábios como a
Marilyn.
Algumas vezes, saía à noite para procurar um homem.
Se vestia comportadamente, mas desejando peças fáceis de tirar.
Raramente encontrava um par. Alguns homens investiam; seus olhos atraíam
interessados, mas ela se esquivava.
Essa ambiguidade de sentimentos foi a causadora de seu único pecado.
Amou durante nove meses o ser que se desenvolvia dentro de si.
Quando viu o menino fora dela não o reconheceu. Não era mais mãe. Apenas
um saco vazio com leite pingando e manchando o sutiã, mas sem a beleza da
juventude.
Quem ele chamava com aquele choro todo?
Ele só queria pedir um último beijo.
Este conto integra o livro Sísifo Desatento, que será publicado em maio
deste ano, pela editora Terracota.
2 comentários:
Tristemente realista. Gostei porque ocorre muitas vezes com mães dessa idade. Parabéns.
Tão triste! "Quem ele chamava com aquele choro todo?" É verdade, tem mães que são meras estatísticas. Muito perspicaz, muito bonito dentro da realidade que mostra.
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