Mulher refletida na chaleira - autorretrato, por Ju Blasina |
não precisa ser
nada além de
linda,
e ser linda é ser magra
mas não muito
limpa,
e ser limpa é ser de boa
estirpe
e ser boa é ser mais
que limpa:
é ser calma, mansa, honesta
generosa
desde que não dê
com facilidade
aquilo que é mais seu
comedida e ser-
vil, sem descanso
ou pausa
entre sílabas.
a jovem tem que ser linda
a velha, boa
a jovem, se não é linda, tem que ser
muito, muito boa!
a velha, não tem escapatória
a não ser que se valha
de um velho
retrato
no caso de ter sido
miss.
na meia idade, toda mulher
tem que ser muito
boa: amante
vizinha
empregada
cozinheira
nora
parideira
mãe
e aí dela que não queira
um homem
pra si
a mulher de meia
idade precisa
tanto de um bom marido!
e de um bom emprego
para as suas coisinhas
-inhas! precisa também de um
diminutivo: tadinha!
uma mulher só não precisa
de muito
mais que isso.
é o que dizem.
pensando bem
uma mulher não precisa nem pensar
em ser coisa
alguma
mas é bom que leia
e que goste
e que conte
e que jamais se encontre
neste poema.
3 comentários:
Enquanto toda mulher... um cartaz, por gentileza: "TÔ intendendu é nada!"
Talvez porque eu seja homem.
Ou talvez porque toda mulher possa ser a porra que quiser, em nenueu
porra nenhuma
nas densas e tenebrosas
nuvens.
Genial! Além da acidez irônica desse texto inteligente, seu jogo de palavras (que é de domínio de poucos/poucas) é um show à parte.
Isto me lembra Orgulho e Preconceito, de Jane Austen: se não é prendada não vale nada, se vale algo é porque tem dinheiro ou beleza, senão é uma pessoa muito dada. Se é que me entendes.
Excelente poema Ju.
Abraço.
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