Receba Samizdat em seu e-mail

Delivered by FeedBurner

sábado, 1 de junho de 2013

Rasgo

tenho rasurado insuficiências. negligência sanguínea. estupefato ao meditar. adoecido em sigilo. camuflando a carniçaria. quase nunca perene. tísico rastejo. alucino arranhar certezas. permito-me desgraças para estancar. é o estranho mundo dos céus. é a prerrogativa que manipula minhas orações. ribanceiras para acariciar. consulente do cansaço. as cinzas dos sorrisos perdidos entopem minhas vias. arco com a indiferença das escolhas. tampouco me importo com o depois. estou buscando o deleite de quem esquarteja. legítima instabilidade do querer. amo feito um filho da puta que escarra sublimações. banho-me no charco dos carinhos negados. penitência das poucas palavras. um sonho obstruído em cada carência. minha fortaleza desmancha-se pelo rosto. trepido a reação desconcertada. enxugo-me como se fosse matar a fome. minha inconsequência se torna epidemia. o rasgo que alimenta a carcaça. contemplo o escândalo da danação. gemo nos moldes do grito. mobiliado pela escotofobia. meu vício é drenado pela fuga. uma alegria tenta me descansar em placidez. escorraço em fúria o cerúleo afeto que me cai sobre os ombros. sobrevivo asquerosamente. respiro a necrobiose que empesteia minha língua. tantas palavras adjuntas suplicando pelo declive. resta-me o covil da poética. tateio os rastros procurando me aquecer. amiúde olhar desencontrando perdições. mascaro-me conveniência introspectiva para suportar a falta. teço-me como um semideus que se recusa. desmembro-me na quietude do abandono. remoo éter. lavro mágoas para achar a solução da incapacidade. esmiuçado ígneo desatando ira. semeando-me desertos. rego-me enxuto alvoroço. falta-me o abrasivo adubo. broto epiléptico caos. raquítica vida que se esparrama pela penumbra. espreito o umbral aspirando amortalhar os sentidos. a tragédia em mim prospera. química que me consagra apenas mais um morfético. esgoelo abutres na solidão do berço. o meu esporro não chega aos pés da plenitude. pasmo em asco com os cacos do descaso. me trato quebrado. retorcido. sedento pelas verdades que roem o breu. o meu evangelho é escrito aos tropeços dos excessos. a cólera é enlanguescida no altruísmo prolixo da minha natureza. envergonho os meus ancestrais transladando todas as espécies no caixote torácico. não suporto enfisemas. carrego o desengano na síndrome do não mais. o silêncio é o purgatório do desamparo. desmentindo a verdade que me arde com a loucura que me cabe. minha descrição é uma sombra para a constante permanência do amanhecer.  sangue semiárido percorre-me na catástrofe quando reluto contra a insubstancialidade. indícios da danação pintam meu semblante com a falta do que sentir. esqueço-me a sós. adornam-me as poucas coisas necessárias para ousar. uivos e desesperança. gorjeiam-me os corvos na hipótese do nada. poderia amputar as mãos. calar o escândalo. apenas uma variante do insustentável chumbo de não ser. a inevitável tradição da morte dança sobre os meus calos. acomodo o corpo e a quinquilharia do que restou. epífitas reluzentes de humildade despencam pelos pântanos. não tento fingir que estou comovido com os tormentos avolumados. o desassossego é permanente. deficiências no esconderijo em que prossigo. busco em diferentes realidades um mundo que se choca com o sopro da pólvora. falta-me alma para ser homem. o passado deteriora a possibilidade da cura. então revolto-me calado em tempos surdos. confinado como Cristo numa espécie de substrato. um endiabrado que abdicou a própria eternidade. coso fiapos tentando encontrar a origem. o meu passeio é grafar horrores por toda a escuridão cósmica.

[Santiago Caruso - a poète maudit]

Share


Bruno Bossolan
Nasci em 25 de junho de 1988 e resido em Capivari, interior de SP. Sou Cronista e Redator do Jornal O Semanário. [www.osemanario.com.br] Autor dos Livros: N(ó)stálgico (Poesias, 2011 - Paco Editorial) - Barbáriderna (Poesias, 2012 - Editora Penalux), com participação também em mais de 10 antologias poéticas. Autor da Peça Teatral “Destroços do Martírio” (apresentada no Mapa Cultural de SP na cidade de Porto Feliz – 2008/2009).
todo dia 01


0 comentários:

Postar um comentário