Joy Hester - Little girl with book on head - 1957 |
A poesia é um buraco
que muda de lugar
todo dia
no meio do caminho
do poeta
é preciso andar
com um bocado de
equilíbrio
[feito se faz
quando criança
com um livro
deitado
sobre a cabeça]
e muito
muito jogo
de cintura
para não meter-se nela
-e nunca
nunca mais querer sair
mesmo em dias de chuva
a poesia é um buraco
sem fundo.
a poesia é um ponto
de partida
que muda de lugar
no meio do peito
do poeta
quem houver de tocá-lo
levianamente
com as pontas
dos dedos
há de saber que
é lá que a vida
se esconde e vibra
de verdade
no corpo do poeta.
o resto é papel
timbrado
ruído
rasgado
empilhado
vencido
e do monte de papel
que a vida nos joga
por cima, só esse
vale a lida!
a poesia é uma voz a gemer
todo
todo o dia
ainda que não se queira ouvir
ainda
que não se possa fazer algo
a respeito.
a poesia é um fardo
a pesar sobre a cabeça
do pobre poeta
[feito se faz
quando criança
com um livro
deitado
sobre a cabeça]
ou ele a carrega
ou se deixa esmagar
ilusão é pensar
que há alternativa.
a poesia é uma janela
que se abre para o lado
de dentro
de um poeta.
o inverso. o avesso
fora, o mundo
dentro, um fundo
de verdade:
há um coração
a bater
em cada poeta
e a poesia
é o nó
que lhe acorda
a poesia é um nó
enquanto a vida,
é a corda.
e é preciso de um bocado
metros e metros
dela
para que o poeta não se enforque
de vez.
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