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sábado, 19 de outubro de 2024

Encontro

 



Encontrei-me com Felipe no último sábado. Faz tempo que não nos víamos. Ele, cedo, passou num concurso e foi morar em outro Estado – se não me engano, no Paraná. Daí em diante, foi minha oportunidade de morar no exterior, por pelo menos quatro anos. Na última vez em que nos encontramos ele estava na pracinha, perto da minha casa, fazendo exercício. Isso foi, talvez, em 2018. O encontro no sábado foi inusitado e cheio de emoção. Ele estava mais magro do que o normal. Ele sempre foi magro, mas dessa vez estava mais, com o rosto chupado, um pouco de olheiras e vários cabelos brancos, inclusive na barba. Decerto eu não o reconheceria se ele não tivesse vindo falar comigo. No ato, ele esboçou uma reação de grande alegria, e eu lhe correspondi. Crescemos juntos, no mesmo prédio, onde tínhamos uma banda que tocava rock pesado e depois migrou para o rock pop. Ele era o tecladista e eu, o baterista. Mas nossa missão de amizade vai além daquele tempo, das nossas atividades juvenis. Creio que encontramos pessoas ao longo da vida para um propósito, o de ser feliz, e essas que nos fazem bem devem ficar. Felipe é alguém que quero levar para o resto da vida. Um cara do bem, amigo e brincalhão. Mas me preocupou bastante o seu estado de saúde. Não consegui decifrar o que lhe passava. Logo que comecei a conversar perguntei como estava, e ele me respondeu que “bem”, meio vacilante. Não seria a hora de me revelar o seu estado? Não estaria eu autorizado a entrar na sua intimidade, que só caberia à família? A sua esposa estava ao lado e era só sorrisos. Ela sabia que o encontro nos faria bem, então deixou que fluísse o que tinha de ser, os nossos papos, as nossas brincadeiras infantis. Ele não parava de me chamar pelo meu apelido de adolescência – o qual não vou revelar aqui, para manter a minha integridade –, para nos tornarmos mais próximos, mais amigos. O tempo não fez com que perdêssemos o lanço da fraternidade, da boa amizade, verdadeira. Mas eu estava ligeiramente tenso, aflito com a sua saúde. Ele parecia fraco, abatido. Teria tido um dia horrível? Estaria exausto do trabalho? Parecia estar de férias com a esposa. Quando me deu a mão, para nos cumprimentarmos, senti pouca firmeza, uma certa displicência, que não combinava com o seu olhar, radiante. O olhar era a nossa fonte primal de energia. Eu sentia que as minhas forças se conectavam às dele pelo nosso contato visual. Era aí que morava o exato amor. Sim, o amor de irmão, o amor puro, que transborda a alegria de estar vivo, ali. No entanto, eu também estou doente, com depressão. Tentei, ao máximo, camuflar o meu estado de lassidão, eu precisava mostrar-lhe que o encontro era, sim, importantíssimo para mim, e que eu precisava vê-lo. Despedimo-nos com um afetuoso abraço. Ele disse, por fim, que estava morando em definitivo em Fortaleza, e eu abri um sorriso de gratidão; era tudo o que precisava ouvir. Precisamos estar juntos, foi esse o nosso trato tácito no aperto de mão. Nossas almas, assim creio, permanecerão em paz.

 

 

  


 






quinta-feira, 17 de outubro de 2024

A chave que abre o passado

 



                    



                        Não vou devolver a chave da casa de minha avó. Essa antiga chave, que está junto da minha, (mesmo eu não o tendo vivido, nem me familiarizado com os parentes já desaparecidos), abre o meu passado...









quinta-feira, 3 de outubro de 2024

A LUMINOSIDADE ATRAVÉS DA JANELA


Faz alguns anos

que eu estou

do lado de fora

observando o

movimento.

 

Do ponto de

onde eu estou

vejo a luminosidade

de uma janela

no 2º pavimento.

 

Todos os dias

de um ponto neutro

de observação

eu vejo o que seria

a rotina da família.

 

Percebo os vultos

que se locomovem

dentro da casa

numa harmonia

pressentida.


Tarde da noite

alguém chega

até a janela

e fecha as cortinas

de persianas.

 

Minutos depois

a lâmpada foi

apagada dentro

do casulo de seda

visto pelo lado de fora.

 

Faz alguns anos

que eu estou

observando

a luminosidade

do ângulo externo.

 

E quando eu subo

as escadas encontro

a porta fechada.