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terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Cebola - poema de Karina Maia




CEBOLA





Cebola, hoje cortei.

As cebolas nascem debaixo da terra

Assim nascem os mortos

Eu nasci morta, logo sou uma cebola

Sou ácida e se você me cortar eu

solto um gás que dói nos seus olhos

Mas deixe-me de molho e ficarei doce. 

Como todos os que nascem mortos e vivem

Eu tive que aprender a gostar da vida

E não é fácil, amar viver e buscar sentido e

As razões de abrir os olhos todas as manhãs

Colocar um pé na frente do outro pé

Chutar a pedra, abrir a porta, tirar o pó

A morte é inerte e mais sedutora e íntima

A vida exige de você provas de amor e afeto o tempo inteiro, e como a vida é sua tudo é tudo pra si 

mesmo, ora a morte só quer você deitado

Descansado, desligado, legitimamente amorfo

O sinal de desamor pela vida é bem discreto, você vai surfar buscando uma boa onda que te ame, 

vai naufragar em lágrimas

E quando você rir o riso será de desespero, porque alegria é uma invenção boa que todo mundo sabe

que o é, mas não sabe onde fica. Quer um conselho? Quando cortar uma cebola proteja os olhos.

Mas não estou falando de nada além daquilo que guardo nas entrecamadas do meu self bolha.

Parti. Fiquei só metade, apartada da outra eu, onde ela foi?

Só, fiquei exalando meu cheiro, e qualquer coisa que estivesse ao meu alcance foi inundado de mim.

Camadas.











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Rafael F. Carvalho
Autor do livro A Estante Deslocada, é paulistano, nascido em 27 de Fevereiro de 1978. Foi publicado em antologias de novos escritores e em jornais universitários, e é formado em Letras pela Universidade de São Paulo.


todo dia 17


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