O sujeito tinha muito orgulho do nome, enchia a boca cada vez que lhe indagavam, mesmo que para uma simples anotação no caderno de fiado da padaria da esquina. Cultivava este sentimento desde a infância quando observava as assinaturas nas cédulas. Quem sabe um dia fosse tão importante quanto um Ministro da Fazenda ou se não, ao menos Presidente do Banco Central.
Para as primeiras
assinaturas, gastou folhas e folhas de papel, horas e horas rabiscando até
chegar ao traço perfeito, a chancela que representava toda a dignidade de seu
nome. Depois de tanto praticar, acreditava que a sua assinatura possuía traços
únicos, garantia de exclusividade.
Tudo que usava era
personalizado, o que incluía roupas, acessórios, a mobília que usava em casa ou
no escritório. Fez aulas de pintura e de desenho para poder aplicar a
assinatura em suas obras. Fez dela também a sua logomarca.
Com o passar do tempo,
o Senhor Afonso Carlos de Mendonça passou a ocupar funções de destaque na
empresa, chegando à Presidência. Sentia o maior prazer em esvaziar tubos e
tubos de canetas esferográficas nas infinitas páginas de documentos que
assinava.
Na empresa foram
incontáveis os contínuos e estagiários que passaram pela sua frente. Nunca
prestou atenção a nenhum deles. Certo dia, foi diferente. Um menino, que atuava
como menor aprendiz, levou-lhe, como de costume, uma pilha de documentos para
assinatura. Afonso examinou cada um e depois de passar por todos, começou sua
sessão de assinaturas.
Testou a caneta, arrumou
os objetos sobre a mesa para um melhor posicionamento dos papéis. Já ia assinar
o primeiro documento, quando lembrou que não havia conferido o padrão da
assinatura. Puxou uma folha de uma das gavetas. O papel já possuía algumas
assinaturas, apôs uma nova logo abaixo da última, comparou com o gabarito e
sorriu. Respirou fundo e cuidadosamente fez cada uma das assinaturas nos
documentos. Tudo com muita calma e esmero.
Percebeu que o menino segurava
um dos documentos e olhava com atenção os traços da marca. Curioso, resolveu questionar
o menino.
− Gosta de assinaturas?
− Sim, as observo
sempre.
− Tem uma?
− Todos têm, desde que aprendem a escrever,
senhor. – disse, educadamente, o menino.
− Falo de uma marca
pessoal, algo elaborado, como a minha, por exemplo.
− Não senhor, assino
meu nome por extenso. Acredito que um dia uma nova assinatura surja espontaneamente.
− Pois eu elaborei a
minha com muito cuidado. É o que nos diferencia, sabe?
− Sei.
− Mas se não acha uma
assinatura elaborada importante, por que observa tanto a minha?
− Fiquei curioso.
− Com os traços? Com a
inclinação? Com a pressão exercida sobre o papel? Ou seria com velocidade que é
escrita?
− Não. Estranhei o fato
de alguém escolher uma única palavra como assinatura. É um apelido?
− Como assim, um
apelido? É uma representação de Afonso Carlos de Mendonça!
− Me desculpe, senhor. Para
mim, está escrito: A-men-doim, apontando as partes da assinatura com o dedo
Afonso olhou para a
folha de papel, sua face se tornou branca, quase transparente. Olhou novamente
para o documento, depois para as assinaturas dos quadros de própria autoria
espalhados pela grande sala, para o bordado no lenço do bolso do paletó, para a
gravação em baixo relevo nos vidros do prédio, tudo, tudo grafado com o maldito
A-men-doim. A terrível palavra reproduzida pelo menino, ecoava em seus
pensamentos e o atordoava.
A palidez no rosto deu
lugar ao rubor, veio a dor no peito e depois a escuridão. Não resistiu.
Afonso era intolerante a
amendoim. Como ninguém sabia disso, estamparam a assinatura dele em sua lápide,
logo abaixo da transcrição de uma de suas falas preferidas: “Todo homem precisa
deixar sua marca, será a sua identidade e o seu passaporte para a eternidade!”.
1 comentários:
Boa
Postar um comentário