Não tenho que estar aqui
ou em qualquer parte.
Não tenho porque sentir
desta ou de outra forma
aquilo que não sinto em mim.
Nada justifica ou nega
a minha existência,
mas reforça a tese
da inércia como norma.
Mas se estou inerte
a minha inércia é uma postura.
É um estar aqui.
O que sou é este vazio em mim.
Este ímpeto não direcionado
a pulsar num imenso vácuo.
Um deserto interior a buscar água
num deserto exterior projetado.
Sou esta ânsia e esta calma.
Sou uma coisa e outra e não sou nada.
Sei que existo e saber isso não me ajuda
(a consciência que tenho de estar
acordado
é a certeza que tenho de não estar
dormindo).
Sei que posso mudar alguma coisa,
uma vez que tenho espaço físico
para agir como se fosse livre.
Mas nada do que eu fizesse teria significado.
Seria um trocar de camisa
depois de um suposto banho.
Seria como atravessar a rua
trazendo a outra margem dela até mim.
Serei sempre eu mesmo e na pior
circunstância
de nada ter mudado em essência.
Sou isto:
Um porão vazio
abarrotado de quinquilharias.
Milton Rezende, in Areia (À Fragmentação da Pedra)
2 comentários:
Muito bonito, acho que entendo essa sensação de ser e não ser nada
obrigado Christian William.
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