Puerpério - Poema de Matheus Bibiano Branco






Puerpério





O rádio de pilha tocava a sépia,
Minha mãe mineira e crespa,
Como a cinza do cigarro,
A tomar uma cerveja de seiscentos,
De duas que comprei no boteco
Quando ainda vendiam às crianças.
As roupas no varal desprezavam o cheiro do mato
Enquanto o cão mijava na ciência de espera
Feita pelo gado com massa e argila nas bocas.


Pensava de morrer, pensava primeiro
De não deixar a mãe baleada de espinhos
- por isso a cerveja, a vela pro santo,
O limão-cravo, os cacos de vidro no muro.
Minha mãe com olhos de luneta pro quintal:
Sabia dela e do copo americano com engano dentro.
Mas até hoje mal compreendi, também não quero
Saber o porquê daquele sol sempre enforcado.



Do livro Entre o beiral e o abismo, Editora Patuá




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