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terça-feira, 17 de setembro de 2019

Quando eu for cachorro - poema de Maria Amélia Dalvi

Quando eu for cachorro




Quando eu for cachorro
vou dormir com meu corpo
entre suas pernas.
Cabeça, tronco, orelhas
encaixados nas suas curvas
— cada breve respiração muda
como se fosse eterna.

Porei todo o meu medo à prova
quando você trancar a porta
saindo de casa, o olhar incerto.
Eu me entreterei com brinquedos:
comida, cochilos, bocejos, coceira
— farei com que acredite:
maior desejo é que você regresse
(mesmo se for mentira).

Entenderei sem ficar magoada
as interrupções de nossas conversas;
esperarei sem me exasperar
(curtindo sua dedicação
eternamente furtiva):
fecharmos uma pauta completa.

Roerei um pouco, de leve,
suas coisas favoritas —
que é pra eu apor minhas marcas em tudo,
lembrando que o amor,
mesmo denso, é breve.

Havendo dias de chuva
tremerei de preguiça
com você entre cobertas;
pedirei que não levante,
esteja sempre à mão, à vista:
e apenas me ame.

Trarei meus trágicos
olhos de compreensão
à maneira de uma oferta,
nas vezes em que você estiver
às raias do desespero;
então morderei seu braço
com impiedoso carinho
e direi, em silêncio,
que prefiro o mundo
com você bem perto.

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Rafael F. Carvalho
Autor do livro A Estante Deslocada, é paulistano, nascido em 27 de Fevereiro de 1978. Foi publicado em antologias de novos escritores e em jornais universitários, e é formado em Letras pela Universidade de São Paulo.


todo dia 17


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