Foi pelo sangue de Cristo. Pelo sangue de Cristo que o sangue dela escorreu. Eles disseram. Em nome do Senhor Jesus! Eles gritaram. Antes de entrar. E ela achou bonito. E respondeu Aruê! Mas eles não ouviram. Eles não queriam ouvir. Mugindo em rebanho de fúria. E falavam numa língua estranha que não vinha do Espírito. Sobre demônios e abominações. Mas Legião eram eles. E repetiam e repetiam e repetiam. Está amarrado em nome de Jesus! A cada altar quebrado. A cada estátua estilhaçada. A cada flor pisada. A cada soco e pontapé que deram na menina mais linda do terreiro. A filha mais querida de Ogum. Mas foi em nome de Jesus. Cada rasgão no seu vestido branco novo. O vestido que a madrinha fez pra ela. Branco como o ojá arrancado da sua cabeça. Em nome de Jesus. As contas arrebentadas da guia azul e branca de Ogum explodindo no chão do terreiro. As pulseiras rapinadas por garras de harpias. Em nome de Jesus. Em nome de Jesus, a cabeça do babalorixá rachada contra a parede. Vermelhos. A parede. A cabeça. O vestido. E os gritos pingando. Encharcados de Jesus. Submissão. Dominação.
Foi assim que eles chegaram. Porrada e benção. Belzebus procurando por si mesmos em estátuas e flores e altares. Arrastando pelos cabelos fartos a menina do vestido branco-encarnado. Pela rua. Pelas calçadas de cuspes. Pela Via Dolorosa dos olhares estáticos.
A menina mais amada de Ogum. Sangue e vergonha. Sacrifício cruento. Amarrada em nome de Jesus. Do Jesus que quebra e arrebenta. Imagem e semelhança dos homens.
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