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quinta-feira, 15 de junho de 2017

nunca soube...




Menina loura. 
Menina doce e meiga.
Esse teu estar de porcelana e mel ter-se-á formado, decerto, conforme foste descobrindo. Que tu terás descoberto que havia um negro ainda mais negro do que aquele que já conhecias, e terás sentido necessidade de compor esse sorriso: várias horas por dia, um dia atrás do outro dia, um minuto depois de outro minuto. 
Tu disfarçando, e que Deus te perdoasse.
E nem papel de embrulho nem lâmpadas de filamento embrulhadas em simpatia, um sorriso atando como se fosse guita, nem uma braçada de fio de cobre isolado: apenas o sorriso que terás aprendido a colocar como colocarias o naperão para disfarçar o risco ou para que se abafassem sons de loiça, tu que terás um dia descoberto que havia gritos ainda mais imensos do que os que ouviras pelas noites: tu, menina, de cabeça escondida no travesseiro.
Terá sido desse modo paulatino e terá sido pela vida inteira.
E eu que nem te conheci senão o mel e os afagos, eu que de ti mal vislumbrei o desencanto no fundo dos olhos, já tu te despedias e eu sem dar por isso: um desencanto que vinha lá do âmago de ti mesma e no qual nunca tinhas sequer querido acreditar, tu que eras temente a um Deus de infinita Bondade;
eu que perpassei por ti como se nem fossemos carne de igual carne, sangue que escorria, um e o mesmo, tal e qual, fosse por picar o dedo em bico de agulha enfiada em linha ou em bico de piteira, ou fosse, a cada ciclo, o sangue de mulher;
eu que nunca soube dizer-te
nunca soube desvelar-me de cuidados.
Eu a abrir gavetas e arcas e armários, encontrei de ti apenas silêncios.
Alguns estavam já esmigalhados, sobretudo nalgum esconso;
outros eram enormes, intensos, brilhantes e compactos;
macios, no entanto;
eram os que surgiam das letras que, folha a folha, desenhaste, e os que ficaram naquela mala velha que gostavas de trazer a tiracolo.

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