Um dia faremos silêncio. Seremos pausa. Como as coisas gêmeas colocadas sobre as mesas de centro, sobre as estantes altas em salas nobres e intocadas. Pares perfeitos, banhados pelo sol que escapa pela fresta da persiana elegante. Seremos, para sempre, mudos, inertes. Parelhos e empoeirados como as matrioskas, os elefantes, os macacos, os candelabros de prata. Teremos esquecido como é amar, esse praticar de infinitos em pequenos gestos. E não saberemos dizer qual foi o instante em que cessaram riso, abraço, murmúrio. Ou o toque das nossas mãos entre as cobertas felpudas, ou os códigos trocados por nossos olhos treinados em acender vontades. Teremos rasgado cartas e escondido fotos amarelecidas no fundo das gavetas de uma cômoda velha e derramado na pia os nossos vidros de perfume prediletos e empurrado goela abaixo a cumplicidade de uma vodca gelada. Seremos choro e choro. O que escorre sem controle. O que molha só a alma.
Um dia seremos tudo isso.
7 comentários:
simples e intenso
é mestria saber unir estas duas qualidades num texto e dizer tanto em poucas palavras
Li como se ouve uma melodia triste. Construções belíssimas. Parabéns, Cínthia!
Maria e Cecilia, obrigada mesmo!
Essas suas sutilezas, carregadas de significância e significação, sempre me dizem a coisa certa! É sempre um prazer ler você, minha amiga!
Obrigada, Emerson! Bjs
"Teremos esquecido como é amar, esse praticar de infinitos em pequenos gestos. E não saberemos dizer qual foi o instante em que cessaram [...]os códigos trocados por nossos olhos treinados em acender vontades": FANTÁSTICO!
Obrigada pela leitura e pelo comentário, Ozenir!
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