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sexta-feira, 15 de abril de 2016

neste 9 de Abril


avós

Podemos chamá-los pelos nomes. Chamar cada um pelo seu nome de baptismo.
O nome com que as mães os chamavam: Vicente, Amadeu, Tomé, Viriato.
Dizer-lhes, mesmo, o apelido: Gomes, Pires, Sacramento, Baptista, Benevides.
Chamar cada um desses avós que não tivemos, e ouvir outros nomes em outros linguajares diversos, de outros, muitos, avós.
Outras línguas, outros beligerantes, todos sequiosos de Paz: a mesma Paz! sequiosos de Pão: o mesmo Pão! 
e da água que fosse água da fonte 
Todos saudosos do cão deixado longe, da namorada, do amigo, do primo, do irmão.
saudosos da voz da mãe pedindo: “cuida de ti menino”
Mães a limparem olhos de choros que nem lhes eram devidos.
Alumiar os nomes desses tantos feitos heróis: avós de cada um de nós que podiam ter sido. Chamar cada um deles e ouvir, do redondo da Terra, o clamar de milhares. 
Os nomes deles e os nomes de suas mães e namoradas e irmãs: Raquéis, Isabéis e Marianas. Milhões de avôs e avós que não nos foram, mortos noutros, tantos chãos, de outras tantas Flandres. 
Guerras. Batalhas. Escaramuças. 
tantas! muitas! demasiadas!
Frias ou escaldantes, todas elas esfomeadas e cruéis, em outras terras também elas férteis, também elas mais prezadas para os sulcos da charrua do que para o sulco absurdo da trincheira, da cova abjecta esguichando sangues e vidas na cratera deixada pelo míssil, pela bomba, pela granada.
Dias e dias de nojo são os dias depois de la Lys e seus heróis, e também de muitos outros dias antes desses dias. Lutos que traçamos uns nos outros a chorar os avós que não nos deram, meninos da gente a apontarem canos de espingarda num desespero de vida.
Heróis!
Guerras semelhando umas às outras, na língua de Camões ou na língua de Shakespeare ou, em qualquer que seja o dialecto, as mesmas mães escondendo choros e implorando: “cuida de ti, menino”.
Os mesmos mortos.Os mesmos avós que não nos foram.



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