Ela
sentiu o sêmen do rapaz escorrendo pela lateral de sua coxa. Teve
vontade de tudo: de chorar, de gritar para mandar parar o ônibus, de
descer do ônibus e se jogar na frente do primeiro carro que viesse
em seguida, de ligar para a polícia, de ligar para mãe, pro
namorado. Não foi o que ela fez. Não teve coragem para passar a mão
ou procurar qualquer coisa para limpar aquilo, uma única e gorda
gota que descia lentamente, viscosa, deixando um rastro em sua pele
como uma pequena lesma. Pensou em olhar para o sujeito, em encará-lo,
mas também não fez isso. Só conseguiu olhar para baixo, para o
assoalho cheio de areia do ônibus. Viu o all-star do rapaz, limpo,
talvez novo, ou recém-comprado. A calça jeans dele estava
limpíssima. Viu, de relance, fora do foco da visão, o pau. Foi tudo
muito rápido. Ficou com vergonha da mulher gorda, que estava diante
dela. O rapaz valeu-se do tamanho da outra mulher para encurralar a
moça naquele espaço do ônibus onde vão os cadeirantes, que sempre
é ocupado por passageiros em pé quando o carro está lotado. Estava
lotado, e ela ficou entre a estrutura de metal, a janela, a mulher
gorda e o rapaz que acabara de esporrar em sua coxa. Outra gota
estava na alça da sacola com as compras que ela fizera na feira.
Fora até o centro comprar uma abóbora-moranga e mais algumas
coisas, queria cozinhar para seu pai, que viria no sábado passar o
dia com ela. Ficou com receio que aquilo tivesse caído em seus
legumes, nas suas frutas. Ela, sem olhar, acompanhou o movimento do
rapaz guardando o pau dentro das calças. Prestou atenção à sua
respiração. Não conseguiu se mover, segurando as alças sacola com
as duas mãos, diante de si, inconscientemente protegendo o que ainda
era possível proteger. Sentiu o ar expirado pelas narinas dele na
altura do seu pescoço, dos seus ombros. Era um guri, talvez não
tivesse vinte anos. Talvez não tivesse namorada, ou tivesse
problemas mentais. Talvez tivesse um canivete, ou um revólver.
Talvez tivesse problemas com a mãe. Talvez não tivesse mãe,
pensou. Talvez tivesse AIDS. Talvez estivesse terrivelmente
endividado. Talvez fosse uma pessoa normal. Talvez pegar o ônibus
lotado, bolinar mulheres e gozar nelas fosse um hábito. O ônibus
estava chegando no final da avenida entrando na rótula da rua do
shopping. O rapaz deu sinal que ia parar. Ela não se mexeu até que
o cara estivesse de costas. Tinha um celular gigantesco, smartphone,
saltando para fora do bolso de trás da calça do sujeito. Ele
esquivou, virando para passar pela mulher gorda. Imaginou-se tirando
o celular do bolso dele e jogando-o na sacola de compras. Ele não
notaria. Descobriria quem ele era; acabaria com a vida dele. Mas
também não fez nada disso. Ele seguiu, invisível, o árduo caminho
entre as pessoas no corredor, para desembarcar em frente ao Shopping.
A gota de esperma desapareceu quando chegou ao cano da meia dela.
[conto de Joana de O.]
[imagem: http://www.panoramio.com/photo/79768905]
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