Especulação em torno da dor feminina
Acredito que a dor do ser mulher
não se resume à decantada dor do
parto,
nem ao vazio do abandono, na cela-quarto.
A dor de ser mulher não deve ser
somente a dor da despedida, os
tristes ais,
do lenço branco do amado a acenar
do cais.
A dor do ser mulher é ainda maior
que a da humilhação dos tapas no
rosto
por aquele que do escolhido ocupa
o posto.
A dor de ser mulher é mais que
triste,
nem se confunde com encanto de
sereia.
É angústia de mãe pelo rebento na
cadeia.
A dor do ser mulher vai muito
além
de sofrer pelo marido enfermo e
insone,
ou ainda ver a prole padecer de
fome.
A dor de ser mulher, de tão
intensa,
transcende mesmo o febril
desconforto
de arrumar o quarto de um filho
morto.
A dor do ser mulher, inevitável,
paralisa o corpo, desnorteia a
mente,
por sentir-se presa sabendo-se
inocente.
A dor de ser mulher, absoluta,
corrói, silenciosa – incurável
câncer –,
no diuturno esforço de fazer-se SER.
A dor do ser mulher é tudo isso
e muito mais: é cruel, atroz,
inominada.
É querer mudar tudo, e poder
quase nada.
A dor de ser mulher,
provavelmente,
é tão só o sintoma de um pesar
profundo:
ver o macho da espécie arruinar o
mundo.
Edelson Nagues
5 comentários:
Obrigada pelo inteiro que nos cabe de tantas verdades. Uma reflexão feminina, vinda do mundo masculino. É para poucos homens escrever algo assim. Só para os atentos e sensíveis. Muito bom!
É um "mea culpa" necessário, Cinthia. Obrigado pela leitura e pelo comentário. Abraço.
Você extrapolou nesse poema. Nem falo do talento e competência que sempre sobra em você, falo da sensibilidade, da compreensão, do conhecimento profundo da alma feminina, tudo contido nesses magníficos versos. Parabéns, amigo!
Mto obrigado, Cecilia. Vc é que acaba extrapolando em seus elogios. Mas eu te perdoo (rsss). Talvez essa compreensão da alma feminina venha do fato de eu ter nada menos do que sete irmãs. São mtas mulheres na vida de um só homem... (rsss).
Grande abraço.
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