Raro leitor,
“Um dia a gente chega, no outro
vai embora”, diz a letra da belíssima canção Tocando em frente. Em tudo na vida é assim: tem a hora do encontro,
tem a hora da despedida. Depois de vinte e três textos, chegou a hora de me
despedir. Faço-o a contragosto e tão-somente pela necessidade de me dedicar a
outros projetos. É hora de me despedir e, ao mesmo tempo, agradecer pela
acolhida nesses quase dois anos de colaboração. Quando cheguei por aqui, tinha nas mãos apenas minha arte e vida severina. Era 28.fev.2013. Mês seguinte, cuidei de espalhar uns
desperdícios apanhados no rio do cotidiano. Em seguida, porque era abril,
cuidei de homenagear Brasília, minha quase Pasárgada, meu sonho feliz de cidade
por quatorze anos. Maio foi a vez de homenagear o cronista, esse vira-letras de raça. Em junho, uns flagrantes da vida como ela não deveria ser. Colecionador
incansável de tudo que diga respeito à “vida se vivendo em nós e ao redor de
nós” (Clarice Lispector), em julho reparti com o raro leitor cinco contas de um colar; em cada conta, um acontecimento que fisgou minha atenção. Em agosto, mês
dos pais, resolvi encarar o mais difícil dos textos que já terei escrito.
Tratei de percorrer a margem móvel da vida e, nela, a história errante do meu
pai. Setembro, com a chegada da primavera, Brasília ficou em festa. No mês das crianças, atirei no papel umas belezas que passaram
pelos meus olhos de homenino.
Observador atento aos brilhos do chão, novembro foi a vez de repartir mais
belezas colhidas no miúdo chão do cotidiano. Fechei 2013 com umas mal traçadas linhas.
Para abrir 2014, o inventário
de uma procura – a procura da crônica. A seguir, julgando saber como se chega à
crônica, provei minha sabença com uma (des)receita de crônica. Em março, o
susto de testemunhar cronos alucinadamente veloz. Em abril, desanimado com a
pauta pouco apetitosa de assuntos, decidi: eu não vou escrever nada. Em maio,
reconciliado com o tempo, cuidei de mapear onde a lentidão tem vez. Junho foi o
mês da bola e o Brasil passou longe do show de bola que se esperava. Muito
antes pelo contrário. Julho foi a vez de homenagear aquele que vive de dar tratos
à bola, um eterno filho do desassossego, o escritor. Para acompanhar agosto,
sol a gosto. No colo de setembro, depositei umas lembranças de como cheguei à Filosofia – para não ficar. Para embalar outubro, o relato de uma pequena
viagem a minha terra. E para não sair do pequeno, em novembro me dediquei a
celebrar a pequena arte da felicidade. Fechei 2014 tecendo amanhãs.
E tecendo amanhãs, chegou o
hoje da minha despedida. Antes, quero dizer que no tecido de tantos ontens,
além dos textos para a Revista Samizdat, houve espaço para eu publicar um
livro. É este livro que eu gostaria de deixar de presente ao raro leitor, me
desculpando por oferecer um presente que é, literalmente, Quase Nada. Dizendo
melhor: na aparência, o livro é quase nada; na essência, é um pouco menos.
Clique na imagem abaixo e veja o raro leitor se não estou certo.
Quase no fim, não posso deixar de consignar o meu agradecimento ao Henry Alfred Bugalho, o editor, e a
todos os colaboradores da revista com quem, honrosamente, partilhei este
espaço. Muito obrigado!
Com um abraço já de saudade,
Tarlei Martins
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