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domingo, 12 de outubro de 2014

A Carne do Almoço


*por Lohan Lage Pignone

Me coma
Eu não sou mulher
Sou algo de se comer
Como aquele resto de carne
Congelado em sua geladeira.
Das flores, dizem que sou a trepadeira
Eu que nunca me dei ao luxo de ser rosa.

Vai, goza.
Goza na minha cara.
Quem sabe eu não vire um copo-de-leite?
Eu que nem sou mulher,
Dizem que mulher é bicho amoroso, sensível,
delicado...
Ah!
Eu dou mesmo é o rabo.
Isso me faz ser qualquer tipo de carne,
Menos uma mulher.
A cada dia, a cada esquina,
Ao menos posso ser o que eu quiser.

O que chamam de amor, eu digo que é sobrevivência.
Eu não faço amor, faço dinheiro.
Faço metade, um terço, é mais caro
o inteiro.
Carne de primeira eu sou,
Posso dizer que também sou de segunda,
terça, quarta...
Puta: é do que me chamam.
Não é um adjetivo, eu sei.
Essa sou eu, em substância,
carne e osso. Nem tanto osso assim.
Homem gosta é mesmo de carne,
Estou sempre pronta para servi-lo.
Nem dor eu sinto mais,
Quando um dente voraz rasga meu mamilo,
Quando a mão queima na minha cara desbotada.
Sei bem o que é isso...
Toda carne precisa ser amaciada.
Vai ver por isso me chamam de vaca,
Pobre bicho destinado ao abate.
Vai ver por isso me vejo tão abatida
Diante desse espelho.
Mas é só um espelho...
Nele arrumo meus cílios,
Pinto meus lábios.
Esse prato precisa ir à mesa.
Almoço sem carne não é almoço decente.
Me coma, sem demora,
Pois atrás... Atrás de mim,

Sempre tem gente.


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