Chegou
o filho. E com ele a mãe e a mulher que até então ela desconhecia. Sabia que
não experimentaria a maternidade da mesma forma que as amigas ou que as
mulheres sorridentes das revistas. As coisas com ela eram diferentes.
Não
se sentira angelical durante a gravidez e observara com certa repulsa as
expressões beatificadas das grávidas que acariciavam a barriga inchada com o
olhar distante, com a sensação de que, finalmente, floresceriam junto com a
cria.
Não
se sentira confortável com aquela simbiose. Na verdade, achava estranho gerar
alguém. Melhor se pusesse ovos. Teria deixado a chocadeira elétrica ligada e
tocado a vida para frente, como sempre fizera.
Nunca
fora esposa dedicada ou filha carinhosa. Era simplesmente alguém que cuidava de
si, que convivia com os outros, se divertia e se aborrecia com eles.
Desejara
o filho. Conscientemente. Num dado momento da vida, teve medo de não ter raízes,
medo de não experimentar o que todos diziam ser o amor verdadeiro, o amor incondicional.
Precisava disso: amar incondicionalmente.
Chegou
em casa com o filho nos braços e esperou que o botão do tal amor fosse
acionado. Nada aconteceu. Algo havia de errado. Deixara-se iludir. Pôs a
criança no berço e recostou-se no sofá. Ficou alguns momentos parada, a mente
vazia, sem saber o que fazer. Nada para pensar. Nada para planejar. Esperaria o
filho chorar e o alimentaria. Isso... Seria uma embalagem ambulante de leite.
Seguiram-se
os dias, seguiram-se as noites. Nada do tal amor. Sua vida estava virada de
ponta- cabeça. Não dormia, não parava, não pensava. Era o alimento, o colo, o
conforto do outro. Não havia troca, apenas doação.
Arrependeu-se.
Não queria mais brincar de casinha. Deu o filho para a mãe, ela não aceitou.
Olhou para o marido, deixaria os dois, iria embora. Não foi.
Os
meses foram passando. Voltou a trabalhar, pôs o filho na creche. Afastou-se.
E
no afastamento, foi voltando, se resgatando. E no afastamento, viu o amor
surgindo, lento e sorrateiro como se com medo de grande exposição.
Amores Vários
1 comentários:
Eu conheço uma história assim. Na vida real. Tão triste e tão bonita. A desmitificação de que as mulheres nascem prontas ao amor de mãe. E eu me pergunto se essas que aprendem na vida, e não antes, por instinto ou ensinamento, se essas não se tornam, talvez, melhores mães. Ou tão boas quanto. Conto intenso, lírico e muito bonito.
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