Um livrinho precioso e que interessará a todos os bibliófilos foi escrito em 1344 pelo reverendo Richard de Bury, chanceler de Eduardo III da Inglaterra. A Ateliê Editorial publicou por estas bandas pouco chegadas ao negócio, em 2004, com tradução de Marcello Rollemberg. Dele se dizia que possuía mais livros que todos os bispos da Inglaterra juntos. Seu livro sobre o amor pelos livros é considerado, também, o primeiro manual de organização de uma biblioteca.
De Bury sabia, no século XIV, aquilo que hoje temos como mantra:
(...) chegaremos à conclusão muito agradável a nós, mas que poucas pessoas aceitarão, de que, a menos que temamos ser enrolados pelo livreiro ou tenhamos a quase certeza que uma ocasião mais propícia irá se apresentar, não devemos medir sacrifícios para comprar um livro se a conjuntura que nos é oferecida for favorável.
Bom, ele também dizia que não gastava um centavo com livros de direito... Por instinto de sobrevivência, tenho que discordar desta posição tão radical. Mas ele já nos alertava para uma praga igualmente medieval, e que ainda hoje nos assombra:
De fato, existe um público estudantil, geralmente mal-educado e que, por não se sentirem submetidos aos regulamentos de seus superiores, chega mesmo a se orgulhar de sua estúpida ignorância. Trabalham com insolência, se pavoneiam orgulhosamente, e ainda que careçam totalmente de experiência, opinam sobre todos os tipos de assunto com uma segurança inaudita. Pode acontecer de vermos um jovem insensato perdendo seu tempo fingindo que estuda, e é possível que, mesmo tiritando de frio e com o nariz escorrendo, ele não se digne a limpá-lo com um lenço para impedir que o livro que está logo abaixo de seu nariz fique manchado. Quisera Deus que, em lugar do manuscrito, estivesse ali uma colmeia com abelhas furiosas!
O bispo andava azedo: há pelo menos 650 anos achamos que a juventude é decadente e desinteressada. Philobiblon precede Guttenberg em quase um século, o que o torna ainda mais interessante e fundamental - uma perda ou um dano ocasionado ao livo poderia apagá-lo para sempre do mundo conhecido. Lembei-me dele ontem pela manhã, quando recebi um email da Amazon me "indicando" os livros que quero ler. Não sei o que o bispo de Durham acharia disso - provavelmente, que se tratava de uma bruxaria. Talvez resolvesse jogar ao fogo todas as obras indicadas.
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