Encantadas
Palavrasnão se tolhem
não se castram
não desgraçam
Saem até mais prenhes
dos terremotos
dos latrocínios
dos tsunamis
do meu silêncio
Fórceps
Nem que de cesáreapré-eclampse
à força bruta
meu poema tem de nascer
Naturalmente
só o canto do pássaro
e o choro da árvore
carpinejar
Naturalmente
só o cheiro do sol
e os férteis barros
do manoel
Lamento
Nem a estéril inveja tanto a parideiraNem o cunhado deseja tanto a irmã mais bela
Nem o mel açucara tanto no auge inverno
Nem a mãe se esgota tanto ao sugar-lhe o filho
Nem o sol castiga tanto o boia-fria
Nem a virgem despeita tanto a noiva
Quanto eu lamento
não ter gestado o mais anônimo
verso de Drummond
Intransitiva
Tomei cisma dos transitivossanguessugas
preguiçosos
Vivam apenas os verbos grávidos
que carregam em si
a completude
ou o desejo dela
A vida assim está
plena, fértil:
O independente
nasceu
caminhou
pariu
desmaiou
morreu
Simples assim,
como a ressurreição
acontece
Dúvida
Luto no leitoO parceiro ao lado me rejeita
O livro fechado na estante
sente o mesmo?
Recursos humanos
Leite potável não tenhopra abastecer o mundo
Aceita-me as palavras?
Prometo tratá-las
em pó de arco-íris
Prometo gravá-las
em potes de seda
Prometo não serem
Nem arma nem voto
Talvez salto de criança
nos braços do pai
Talvez beijo da máquina
na palma da floresta
Aceita-me as palavras?
Prometo
manter-lhes levíssimas asas
manter-nos irmãos
pela mesma sede
Bula
Poesia à base de glúteo e glútenDegluti-la pode causar alergia
(digo, alegria)
Maria Amélia Elói
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