E quando um poeta cansa?
um cansaço absurdo
de todas as coisas
poéticas
cafonas
dos poetas
e de seus poemas
(especialmente os de amor
e as rimas! pobres rimas
podres)
daquilo que suja
a poesia
("imaculada", diriam eles)
a verdadeira poesia
que vem do âmago do ser
(não dali, da região do umbigo)
a arte pura
tão nobre e altiva
a matéria prima
brutal e lasciva
(porque nem toda rima é fatal)
e quando ele se cansa
daquilo que o faz
mais que existir
persistir
e ir além
- o fôlego que vem
quando já
sufocado está
e quase morto
quase morto
quase
(existirá poesia sem drama?
sem repetições de efeito?
sem quebras confusas e
sem rima, a maldita rima?
sim. e muitas!
mas é bem provável
que poucos hão de gostar
além do poeta
para quem o próprio escreve)
quando ele cansa
disso tudo
o que fazer?
nada lhe resta
que tenha valia
além de evitar
encarar o exército
de rostos pálidos
e corpos nus
centenas a milhares deles
todos idênticos
um a cópia imperfeita
do outro
a lhe vigiar, a lhe perscrutar
a lhe perseguir e a julgar
com olhos brancos
com bocas murchas
e braços flácidos
a lhe chamar, a lhe esperar
a lhe encarar sem semblante
a lhe acenar, a lhe aceitar
como mais um - semelhante
para um dia a eles se juntar
a vagar e a divagar
sofrendo (como há de ser)
eternamente (oh, poeta)
no espelho.
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