por Otávio Martins
Já nem reparava nas instalações – ou já não lhes despertavam mais qualquer atenção – tampouco nas coisas, tantas, as quais se espalhavam pela casa toda. Quanto mais se inteirava da moda e do que as suas amigas e conhecidas haviam adquirido, maior a quantidade de objetos que iam substituindo aos mais antigos. Até mesmo para “livrar-se” daquilo tudo que considerava obsoleto, era uma trabalheira danada. Coisas que iam se tornando quase como entulho. Quando atingiam certa condição, eram olhados como trastes. A compra em si era o que a entusiasmava e incentivava. Objetos, que teria visto, ou parecidos com outros que tomara conhecimento por aí. Seus guarda-roupas andavam atopetados; modelitos que ainda nem havia experimentado. Sempre faltava alguma coisinha... Mas, era assim que se sentia realizada, feliz.
Perdia-se pelos corredores de shoppings e por ruas cheias de lojas. Na maioria, bugigangas, ou coisas que perdiam a sua importância tão logo eram retiradas da vitrine. Seu marido até que gostava daquilo tudo. Achava, com certo descaso, que, assim, ela teria com que ocupar o seu tempo. Mesmo pesando no orçamento e nas movimentações de seus cartões de crédito – pensava - valia à pena.
Num dos finais do dia e início de noite – um tanto fria – parou diante de uma barraca que vendia churrasquinhos. Nem sabe por que parou ali. O olhar do homem que atendia na pequena barraca improvisada – além de duas mesas e quatro cadeiras, dessas cedidas por fabricantes de alguma bebida qualquer - parecia um ímã. Ali, hipnotizada, não teve alternativa, pediu um churrasquinho e, (escolheu o de carne mais magra – lembrou do seu regime, o qual uma amiga havia lhe indicado) solenemente, sentou-se numa das mesas, à espera dos últimos preparativos. Num pratinho, de tamanho médio, dois guardanapos de papel sob o alimento, a água mineral, canudinhos e papel, acondicionados em pequenos recipientes, além de alguns temperinhos, caso quisesse incrementar o seu churrasquinho.
Tanto o olhar do homem, quanto a sua força de minutos atrás, de segurar o freguês por sua simpatia, desarmaram-se. Parecia satisfeito. Deixou-se levar pelas perguntas e pela conversa, sentindo que ela estava necessitando falar com alguém. Pouco ela falou de si. Estava interessada em descobrir de onde vinha aquele poder, tanto do olhar, quanto de outras atitudes que, conversa vai, conversa vem, ficou sabendo que – quer dizer, ele lhe contou – talvez pela necessidade que tinha de comprar um fogão novo lá para a sua casa, esforçava-se ao máximo no atendimento. Sua mulher já não agüentava mais aquele velho. Duas bocas que já não acendiam; o forno, nem pensar; as bocas restantes exigiam muita paciência. Enfim, já não servia mais pra nada, como se costuma dizer.
Impossível não lembrar da sua casa. Também, nem perguntara à empregada se aquele fogão novo que havia comprado recentemente substituíra à altura, o antigo. Não que o outro estivesse velho, mas não tinha essas coisinhas mais modernas. Automaticamente, lembrou-se da churrasqueirinha – daquelas elétricas, de cozinha, que o alimento fica rodando sozinho – a qual nunca havia usado. Perguntou ao homem se poderia lhe vender uns quatro churrasquinhos, crus, os quais levaria para assá-los em casa. Reforçando, elogiou o corte e a seleção da carne, gostaria de comer mais tarde.
Chegando a casa, entusiasmada com a situação e com a própria atitude, ligou a churrasqueirinha, deixou esquentar um pouco, e colocou os quatro churrasquinhos para rodar. Pouco tempo depois, retirou-os e, acomodou-os em um prato; noutro, os temperos, levou a comida até o escritório onde o seu marido ainda estava trabalhando.
Ele nem se admirou. Era assim que costumava avaliar as suas atitudes, com desdém. Apenas estranhou o horário, pois àquela hora, coisas do seu regime, nem mesmo ela costumava comer. Já passava das dez horas da noite.
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