“Na
última perseguição à Sagrada Igreja Romana reinará Pedro Romano, que
apascentará as suas ovelhas no meio de tribulações, passadas as quais a cidade
das sete colinas (Roma) será destruída e o juiz terrível julgará o seu povo.”
(Final
de uma profecia que apareceu em 1595 e foi atribuída ao sagrado bispo Malaquias
de Armagh, morto em Novembro de 1148)
Roma, dois de Abril do ano que decorre
Vossa Santidade
Santíssimo Padre
Imbuído do respeito que me é
devido, dirijo-Vos palavras que, pretendo, traduzam o meu testemunho e o meu reconhecimento.
O meu nome de baptismo
escolheu-o minha avó Marquinhas. Dela aprendi a ser atento aos sinais dos
tempos.
Santidade.
Quiseram Suas Eminências, os
Cardeais, reunidos em Conclave, que fosseis Vós o escolhido. Que fosse um
Cardeal oriundo da terra martirizada dos índios, a ter a incumbência de se
perfilar no final dos tempos, ser o que recebe o anticristo.
Ou teria essa escolha sido
um desígnio do Alto, que nas leis da Santa Madre Igreja não cabe a crença em
profecias que considera inverdades.
Mas Vós, Santíssimo Padre, Vós
tínheis lido e meditado nas cento e doze afirmações do frade, e seria disso que
um riso suave iluminava o Vosso rosto ao olhardes aqueles homens doutos vindos
dos quatro cantos: os Cardeais a ocuparem os seus lugares na Capela Sistina. Quase
todos velhos, ofegantes, preparados desde os seus inícios para estes misteres
de passar testemunho, e nem sabendo que os Profetas Negros escrevem muito mais
direito pelas linhas que unem mundos do que o Deus Omnipotente em que acreditam
Suas Eminências.
Vós sorrindo na terceira
cadeira a contar do altar, na fila da frente.
Vós, o mais novo deles.
Lá fora, fazia um frio
diverso do que era costume, que nem era neve mas gelo o que cobria a Praça de
São Pedro. Eu, irrisório, invisível aos olhos do que era importante, velava para
que se mantivesse acesa a fornalha onde deitariam votos. Cento e tantos
cardeais e, assim, outros tantos papelinhos.
E foi uma vez e outra.
Tantas, que quase perdi o conto daquelas em que foi necessário adicionar um fio
de palha húmida para que, no gelo que soprava em rajadas sobre o Vaticano – ao
fundo, o Tibre imensamente branco – se contrapusesse um fumo negro num desesperado
no habemus papam.
E Vós sorríeis, manso, na
terceira cadeira da fila da frente.
Sempre o último a colocar o
voto.
O papel dobrado em dois tal
e qual como Vós Vos dobráveis a orar:
– Chamo como testemunho
Jesus Cristo, o Senhor, que Ele seja meu juiz, que o meu voto seja dado àquele
que perante Deus considero dever ser eleito.
Mas nunca mais os votos
ardendo sem um fio de palha.
Nunca mais um fumo
imaculado.
Tinha sido o Novemdiales e o Pro Eligendo Papa. Sua Eminência o Cardeal Camerlengo tinha feito
ouvir o Extra Omnes havia mais de
quatro dias.
E foi quando veio a gripe.
Os Vossos pares acamados. Dois deles mortos, ao quinto dia de Conclave. E não
saía outro que não fosse fumo negro.
Gelava-se na Praça de São
Pedro.
Pelo mundo, as televisões
colocavam rodapés com notícias que pouco variavam, e as conversas, e os
debates, na espera de que fosse anunciado, iam dando relevo às profecias: que
este seria o papa maldito, que este seria o papa derradeiro.
Benziam-se as mulheres.
Que bem podia ser o fim dos
tempos, diziam os mais velhos, e sorriam disso os muito jovens não sabendo. Em
celulares e redes sociais vaticinava-se qual seria o Cardeal escolhido. Pelo
meio, faziam-se anedotas e eram muitos os que acreditavam que estava perto a
chegada do anticristo.
Rezava-se aos deuses mais
diversos e venerava-se, sem constrangimentos, a Besta.
E o Vosso sorriso foi
ficando triste.
Toldava-se o Vosso olhar tão
puro, que era dos ares da selva que Vos tinha vindo esse olhar de menino. Vós a
sentirdes o pecado das vestes, que era outro o Vosso modo de ser Igreja com o
povo.
Mais Vos pesaria a mitra, e,
no entanto, quando Vos foi inquirido:
– Reverendo Cardeal, aceitas
a tua eleição canónica como Sumo Pontífice?
Foi sem hesitar que
respondestes:
– Aceito, em nome do Senhor.
E em uníssono, o Conclave suspirou de alívio.
De gripe e de desespero, tinham
morrido vinte e oito Cardeais, nesses dois longuíssimos meses.
E quando o Decano voltou a
inquirir:
– Como queres que te
chamemos?
Respondestes, em tom sereno:
– Pedro Segundo.
E, muito baixinho, e ainda assim
de modo a ser ouvido:
– Pedro Romano.
E na Capela Sistina ressoou
um urro.
E antes que houvesse o tempo
de deitar lume nos votos, a Vossa capa magna foi voando a sair por onde deveria
ter saído fumo branco.
Vermelho de inferno ou
vermelho de sangue anunciando.
Benzeu-se pelo mundo quem
era de costume, e benzeu-se quem ficou simplesmente pasmado ou medroso de que
aquele vermelho fosse o sinal.
Na Capela, benzeram-se, à uma,
os Cardeais que iriam beijar, em acto de obediência, o Vosso pé descalço a dar
seguimento ao que sempre tinha sido.
Mas Vós recusastes.
Sem férula, e nem a mitra
que teria substituído o solidéu sobre o vosso cabelo ondulado e farto, negro
como as cabeleiras dos índios vossos avós; com o vosso fato simples a
contrastar com os luxos, ouviu-Vos falar o Mundo de uma Era Nova sob o frio de
gelo que pairava sobre Roma.
Nem mais a Igreja Romana. Em
suas cinzas se ergueria a Igreja de Cristo, a real, a verdadeira, a de mulheres
e homens unos no voto de pobreza e humildade. Que seriam as riquezas colocadas
ao serviço, pois seria na simplicidade que seguiriam os membros desta Igreja Nova.
Assim o proferiste enquanto pelo Mundo, num uníssono de catástrofe ou de festival, consoante, iam ruindo,
uma a uma, as catedrais de cultos, fossem de crenças em deuses ou fossem
catedrais de riquezas fúteis e mal-sãs ou catedrais do dinheiro.
Ardiam em fogos
instantâneos.
Fogos que não alastravam. Ardiam em chamas
purificadoras apenas os excessos, que não ardia uma semente, nem animal, nem árvore,
nem ardiam casas de gente, e ficavam verdes os cultivos e maduros os frutos.
Eu assistia ao Vosso Urbi et Orbi e o Habemos
Papam de uma Igreja que acabava.
Mas do meu canto, eu apenas via
o padre José do Espírito Santo, natural de Maués, aquele que eu mesmo um dia
baptizara. E murmurava o meu muito obrigado, que nesta carta renovo.
Sou de Vossa Santidade,
humildemente,
Malaquias, frade
Nota:
texto revisto, elaborado no âmbito de uma oficina de escrita
6 comentários:
Texto muito oportuno.
Quando o li pela primeira vez, há mais de 2 anos, não captei a carga profética que desenvolvia, mas que, agora, a comunicação social se encarrega de divulgar.
Admiro a provável pesquisa profunda, suspeitada pela verosímil terminologia dos rituais do microcosmo católico.
o seu a seu dono , Joaquim, e se fiz alguma pesquisa, o Marco também enviou muita "papinha" quando da proposta :)
Lembrei assim que comecei a ler! Virando profetisa, é? Vou chamá-la de Fátima Malaquias! E embora a própria Igreja já se tenha encarregado de dizer que as profecias imputadas a São Malaquias eram falsas, melhor acertar uma no cravo, outra na ferradura! Rezo para que próximo se chamar, Pio, Leão, João... Longe de Pedro, que dirá Romano!
tomba dessa, não que isso se chama superstição amiga Cinthia eheheh
Assustadora revelação. Mas ainda não deve ser o final dos tempos. Que os cardeais tomem dela conhecimento. Profecia mais explicada que as de Nostradamus e atualizada. Que bom que em Roma não haverá neve, ou haverá?
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