Amor, Beligerância
Em minha
casa tenho bilhas de água.
A sede não
é tanta; plantas, só uma palma.
Tenho
essas bilhas de água desde o dia
em que
você nadou no rio dizendo que não voltaria.
***
Se é a
melhor solução? Não sei ao certo, mas para mim existe um propósito
próprio, uma lógica própria, um motivo e uma razão: não mais
falar com você. Por que? Porque você já não faz mais parte da
minha vida. Naquele dia em que você falou com as mais claras
palavras: “eu não quero mais falar com você” eu não soube onde
encaixá-la mais em meu coração. Aquelas não eram palavras, era
aço afiado que cortou e arrancou. Então, dia após noite, lua após
sol, após tanto tempo de mágoa contida, você se foi. Pensei que eu
não pudesse, mas pude, e a cada dia que vivi sem você, percebi que
eu vivia. Eu vivia, sim. Como seria viver sem você? Eu acabara de
descobrir, e descobri, também, que nada mudara. Eu disse adeus
e vivi. Viver, morrer, nascer, fazer sexo, gritar, apertar os punhos.
Ora, sou apenas um homem, desses que passam em catracas de ônibus,
que sonham e pulam buracos. Não sei das coisas óbvias da vida, sei
que vivo sem você (e que alegria saber!) e saber que isso, agora, é
óbvio, faria eu levantar, encher um copo com água e beber. Ou
comer, ou dormir, ou trabalhar. Uma cura, sim, posso pensar em uma
cura. Eu estou curado. Saudável. Mas você não é uma doença, um
mal, uma peste. Ah, não, definitivamente um mal você não é. E
quem disse que não adoecemos de coisas boas? Pudera eu saber das
outras pessoas, mas eu sei apenas que adoeci de você e demorei muito
tempo para me recuperar. Um momento. Meu coração não deixou de
bater, não deixei de amar, nem de novamente sofrer. Por que digo
para todos os lados que você tanto machucou? Porque assim eu desboto
as últimas lembranças de você. Guardei seu olhar amoroso, seu
sorriso, suas palavras que diziam meu nome, havia algo sincero nos
dias que compartilhamos juntos. Olhei para trás, nos anos que vieram
depois de você. Eles foram bons. Bons como os anos que vieram antes
de você. Eu sou feliz por eles, por todos esses anos. Mesmo os seus
anos foram bons. Surpresa. Você foi igual às outras, nem melhor,
nem pior, foi uma das. Uma das. Uma delas. Aquelas pessoas tão
seletas, que fizeram tanto amar como entristecer. Aquelas pessoas
chamadas passado, que não voltam. Por que você não foi, por
que você insistiu tanto para não ir? Eu que não desamarrava o
barco do cais. Sendo assim, soltei o que prendia você e não quis
ver a partida, fechei os olhos para não ver o rumo tomado nem dizer
adeus. Era assim que decidi que fosse. Sem despedidas. Só aqui, no
papel. Dizer adeus é para ser grafado e pintado na página em
branco. Se você foi para o norte, para o sul, para o leste ou oeste,
meu adeus é para todas essas direções. Quis apenas o adeus para
todas as direções. Acenar como um doido para todos os lados, sem ao
menos ver para onde você foi. Meu adeus é para todas as direções.
Devo ser isso sim, um doido que não sabe para onde acenar e que
acena de olhos fechados. Sem olhos eu não posso ver para onde você
foi, e sem olhos não posso chorar, e sem chorar não posso sofrer.
Sei agora como tudo é óbvio, e não lutarei mais contra ele. O
óbvio. A lógica. A continuidade. Viva aos ponteiros do relógio que
só param por falta de corda ou por pilhas gastas. Verei que o ângulo
de noventa graus marca as nove horas, as vinte e uma horas, as três
horas, as quinze horas. Todo dia, toda a noite, toda a noite, todo o
dia. Não há comida em casa, é preciso comprá-la e fazê-la. É
preciso jornal para ler, roupas para vestir. Ou ao menos tomar banho.
Sei que debaixo do chuveiro suas lembranças não serão levadas com
a água, porque elas não existem mais. Viva o ceticismo das coisas.
Viva para quem acredita no tempo como solução. Eu acredito no tempo
como solução, um viva para mim. Viva, para que? Saí machucado de
tudo isso. O tempo é a melhor resposta, o meu O Tempo e o
Vento. Tudo passou, passou de olhos fechados. Quando eu os abri,
vi o mar, o céu, nuvens rápidas. Antes de mim, diante de mim, e
depois de mim.
***
Comecei, lentamente, a esvaziar as bilhas de água que
eu tinha aqui em casa. Peguei-as para aguar as plantas, depois
misturei com sabão e limpei a casa. Limpei cada canto, cada fresta.
Lavei os vidros, as janelas. Desci à lavanderia e desliguei a
máquina da torneira, enchendo-a várias vezes para as minhas roupas.
Preparei toda a comida que eu tinha, para que durasse semanas sem eu
ter que cozinhar. Quando estava tudo limpo, seco, passado, brilhando,
sem pó nem sujeira, com o almoço pronto, sobrou uma última bilha.
Alcancei um copo e bebi-a. Toda. Sentia sede.
***
Tout passe, tout casse, tout lasse.*
Victor Hugo
De repente, o meu amor, esse amor
ora tão profundo, descansou. Deus ensurdeceu de tanto ouvir minhas orações.
***
Esperei
um sorriso seu. Esperei uma mensagem sua. Esperei um telefonema seu. Esperei
uma carta sua. Esperei um beijo seu. Esperei uma resposta sua. Esperei um gesto
seu. Esperei uma fotografia sua. Esperei um olhar seu. Esperei uma declaração
sua.
A campainha tocou. Não era você. Era
outra pessoa. Abri a porta, e ela entrou.
***
Seios.
Umbigo. Pelos. Beijei-a. Toquei-a. Quando ver outros seios, umbigos, pelos, a
mesma coisa farei; como homem não me privo de sentir prazer. Tampouco dá-lo a
quem deitar-se comigo.
***
好き、好きだよ
い
つ
も
希
望
を
持
っ
て
(suki,
suki da yo
itsumo kiboo o motte)
gosto,
gosto sim
s
e
m
p
r
e
t
e
r
e
i
e
s
p
e
r
a
n
ç
a
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