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segunda-feira, 23 de julho de 2012

O sofá


(*)

O sofá me agrada, mas tenho que sair. Daqui a pouco, a noite chega e não é bom continuar por aqui. Muitas pessoas chegarão e eu prefiro a solidão. Não é que eu goste do meu isolamento, mas não gosto da multidão. Não gosto daquele barulho no ambiente, que atrapalha uma boa conversa. Além disso, nesse bar, o sofá é o lugar mais procurado. Ele é confortável, seguro e lembra sexo. As pessoas adoram sexo.

Talvez hoje o bar não encha, talvez só por hoje as pessoas esquecam as cervejas, a diversão e fiquem em casa com seus amigos, suas famílias.

Há anos que não tenho um relacionamento sério. Ás vezes, eu até gostaria de divertir-me um pouco com alguém, ou quem sabe namorar, casar, ter filhos. Mas a verdade é que não tenho mais paciência para relacionamentos, não tenho mais paciência com as pessoas. Acho que no fundo, não tenho mais paciência para mim. Tenho andado tão só, que com o tempo acostumei apenas com a minha presença, acostumei a viver sem ningúem.

Mas gosto de ir à cafés, restaurantes e bares; gosto de ver pessoas, gosto de assisti-lás, mas não gosto da interação. Há pessoas que não percebem que apenas quero ficar ali, distante, apenas olhando. Tem uns que tentam começar uma conversa, como se eu quissese conversar. Nesses momentos, só penso que gostaria que eles não me aborrececem tanto. Os homens são os piores.

Eles simplesmente não podem ver uma mulher sozinha em um pub. Eles acham que precisamos ter um homem ao nosso lado, então chegam e começam a falar. Na maioria das vezes, eu não quero conversar, tento encerrar o assunto, dizendo que estou lendo ou esperando meu namorado, mas eles continuam. É um aborrecimento total. E devaneio comigo mesma, 'eu só queria tomar uma bebida fora de casa, sem papos só para não estar em casa'. E quando alguns, mais ousados me tocam? Nesses casos lembro-me dos versos do poeta 'Não gosto que me toquem'.

Meu analista diz que são problemas mal resolvidos que tenho com o meu pai. Eu, simplesmente, acho que é porque não gosto de ser incomodada. Não é problema comigo. O problema é desses homens. Foram poucos o que conseguiram fazer com que eu me sentisse uma mulher de verdade, foram poucos os que fizeram com que eu sentisse. Pela minha experiência, a maioria são uns mal educados, insensiveis e egoístas. Pensam que sabem de tudo e que as mulheres não sabem nada. Tratavam-me como uma estupida, como se eu não tivesse voz para falar sobre os problemas do país, o sorriso da Monalisa ou sobre a vida.

Há muito que deixei de desejar um homem perfeito, gosto mesmo é dos imperfeitos, mas almejo ainda encontrar um que simplesmente me escute. Alguém com quem eu possa falar e que não seja meu analista.

Depois de um tempo, comecei a perceber que os homens são na verdade meninos de fraldas. Isso faz lembrar-me de um verso de outro poeta 'o menino é o pai do homem'. Não sei se isso faz muito sentido hoje em dia. Os meninos quando crescem, parecem ainda mais meninos. Ou pior, meninos sem confiança.

Talvez meu analista tenha razão. Talvez eu tenha problemas mal resolvidos com o meu pai. Mas a verdade é que nunca conheci um homem como meu querido pai. Ele era do tipo confiante, que me protegia e fazia com que eu sentisse segura ao lado dele. Ele sabia que não podia me proteger de tudo, mas se esforçava para fazer com que eu acreditasse que isso fosse possível. Ele tinha uma confiança, uma segurança ao falar comigo, ao cuidar de mim; uma segurança que nunca vi em nenhum outro homem. Todos que conheci eram inseguros.

Será que sou eu? Será que sou eu que os deixo inseguros? Nao, acho que eles são assim por natureza. Os meus homens, meu ex-namorados, casos não sabiam o que queriam da vida, esperavam que algo acontecem para que tudo fosse diferente. Queria um emprego melhor, mas não procuravam algo melhor ou atualizavam seus currículos; queriam uma vida diferente, mas continuavam fazendo as mesmas coisas de sempre; reclamavam das pessoas, mas continuavam saindo com elas. Sempre as mesmas. Com o tempo fui perdendo a paciência, fui cansando-me desses mesmos discursos. No final todos eles eram iguais, crianças com medo de encarar a vida. Eu eu antes de ser mãe, antes de ser dona de casa, eu queria ser mulher. Talvez por causa disso, hoje eu prefira ficar sozinha.

Mas gosto de ir a cafés e bares. Em especial neste bar, no qual tem esse sofá de couro, bordô, que tanto gosto. Ele é aconchegante, confortável e isso me enche de confiança. Lembra o meu pai. E isso traz me esperança. Penso em permiti-me uma vez mais, ter alguém em minha vida novamente. Então veio para esse bar, sento-me no sofá e tomo minha bebida. E mesmo que eu não queira admitir, sempre acho que vai chegar alguém e conversar comigo com toda a segurança, que não ficarei impaciente, que terei vontade de conversar com essa pessoa. Infelizmente, os homens que sentam ao meu lado são tão desinteressanes e chatos ou são casados. Então, prefiro ficar quieta no sofá, fingindo que leio ou fingindo que estou no celular.

Talvez o problema não sejam os homens, talvez seja eu. Talvez, meu destino é ser sozinha. É... pensando bem, eu sou muito complicada mesmo, nunca vou achar alguém que me entenda, que escute o que tenho a dizer, que me ame. E claro, que seja fiel.

Às vezes, até penso em dar chance a um desses caras inseguros, mas daí, imagino como seriam as coisas e percebo que teria que cuidar de tudo em casa. Imaginar uma rotina, na qual eu teria que cuidar de tudo, todos os dias, cansa. Talvez, eu esteja mesmo é cansada da vida. É que tudo é um tédio, nada de novo acontece.

Ás vezes eu queria viajar para um país distante ou encontrar alguém com quem eu me sentisse bem, então casaríamos, teríamos filhos e seríamos felizes. Simplesmente assim, ser feliz. Mas, acho que nada disso vai acontecer, eu não vou conhecer ninguém interessante, não vou viajar para um país distante. Mas uma coisa eu sei, gosto do sofá, gosto de me sentir bem quando estou sentada nele, e então vou ficando por aqui, sozinha no sofá, só mais um pouco, enquanto a noite não chega.



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(*) Direito da imagem atribuído a dee_gee, seguindo os critérios estabelecidos pelo Creative Commons .

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