Helena queria muito, por vingança ou prazer, provar o gosto de outra boca. Cansada demais, humilhada, uma sombra vagando pelo casarão decadente. Ela não sabia nada, casou aos dezoito com um homem com idade para ser seu pai. Seis anos se passaram e havia-se tornado empregada e eventual mulher.
Cheirando a desinfetante e cloro, sempre vestindo trapos e esfregando o chão encardido. Naquele dia seria diferente, esperou que o marido saísse e pegou o sabonete comprado às escondidas. Foi uma delícia usar o aparelho de barbear dele para depilar as pernas, axilas e virilha. Riu enquanto cegava a gilete, ele sempre gritava que era homem "da antiga" e não admitia plásticos.
A banheira ficou cheia de pêlos e ela nem se importou. Usou um resto de colônia e sorriu para o espelho amarelado. Nada naquele lugar prestava. Do encanamento às panelas herdadas da sogra, tudo era sucata. Lixo. O carteiro chegou na hora habitual e começou a enfiar os envelopes na caixinha. A mulher escancarou a porta, nua e com um sorriso provocante.
Há muito trocavam olhares, o máximo de intimidade aconteceu no Natal quando timidamente, ela entregou o envelope com a gorjeta. Tocou com a ponta dos dedos as mãos finas da moça tão bonita e maltratada. Agora eram apenas os dois e aquela urgência doída.
Havia o perigo de serem surpreendidos e logo estava dentro dela. Movimentando-se apressado, pretendia gozar e deixar aquele lugar o mais rápido possível. Não contava que ela fosse tão gostosa, não imaginava tanta doçura, perdeu a noção do tempo. A visão do corpo largado em cima da mesa, completamente à mercê de seus desejos era irresistível.
Repetia baixinho o nome, apaixonado e beijando Helena, dentro de Helena, aspirando o perfume de Helena... Helena... Helena... Helena...
*******
Ninguém gosta de traição. O vulto aproximou-se da casa. Deu a volta e entrou pela garagem, que estava aberta.
A traição não seria perdoada. Não mesmo. A porta da sala foi aberta.
O insulto seria vingado. O machado caiu pelo menos sete vezes.
O grito veio na primeira, que levou embora uma perna.
A segunda levou um braço.
A terceira levou a outra perna.
A quarta levou o outro braço.
A quinta cortou uma das coxas.
A sexta levou um dos ombros.
A sétima pôs o machado enterrado no abdômen.
O olhar injetado da morte caiu sobre o carteiro.
E em seu último suspiro, ele disse o nome dela. Agora começaria tudo novamente...
domingo, 19 de abril de 2009
Helena- Giselle Sato e Pedro Faria
por Giselle Sato
Seja o primeiro
0 comentários:
Postar um comentário