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sexta-feira, 6 de março de 2009

Henriqueta Lisboa: o modernismo remodelado pela timidez



“Não haverá, em nosso acervo poético, instantes mais altos do que os atingidos por este tímido e esquivo poeta.”
Carlos Drummond de Andrade



Noturno




Meu pensamento em febre
é uma lâmpada acesa
a incendiar a noite.

Meus desejos irrequietos,
à hora em que não há socorro,

dançam livres como libélulas
em redor do fogo.


In: Prisioneira da Noite (1941)






Esse despojamento




Esse despojamento
esse amargo esplendor.
Beleza em sombras
acrifício incruento.

A mão sem jóias
descarnada
na pureza das veias.
A voz por um fio
desnudana palavra sem gesto.

O escuro em torno
e a lucidez
violenta lucidez terrível
batida de encontro ao rosto
como uma ofensa física.

Na imensidade sem pouso,
olhos duros
de pássaro.


In: A Face Lívida (1945)


Horizonte

Alma em suspiro
pelo encontro
do que fica
sempre mais longe


Calendário


Calada floração
fictícia
caindo da árvore
dos dias


In: Reverberações (1976)



Poeta mineira considerada pela crítica um dos grandes nomes da lírica modernista, Henriqueta Lisboa nasceu em Lambari, MG, em 1903 e morreu em Belo Horizonte em 1985. Dedicou-se à poesia, ensaios e traduções. Surgindo no decênio da Semana de Arte Moderna, Henriqueta marcou o seu lugar, em nossas letras. Com Enternecimento, publicado em 1929, de forte caráter simbolista, recebeu o Prêmio Olavo Bilac de Poesia da Academia Brasileira de Letras. Aderiu ao Modernismo por volta de 1945, fortemente influenciada pela amizade com Mário de Andrade, com quem trocou rica correspondência entre os anos de 1940 e 1945. Foi a primeira mulher eleita para a Academia Mineira de Letras em 1963. Em 1984, recebeu o Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras pelo conjunto de sua obra.
Henriqueta manteve-se sempre atuante no diálogo com os escritores e intelectuais de sua geração e angariou muitos leitores ilustres durante sua vida, dentre eles Mário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Cecília Meireles. Apesar disso, era uma figura solitária. Sua poesia busca tangenciar o indizível, ultrapassar os limites da palavra e penetrar a essência da poesia. Por isso nos comove tanto, sem recorrer a qualquer artifício sentimental. As palavras vêm para ela como se fossem as próprias coisas, os próprios sentimentos, as próprias sensações. Por essas características, Henriqueta Lisboa é considerada um dos grandes nomes da poesia em língua portuguesa.

Fonte dos dados biográficos: http://www.letras.ufmg.br/henriquetalisboa/
http://pt.shvoong.com/books/biography/1659839-henriqueta-lisboa-vida-obra/

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