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terça-feira, 17 de março de 2015

A poesia de Ana Moraes






Gênesis

então ele criou o homem
cansado e lascivo,
não satisfeito
arrancou-lhe uma costela

mas, ainda insaciável
tocou-a, molestou o sangue,
as carnes e os ossos
e assim fez o seu melhor
erro

seu melhor efeito
catártico
que estaria por vir,
quando esta acordasse
e sentisse a sabia
sede
perigosa da
curiosidade
oferecida pela serpente.



Habitando o desapego 2

"eu me apaixono por "bom dia"
me apaixono por pegadas nas ruas
e por esbarrões na calçada
me apaixono por barbas desconhecidas
que desfilam livremente pela praça
me apaixono por estranhos que compram bombons 
na segunda feira
me apaixono por feirantes vendendo peixes
...
me apaixono por cuidadores de cães
por adestradores de ornitorrincos
e por lançadores de fogo
eu assim tão infame
tão indecente
e tão imoral
me apaixono a cada minuto
e nem sei bem o porquê
mas me apaixono".



Buceta     

Não é só os olhos diante do espelho
que cai
não é só os seio de bicos rosadas
que endurecem
não é só a coxa roliça
...
Que se dilui
 (não)
nunca é só o corpo que 
dilata
não é só o sangue
que escorre
não é só a lágrima
que lateja
não
definitivamente não
nunca é apenas
3 dias no casulo
é quase uma vida
 de clausura
dentro do útero
cada luto mensal
que insiste em nascer.


                                          
E ser...

e se o amor for
aquela película aguada
que dilui e dilata
as pupilas do cego

e se ele for um arrebate
um afoito insólito
um grito ao pé do ouvido

se for um ponteiro
... indiscreto
titubeando meus pulsos
dilatados pela fria
forma de entender
as facetas falsas
da dor

e se ele for por si só
um ato
intervalo do prelúdio
e assim
ser
solidão.



eu...

corro para não ter que perder
o sono com as alucinações
desta alma tão tranquila
e tão pequena
dentro deste coração
... tão sorrateiramente
apertado
sem frestas
e sem tempo.



sólido

Dilata corpo
estranho
dilata olho estranho
dilata amor
dilata tuas entranhas
... frias
no alto inóspito

do meu calcanhar.

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Rafael F. Carvalho
Autor do livro A Estante Deslocada, é paulistano, nascido em 27 de Fevereiro de 1978. Foi publicado em antologias de novos escritores e em jornais universitários, e é formado em Letras pela Universidade de São Paulo.


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