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segunda-feira, 24 de novembro de 2014

ENTRE DOIS TANAKAS


No dia 26 de outubro de 2014, data do segundo turno das eleições presidenciais brasileiras, o Japão também foi às urnas para escolher prefeitos e vereadores. 

E aqui cabe o primeiro diferencial em relação ao pleito em terras tupiniquins, onde as disputas eleitorais viram duelos dignos dos mais violentos filmes de faroeste: o voto na Terra do Sol Nascente não é obrigatório. De tal modo que, em dia de eleições, poucos são os que se habilitam a sair de suas casas para escolher os representantes políticos. Mesmo porque os japoneses sabem que, ao final, o que está em jogo são somente os interesses dos partidos majoritários ― o Partido Liberal Democrata (o Jimin-tō) e o  Partido Democrático do Japão (o Minshūtō). E esses, caros leitores, não diferem muito nem entre si nem em relação a qualquer outro partido político do mundo em seu primordial objetivo: o Poder. Então ― reflete o sábio japonês ―, para que gastar sapatos indo votar em um bando de oportunistas? Fazem bem.

Quanto a este brasileiro que vos escreve, após haver votado no Consulado-Geral de Tóquio, resolvi acompanhar minha esposa, cidadã japonesa, até a escola onde ela votaria ― e testemunho que ela se locomoveu menos pelo sentimento de dever cívico do que pelo necessidade de ir ao supermercado (que ficava próximo ao local da votação). 

Ao caminho ― e para que o leitor tenha uma ideia da importância das eleições na vida social nipônica ―, encontramos apenas um outdoor com os nomes e as fotos de todos os candidatos. Foi então que, curioso, perguntei a minha esposa em quem votaria para prefeito. E ela, dando de ombros, respondeu-me: 

― Sei lá, em quem você acha que devo votar? 

Para ajudá-la, então, sugeri o que me pareceu mais confiável (conclusão a que cheguei fazendo mentalmente um “mamãe-mandou-eu-escolher-esse-daqui”): 

― Que tal o Tanaka?

― Qual deles?― indagou-me, em contrapartida, a amada consorte.

E com toda a razão ela o fez: pois, naquele instante, lendo mais atentamente, dei-me conta que os dois candidatos a prefeito tinham o mesmo sobrenome. 

Não dispondo, porém, de muito tempo ― eram quase cinco da tarde, e, no supermercado, sabíamos, as filas seriam bem maiores que as da votação ― decidimo-nos logo pelo Tanaka número dois... e fomos às compras.

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Edweine Loureiro
Nasceu em Manaus em 20/09/1975. É advogado, professor de Literatura e Idiomas, e reside no Japão desde 2001. Em 2005, obteve o Mestrado em Política Internacional pela Universidade de Osaka (Japão). Premiado em diversos concursos literários, é autor dos livros: Sonhador Sim Senhor! (Ed. Litteris, 2000), Clandestinos [e outras crônicas] (Clube de Autores, 2011) e Em Curto Espaço (Ed. Multifoco, Selo 3x4, 2012). É membro-correspondente da Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências (RJ) e da Academia de Letras de Nordestina (BA).
todo dia 24


4 comentários:

Legal a história... e dá-lhe supermercado... melhor mesmo ir às compras já que existem tantos Tanakas por aí... parabéns... abração

Crônica bem-humorada e lúcida sobre o processo eleitoral no Japão, que não difere muito das eleições no Brasil no quesito "em quem votar". Andamos cada vez menos motivados a escolher nossos representantes, que, na verdade, não nos representam. Não seria a hora de tomarmos as rédeas nas próprias mãos para mudar o status quo? Que ninguém se iluda, não há salvador da pátria...
Um abraço, Angela Fonseca

Obrigado, Gera, pela leitura. E vamos as compras! Abracao, amigo.

Obrigado, amiga Angela, pela leitura. De fato: hora de tomarmos uma atitude - basta de sermos saqueados e enganados. Abracos, amiga.

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