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segunda-feira, 23 de junho de 2014

a cidade esquecida

Trafego entre as ruas de uma cidade esquecida pelo tempo, tentando lembrar de minha própria cidade. Tentando lembrar de mim. Eu não estava perdido, seguia um caminho, seguia o meu destino, mas não esperava encontrar em minha jornada um povoado tão esquecido pelo tempo, tão esquecido por tudo e por todos.

Estava acostumado a cidades grandes, grandes multidões, mas quando cheguei ao povoado de Esquecido, tudo era diferente do que eu havia visto ou vivenciado em minha cidade.

The Forgotten Village por Remegio Onia

No dia anterior, havia decidido que chegaria até o meu destino caminhando: La Grana Cidad. Eu tinha decidido, mas não tinha sido uma vontade. Não achava que tinha muita escolha: era isso ou esperar uma semana até o próximo ônibus, já que não havia carros para alugar ou outro meio de transporte. Resolvi encarar o desafio, e caminhar os 30 quilômetros.

Não sabia se conseguiria percorrer o caminho todo em dois dias. 30 quilômetros é pouco para um carro, muito para um ser humano sedentário, que se cansa ao caminhar dois quilômetros. A minha surpresa é que passado os primeiros quilômetros eu já começava a gostar de caminhar.
Era um tempo para refletir na vida e no meu futuro.

Estava prestes a assumir a diretoria de uma companhia e estava só. Meu casamento que durará três anos, finalmente acabara. Não aguentávamos um ao outro, mas também não nos odiávamos. Quando surgiu a oportunidade de assumir um cargo importante, minha esposa disse que não me acompanharia na mudança da cidade. Não retruquei muito, apenas perguntei como faríamos. Foi ela que sugeriu que nos separássemos. Fiquei feliz. Feliz em nos separar, feliz por que a decisão não havia partido de mim.
Eu demoraria um pouco mais de um mês para assumir ao cargo, então fiz minha mudança para a nova cidade. Nos separamos e para não ficar pensando muito no que havia acontecido eu decidira viajar.

A primeira semana foi ótima, visitei museus conheci outras pessoas, algumas mulheres e estava gostando da sensação de liberdade que adquirira. Eu não sei por que nunca viajara com a Bianca. Bianca era minha esposa, a ex, como gosto de chamá-la agora.
Talvez ela não tenha ficado tão feliz ao saber que eu fizesse aquela viagem. Desde da época do namoro ela pedia para que viajássemos juntos, mas eu nunca podia. Na verdade, nunca quis. Não tenho por que mentir agora.

O conforto da viagem era o que eu mais gostava, aqueles hotéis com as camas enormes, lençóis sempre limpos e novos. Café no quarto ou buffet se eu quisesse descer. Era uma vida ótima, poderia viver assim para sempre. Mas então resolvi seguir a Luciana em uma viagem pelo interior, no terceiro dia eu já estava cansado dela e disse que ela podia partir sem mim. Eu partiria no dia seguinte. Mas eu não sabia que o dia seguinte, só poderia ser dali uma semana. Poderia esperar naquela cidade, o hotel era bom, o serviço excelente e a comida maravilhosa. No entanto, algo estava diferente, parecia me que eu não conseguia ficar ali parado uma semana. Tinha vontade de continuar. Então eu decidi caminhar.
O primeiro dia deveria caminhar 20 quilômetros até a cidade mais próxima, na qual havia um pousada, os outros povoados não tinham lugares para dormir. Os primeiros dez quilômetros foram tranquilos, mas depois do almoço, eu estava cansado e já estava de saco cheio de caminhar. Então começou a chuva.

Algumas gotas nada que eu precisasse me preocupar. Nunca tive problemas com a chuva, mas a natureza tem seus caprichos. A chuva ficava cada vez mais forte e não havia onde eu me abrigar, só queria chegar eu meu destino. As dificuldades ocasionadas pela chuva forte e depois pelo vento e mais adiante o barro que dificultava ainda mais a caminhada, alternavam negativamente o meu humor. A raiva crescia eu começava a achar que minha vida estava vazia. Havia perdido tempo com um casamento de interesse com a Bianca, havia seguido a Luciana apenas por um capricho. E agora estava ali, no meio do nada, sozinho novamente. E se eu não aguentasse chegar ao destino? e se eu morresse no meio do nada? Se ficasse doente? Ninguém sabia onde eu andava, não tinha parentes próximos.

Meus pais já haviam falecido. Não tinha irmãos.

Precisava encarar a verdade de tudo aquilo. Eu estava sozinho, emocionalmente e geograficamente falando. Então outro tipo de água passou a escorrer pelo meu rosto, eu chorava. Chorava como há anos não o fazia, apenas porque eu reconhecera o quão infeliz eu estava e o qual só eu estava. A escolha de assumir o cargo era uma piada, eu só o tinha feito para ter uma desculpa para ficar longe da Bianca, conseguira o que queria, mas agora tinha aquela tristeza, aquele vazio dentro de mim.

Kamarbon, the Forgotten Village por Hamed Saber

A chuva aos poucos parava. E aos poucos eu avistava aquele vilarejo vazio, abandonado, esquecido, isolado no meio do nada. Quando o sol surgira novamente, eu sorria. Estava em casa.

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