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segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Parindo Letras

por Ju Blasina

A tarefa de escrever é complexa. Exige muito mais do que tempo e dedicação, muito mais do que insight e inspiração, exige coragem e doação. Coragem para se expor aquilo que se tem de mais privado — as emoções — e doação para oferecê-las a estranhos, numa bandeja. É preciso ser generoso o suficiente para doar sem nada esperar em troca.

Mesmo que o eu lírico não leve de todo o autor consigo, na crônica eles se encontram e se tangenciam assim como a tangente que se faz entre ficção e realidade. O autor dá luz às palavras, como a um filho: ele as gera e as vê rapidamente crescer sobre o papel, e quando se sente orgulhoso — sim, porque a vaidade da criação é própria da natureza humana — as vê partir, autônomas, ganhando o mundo. Dá um friozinho na barriga, misto de receio de não as ter ensinado bem e medo de que o mundo não as trate com o respeito e carinho que merecem.

Diferente dos bons filhos, quanto melhores são os textos, mais distante do autor eles vão parar. Eles se mesclam ao mundo e às pessoas com quem interagem tornado-se tão diferentes que o criador sequer os reconhece — pensando bem, talvez não difiram tanto dos filhos... É impossível prever seu futuro, o caminho que trilharão. Aos pais, só resta exercitar a árdua tarefa do desapego e torcer pelo melhor.

Parir letras é dedicar a vida a algo cujo retorno é invisível, impalpável e silencioso, cuja recompensa — para a grande maioria dos novos escritores — não pode ser medida em valores que compram coisas, e pela mesma razão, não ganha o reconhecimento do mérito que tem.

Às vezes me tão sinto cheia de medos, vazia de idéias e estéril de palavras, que busco inspiração nos filhos alheios, aqueles que já ganharam o mundo e imortalizaram aos pais (Quintana, Manuel de Barros, Danuza Leão e os Fernandos, Sabino e Veríssimo, são os favoritos). E eis que então me pergunto: De onde vem tamanha pretensão (a minha) de gerar ideias, adestrar letras em textos e, mais ainda: mandá-los ao mundo? E o que pretendo alcançar com aquilo que crio? Perguntas retóricas, cujas repostas utópicas não são requeridas.

... Ah, se um dia minhas letras fizerem correr uma lágrima, mesmo que pequena, ou se um sorrir discreto se abrir, se um coração acelerar de leve ou bater a saudade pelo que foi ou deixou de ser, a ansiedade pelo que está por vir... Neste dia, encontrarei o baú do tesouro que todo escritor persegue. Um tesouro que pode até não comprar coisas, nem fazer desta a melhor das profissões, mas que certamente fará de mim a mais rica das criaturas!


Os filhos superarem aos pais é o destino que deles se espera. Que tenham uma vida longa e próspera, e nela encontrem aquilo que procuram, e com ela marquem o mundo. Que criem asas e voem longe: é isso que desejo as letras que torno minhas!


Afinal, não é isso o que todo pai deseja?

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Ju Blasina




todo dia 07


1 comentários:

Ótima e oportuna reflexão. Me caiu como uma luva, principalmente agora que estou vivendo uma estiagem criativa intencional, dedicado a ler, observar, absorver e não escrever nada. Uma delícia. A angústia é conviver com a pergunta: até quando?

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