(Maristela Scheuer Deves)
Sim, decidiu ela. Mesmo com medo, iria ao enterro para ver quem estava lá e como o autor dessa brincadeira mórbida iria se sair sem o seu corpo para sepultar. Acabaria, de uma vez por todas, com o plano dele. "Aliás, já está na hora de descobrir quem ele é", murmurou para si mesma, relembrando, com uma seqüência de calafrios, o desenrolar daquela história.
Desistira de tentar avisar os pais e os amigos que estava bem. O melhor a fazer, até à hora de ir ao cemitério, era sumir para que ele não a encontrasse. Só assim estaria segura de que não haveria, mesmo, um cadáver para ser colocado no caixão. Tentando controlar-se, correu ao quarto e pegou uma mochila. Olhou para o celular; melhor não levá-lo, decidiu. Depois de tantos dias trancada em casa, sentiu-se estranha ao pegar o elevador. Notou que o porteiro a olhou espantado, sem responder ao seu cumprimento. "Vai ver achou mesmo que eu estava morta", pensou, desanimada.
Fez sinal a um táxi que passava e deu o endereço de um hotel do outro lado da cidade. Lá, trancou-se no quarto, sentindo-se finalmente segura. Abriu a agenda na intenção de listar possíveis suspeitos, mas, a princípio, não conseguia imaginar ninguém que lhe quisesse fazer mal.
A não ser... Não, ele não seria capaz disso! Ou, pelo menos, não teria criatividade para tanto. A idéia, porém, insistia em martelar-lhe a mente: o ex-namorado, com quem terminara após descobrir uma traição e que não aceitara a separação na época. Lembrou-se como ele costumava ligar-lhe sempre, insistentemente, até que decidira trocar o número do telefone...
Mas, não, a solução lhe parecia fácil demais. Tinha de ser outra pessoa. Mas quem? Começou a repassar na mente todos os colegas e ex-colegas de trabalho, os vizinhos do prédio, mesmo os amigos da época de faculdade. Ninguém parecia se encaixar no perfil. Ainda olhava para a página em branco da agenda quando sobressaltou-se com uma batida na porta. "Encomenda para a senhorita", anunciou a voz que reconheceu como a do rapaz que carregara a sua mochila até ao quarto.
O já costumeiro arrepio voltou a percorrer-lhe o corpo – afinal, não pedira nada, e ninguém sabia que estava ali. A sensação mostrou-se correta quando abriu a porta e recebeu a rosa vermelha. "Só faltam seis horas. Não falte ao nosso encontro", dizia o cartão.
(continua no próximo mês)
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