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terça-feira, 20 de maio de 2008

Entrevista com o coveiro

Alian Moroz

Entrei silenciosamente pelo portão principal do cemitério da Água Verde sem ser notado por ninguém; vivo ou morto! Estava ali para fazer mais uma reportagem para o jornal do bairro. Durante esse tempo, eu usei o codinome Sombra. Dava um charme, sei lá. Bem, ao entrar, percebi várias flores e vasos espalhados pelos túmulos e capelas de famílias abastadas; visto ser o tal cemitério lugar para mortos ilustres da cidade de Curitiba. As flores eram agonizantes em sua morte prematura, pois foram cultivadas para esse tento.
Vi uma aglomeração logo abaixo na quadra 45 e percebi que estavam retirando um caixão de seu “lugar”. Aproximei-me.

Sombra: Bom dia!

Coveiro: Bom dia!
.
Sombra: O que estão fazendo?

Coveiro: Exumação!

Olhei para dentro da cova, foi quando recebi um ar quente com um cheiro ao qual jamais pude presenciar. Notei o esquife praticamente podre e dentro do que restava dele jazia um corpo vestido com o que parecia um terno. Os olhos do morto estavam arregalados e carcomidos por baratas saindo às pressas ante à luz que penetrava na tumba.

Sombra :É comum isso?

Coveiro: Nada. Mas pra mim é bom... Tem uns trocados a mais.

Sombra : O senhor não fica impressionado?

Coveiro: Impressionado como? Ah com medo? Não (risos) já cansei de trabalhar à noite, sozinho.

Sombra: O Senhor não tem receio dos fantasmas (risos)?

Coveiro: ( risos) que nada... Tudo besteira do povo; é o melhor lugar para se trabalhar..calmo e tranqüilo (pleonasmo?).

Sombra: Mas já aconteceu de o senhor se assustar?

Coveiro: (risos novamente) Ah, teve uma vez que um cachorro vira-latas entrou aqui e de noite ele pulou de cima de uma das capelas... Ele era branco... (risos) fiquei esperto “né”!

Sombra: Ok...posso levar alguns desses vasos de plástico aí? Minha esposa está com mania de plantação agora...

Coveiro: Ah pode levar sim... tem problema não...vai tudo para o lixo mesmo...

Sombra: Ok Obrigado então pela conversa... Qual sua graça?

Coveiro: Como?

Sombra : Seu nome!

Coveiro: Natal...

Sombra: (risos) Natal? Bem apropriado não?

Temam pobres mortais, pois “Natal” está chegando...

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