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sexta-feira, 11 de abril de 2008

A última noite do ano da coisa que não aconteceu



Era uma pessoa solitária. Pensava que enganava a todos. Que sua vida social era intensa. Que era feliz. Mas não sabia deixar-se amar. Algo acontecera na infância, talvez. Aquelas coisas freudianas. Tinha dúvidas. Se tomava os remédios, ficava mais equilibrada, menos intensa, sem cor. Se não os consumia, podia sentir tudo, até demais. Possuía diversas personalidades. Era inteligentíssima e muitíssimo imaginativa. Porém, imatura a ponto de não saber ver a felicidade bem diante de seus olhos. Ou não querer. Vivia com seus demônios e acreditava que deles ninguém se livra, jamais. Era bela. De uma beleza ímpar. Feições de misturas longínquas. Tinha medos; de ficar sozinha, e de não ficar. Tinha dúvidas; sobre ter certezas, ou deixar-se fluir. Era valiosa, mas pouco acreditava em si. Sim, era infeliz; e disso, sim, já não possuía qualquer suspeição. E, sim, era submissa a sua infelicidade; e disso ainda não se livraria, porque disso ainda não sabia. E nem deixava espaço para vir a saber.

Uma noite, ao tentar segurá-lo, provocando-o e empurrando-o para longe, deixou escapar um sonho pela janela iluminada. E nunca mais o recuperou.

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2 comentários:

Intenso. Um texto muito bom. Inteligente. Parabéns.

Sempre que escrevo, sinto-me como alguém que sobreviveu a um acidente e ainda se esforça para recordar o corrido; temendo, a um só tempo, lembrar-se de detalhes em demasia.

Agradecido e lisonjeado deveras, fico, eu, Dona Giselle Sato (belo nome)!!! :)-

Grato pela leitura e atenção...

Emoções vastas, pois!

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