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domingo, 13 de janeiro de 2008

O desenho

No início de tudo, antes do raiar do dia e nascer do meu primeiro segundo, antes do principio dos principios, eu era nada. Ausência, vazio de barriga incómodo e inquietante, falta mesmo de falta de movimento. Pensamentos vagos e fugidios, fixações em entes não presentes: o que já se foi e o que ainda não chegou.

Ao final do primeiro dia era mais: a espera. E nada sabia de mim. Vestido de branco em folha de papel, olhava para o fundo de meu próprio e estava a ficar verdadeiramente aborrecido, farto de ser nada. Então ele chegou. Instrumento de escrita, deu origem ao toque e à continuidade de pontos que se uniram aparecendo em sequência: um, dois, três traços, a boca, dois olhos, um chapéu, o nariz.

Mais um pouco de esforço, de laboração e fiquei pronto. Observei o que era e gostei francamente do que vi - cabeça, tronco e membros de boneco; pleno de inteligência e imaginação que sorria e sentia uma curiosidade imensa. Quis logo aprender sobre tudo e todos. Fiz planos, investiguei, perguntei, calcorreei caminhos... Continuei nessa vida lida por mais dois dias. Dois longos dias.

Ao fim do terceiro dia considerei-me muito sábio e ajuizei que, de repente, tinha certezas e era necessário impor a ordem no mundo. Começei a estabelecer regras para seguir. Que seriam óptimas para os outros. A primeira delas foi que a partir desse momento, todos os dias ao início da manhã e final da tarde, todos os dias sem falta, virar-me ia para Este e adoraria ao meu Deus e senhor criador - o lápis.

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