Estamos no ano de 1967, mais
precisamente em junho de 1967 e o mundo acaba de ser abalado por um cataclismo
poético-sonoro cujos efeitos ainda hoje não foram totalmente rastreados ou
compreendidos. Sabe-se, no entanto, que o efeito imediato foi devastador e que
os efeitos secundários se estenderão ao longo do tempo enquanto o tempo tiver
essa denominação.
Este abalo musical tinha um
nome comprido como longa e tortuosa e trabalhada foi sua elaboração. Era um
objeto de vinil envolto por uma capa repleta de personalidades e de flores e
que se chamava Sgtº Peppers Lonely
Hearts Club Band. O Lp em questão havia sido gravado por um grupo de
rock (não por acaso o mais famoso) conhecido como Beatles ou The Beatles ou
The Silver Beatles ou Long John and the Silver Beatles ou Johnny and the Moondogs ou ainda e
finalmente The Quarryman. Este
último nome foi na verdade a primeira denominação do grupo, em 1957, portanto
dez anos antes do divisor-de-águas ocasionado pelo Sgtº Peppers. Naquela época a
formação dos Beatles trazia Pete Best na bateria e somente em 1962 é que Ringo
Starr veio se juntar a John Lennon, Paul McCartney e George Harrison; formando
então o famoso Fab(ulous) Four de Liverpool, cidade natal de todos eles,
situada no noroeste da Inglaterra, às margens do rio Mersey.
O que
se seguiu ao encontro destes quatro rapazes já é história. Primeiro foram as
importantes presenças do empresário Brian Epstein (que chegou a ser chamado de
“o quinto Beatle”) e do produtor George Martin. Depois vieram os inúmeros shows
por toda a Europa, as turnês americanas, a instalação da beatlemania em todo o
mundo e, paralelamente a toda essa loucura, as gravações em estúdio.
A estreia se dá com o Lp Please Please Me (1963), logo depois
aparece With The Beatles (1963);
seguido por A Hard Day’s Night (1964)
– também transformado em filme por Richard Lester e Beatles For Sale (1964). Em 1965 é gravado o disco Help! Com um filme homônimo também
dirigido por Lester. A partir de 1966, com o Lp Revolver, os Beatles começam a consolidar uma nova e forte
tendência musical-evolutiva delineada no Lp anterior Rubber Soul (1965) e que iria culminar em 1967 com a exuberância
sonora & poética do Lp Sgtº Peppers
Lonely Hearts Club Band, que significou uma ruptura definitiva com a
música que eles mesmos faziam até então e com a própria música, tomada como um
todo, que era feita na época pelos conjuntos de rock, daí sua importância como
um marco deflagrador de todo um processo rico em criatividade que se seguiu.
Ainda em 1967 sai o Lp Magical Mystery
Tour (trilha sonora de um filme a cores realizado especialmente para a
televisão). No ano seguinte foram lançados dois Lps: Hey Jude e o álbum duplo The
Beatles ou White Álbum ou mais simplesmente ainda “Álbum Branco” como
ficou conhecido no Brasil. Em 1969, já com todos os problemas se agravando e
com um prenúncio de dissolução do grupo, os Beatles voltam aos estúdios da
Apple e destilam seus talentos em mais dois Lps de excelente qualidade: Abbey Road e Yellow Submarine, este
último transformado em um desenho animado para o cinema com trilha sonora
composta e orquestrada por George Martin (lado 2 do disco). Em 1970, ano da
separação oficial do grupo, foi lançado o Lp Let it Be juntamente com o filme que levava o mesmo nome. Foi, na
verdade, um lançamento patrocinado pela gravadora EMI e produzido por Phil
Spector sem o conhecimento e a aprovação formal dos Beatles e inclusive com
críticas destes quanto ao resultado final. Mas os Beatles já não existiam mais
como conjunto e o disco acabou saindo. Apesar de tudo Let it Be é muito bom e digno de constar com igualdade de
condições na discografia oficial.
Depois disso veio o fim do
grupo, o fim do sonho (“the dream is over”), mas com o direito de ainda
prolongar a noite em que se sonhava por mais um Lp: Beatles Forever (1972), lançado
somente no Brasil, Argentina e Espanha, contendo algumas das suas melhores
músicas.
Mesmo
para alguém que não tenha vivido aquela época (aquela mágica década de 60 e
seus desdobramentos nos anos 70) basta uma simples audição das músicas dos
Beatles para compreender que o legado deste conjunto é permanente e imune à
corrosão do tempo (este elemento que realmente define o “quem é quem” nas artes
no fim das contas).
Cinquenta e quatro anos
depois da explosão do grupo nós podemos perceber ainda hoje sinais evidentes da
permanência e até mesmo de um novo ressurgimento (“eterno retorno”) do fenômeno
Beatles. Aquele final da música A Day
in the Life idealizado por Lennon nos estúdios de gravação, pode ser
estendido e aplicado aos próprios Beatles, ou seja, a ideia de “um som
evoluindo do nada até o fim do mundo”. Esta frase diz bem da trajetória e é uma
síntese musical do grupo. Os Beatles
serão sempre este som evoluindo do nada até o fim do mundo, até o fim de tudo. Sempre.
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