Sempre fui um apaixonado pelo teatro ― e em especial pelo shakespeariano, que presenteou ao mundo peças e atores igualmente memoráveis: como não associar, por exemplo, o atormentado Hamlet às soberbas atuações de Sir Laurence Olivier, tanto nos palcos quanto no cinema?
Eu mesmo (e o leitor desconfiará da veracidade desta revelação), aos quinze anos de idade, ao fazer um teste para uma escola de teatro em Manaus ― sim, também já tentei atuar ―, escolhi o trecho em que Henrique V discursa aos soldados ingleses na célebre Batalha de Azincourt. E, para minha surpresa, fui aprovado: menos pelos meus dotes cênicos, acredito, do que pela ousadia de ter escolhido um texto do Bardo. Os avaliadores devem haver chegado à conclusão de que, pelo menos, eu possuía uma boa memória. Um mês depois, no entanto, percebendo que nem só de boa memória vivia um ator, optei pelo bom senso de desistir do curso.
Uma decisão que, vale frisar, não diminuiu em nada minha paixão pelo bom teatro. E continuei, agora das poltronas, aplaudindo as grandes encenações.
De tal modo que, em 2013, ao pisar em Londres pela primeira vez, já tinha uma ideia fixa: a de ir a uma peça de teatro ― não importasse qual fosse! Desde que ouvisse a encenação num apropriado sotaque britânico.
E dei sorte! Pois, próximo ao hotel que me instalei, em Earls Court, havia o pequeno e elegante Finborough Theatre ― que foi um dos primeiros palcos da hoje consagrada atriz Rachel Weisz. Na ocasião, lembro-me, para a sessão das sete, estavam todos os assentos ocupados e, quem quisesse, teria que ficar na lista de espera por uma desistência. E, nesse ponto, os deuses do teatro foram generosos comigo: pois, quase na hora de abrirem-se as cortinas, fui chamado para adentrar o teatro, uma vez que, milagrosamente, um dos espectadores não havia chegado.
O título da peça era Fishskin Trousers (algo como "calças de pele de peixe" numa tradução direta), que narrava as histórias de três personagens, de diferentes épocas, mas ligadas pelo fato de pertencerem à mesma comunidade de pescadores de Orfor, em Suffolk. No palco: três cadeiras apenas, ocupadas por três maravilhosos atores ― com destaque para o australiano Brett Brown, como o cientista dos anos 70.
Ao final do espetáculo, houve ainda um bate-papo com a autora da peça, Elizabeth Kuti, com quem tive o prazer de tirar uma foto. Mas o que me chamou mais atenção durante a conversa pós-espetáculo foi uma referência desdenhosa à atriz Kate Winslet feita por um dos palestrantes, e que, pasme o leitor, fez todo o teatro rir. Algo do tipo: “Se você quer o simplório, e não a qualidade, chame Kate Winslet para o papel”.
E, ao escutar isso, foi inevitável meu choque. Afinal de contas, eles estavam ironizando uma das atrizes mais prestigiadas do cinema ― é a Rose de "Titanic", for God’s Sake!, diriam alguns fãs mais exaltados!
Porém, resolvi não fazer a defesa de Kate. Nem dela nem de Colin Firth, outro cujos talentos dramáticos foram questionados durante aquele debate. Eles que são britânicos que se entendam, ponderei, enquanto bebia em silêncio o vinho distribuído aos espectadores.
Quanto a Kate Winslet, contestada ou não, continuo a assistir a seus filmes.
Desde que não seja, claro, ao som de Celine Dion...
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Um Feliz Natal e um Próspero 2015 a todos os leitores da Samizdat.
Edweine Loureiro
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