tradução: Henry Alfred Bugalho
Coração, nós o esqueceremos!
Coração, nós o esqueceremos!
Eu e ti, hoje à noite.
Deves te esquecer do acalento que ele nos deu,
Que eu me esquecerei do lume.
Quando o houveres feito, diga-me te suplico,
Que aos meus pensamentos toldarei;
Apressa-te! Que enquanto te tardas,
Dele ainda me lembrarei!
***
Porque eu não pude parar para a Morte
Porque eu não pude parar para a Morte –
Ela gentilmente parou para mim –
Na Carruagem, apenas nós –
E a Imortalidade.
Nós viajamos lentamente – Ela não tinha pressa
E eu tive de pôr de lado
Meu trabalho e meu lazer,
Por Delicadeza –
Passamos pela Escola, onde Crianças se exercitavam
No Recreio – no Pátio –
Passamos pelos Campos dos Grãos Maduros –
Passamos pelo Sol Poente –
Ou melhor – Ele passou por nós –
O Orvalho veio tremulante e cálido –
Apenas como Fina Trama, minhas Vestes –
Meu Xale – apenas Tule –
Estacamos diante duma Casa que parecia
Uma Elevação do Solo –
Do Telhado pouco se via –
A Cornija – a tocar o Chão –
Desde então – por Séculos – e ainda
Mais breve que o Dia
Constatei que as Cabeças dos Cavalos
Voltavam-se para a Eternidade –
***
Uma Porta acabou de ser aberta numa rua
Uma porta acabou de ser aberta numa rua –
Eu, perdida, estava passando –
E um átimo de quentura foi liberado,
E de riqueza e companhia.
A porta se fechou repentina, e eu,
Eu, perdida, estava passando –
Perdida em dobro, mais pelo contraste,
Esclarecedora miséria.
***
Deus a cada pássaro deu um pão
Deus a cada pássaro deu um pão,
Mas apenas migalhas para mim;
Não ouso comê-las, mesmo esfaimada, -
Minha aguda luxúria
Possuí-las, tocá-las, constatar o feito
Que fez meu este bocado, -
Feliz demais em minha sorte de pardal
Para almejar mais.
Pode haver fome por aí,
Eu não deixarei de ouvir,
Tantos largos sorrisos à minha mesa,
Meu celeiro parece estar bem cheio.
Imagino como o rico deve se sentir, -
Um indiático – um barão?
Considero que eu, com apenas migalhas,
Sobre todos eles soberana sou.
***
Não posso viver contigo
Não posso viver contigo,
Isto seria vida,
E vida está ali
Atrás da patreleira
O capelão guarda a chave,
Pondo acima
Nossa vida, sua porcelana,
Como uma taça
Descartada pela dona-de-casa,
Démodé ou esfacelada;
Um novo Sevres apraze,
Os velhos se quebram.
Eu não poderia morrer contigo,
Pois um deve esperar
Para cerrar os olhos do outro,
Tu não podes.
E eu, eu permanecerei
E ver-te-ei expirar,
Sem meu direito de expirar,
Privilégio da morte?
Nem eu poderei ressuscitar contigo,
Porque tua face
Poderia tirar de Jesus
A nova graça
Brilho nítido e estrangeiro
Em meus olhos nostálgicos,
Exceto que tu, ao invés d`ele,
Reluziu bem mais perto.
Julgar-nos-ão – como?
Pois tu serviste o Paraíso, tu sabes,
Ou tentaste;
Eu não consegui,
Porque tu concentraste a vista,
E eu não tenho mais olhos
Para uma excelência mórbida
Como o Paraíso.
E se tu decaísses, também,
Mesmo que meu nome
Tenha soado mais alto
Na fama celestial.
E se tu fosses salvo,
E eu condenada a estar
Onde tu não estás,
Isto seria o inferno para mim.
Então devemos nos manter apartados,
Tu aí, eu aqui,
Com a porta entreaberta apenas
Que são oceanos,
E orar,
E aquele pálido sustento,
Desespero!
***
Se eu puder evitar que um coração se parta,
Eu não terei vivido em vão;
Se eu puder evitar a agonia duma vida,
Ou acalentar uma dor,
Ou assistir um desfalecido melro
A voltar a seu ninho,
Eu não terei vivido em vão.
Emily Dickinson (Amherst, Massachusetts; Estados Unidos; 10 de Dezembro de 1830 - 15 de maio de 1886) foi uma poetisa americana.
Biografia
Nasceu numa casa cujo nome era The Homestead, construída pelos avós Samuel Fowler Dickinson e Lucretia Gunn Dickinson, no ano de 1813. Samuel Fowler era advogado e foi um dos principais fundadores do Amherst College. Era a segunda filha de Edward e Emily Norcross Dickinson.
Proveniente de uma família abastada, Emily teve formação escolar irrepreensível, chegando a cursar durante um ano o South Hadley Female Seminary. Abandonou o seminário após se recusar, publicamente, a declarar sua fé.
Quando findou os estudos, Emily retornou à casa dos pais para deles cuidar, juntamente com a irmã Lavínia que, como ela, nunca se casou.
Em torno de Emily, construiu-se o mito acerca de sua personalidade solitária. Tanto que a denominavam de a “Grande Reclusa”. É importante que se diga, que este comportamento de Emily coadunava-se com o modelo de conduta feminina que era apregoado no Massachusetts de Oitocentos. Emily, em raros momentos, deixou sua vida reclusa, tanto que em toda sua vida, apenas fez viagens para a Filadélfia para tratar de problemas de visão, uma para Washington e Boston. Foi numa destas viagens que Emily conheceu dois homens que teriam marcada influência em sua vida e inspiração poética: Charles Wadsworth e Thomas Wentworth Higginson.
Emily conheceu Charles Wadsworth, um clérigo de 41 anos, em sua viagem à Filadélfia. Alguns críticos creditam a Wadsworth, como sendo o alvo de grande parte dos poemas de amor escritos por Emily.
Quase tudo que se sabe sobre a vida de Emily Dickinson tem como fonte as correspondências que ela manteve com algumas pessoas. Entre elas: Susan Dickinson, que era sua cunhada e vizinha, colegas de escola, familiares e alguns intelectuais como Samuel Bowles, o Dr. e a Mrs. J. G. Holland, T. W. Higginson e Helen Hunt Jackson. Nestas cartas, além de tecer comentários sobre o seu cotidiano, havia também alguns poemas.
Foi somente em torno do ano de 1858 que Emily deu início a confecção dos «fascicles» (livros manuscritos com suas composições) , produzidos e encadernados à mão.
É intensa a sua produção de 1860 até 1870, quando compôs centenas de poemas por ano. Em 1862, envia quatro poemas ao crítico Thomas Higginson que, não compreendendo inteiramente sua poesia, a desaconselha de publicá-los.
A partir de 1864, surpreendida por problemas de visão, arrefece um pouco o ritmo de sua escrita. Uma curiosidade na obra de Emily Dickinson é que apesar de ter escrito em torno de 1800 poemas e quase 1000 cartas, ela não chegou a publicar nenhum livro de versos, enquanto viveu. Os registros que se tem, é que apenas anonimamente, publicou alguns poemas.
Toda a sua obra foi editada postumamente, sendo reconhecida e aclamada pelos críticos.
Emily faleceu em 15 de maio de 1886 em Amherst, Massachusetts.
A edição crítica completa, organizada por Thomas H. Johnson, contando com 1775 poemas, ocorreu apenas em 1955, após seu acervo ter sido transferido para a Universidade de Harvard. Posteriormente acrescida de outros poemas, em 1999, surge outra edição, organizada por R. W. Franklin, com 1789 poemas.
Atualmente a casa, onde ela nasceu e viveu, The Homestead é aberta para visitação no período de Março a Dezembro.
Fonte: Wikipédia
4 comentários:
Poemas maravilhosos, cheios de um sentimento solitário, angustiado, preso em sua liberdade.
De uma sensibilidade rara em nossos dias...
Eu irei encontrá-la.
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